sábado, 10 de julho de 2021

Therezinha Dieguez Brisolla (À Procura de Estrelas) 2

A IDADE DO OLHAR

O teu olhar me convida
ao amor... e, ainda que evite,
no meu delírio, atrevida,
eu aceito o teu convite.


O olhar de espanto
diante do mundo.
O primeiro brinquedo, Papai Noel, a escola...
A vida correndo sem parar
e eu a brincar
indiferente...
Meu tempo é o presente.

O olhar sem medo
diante do mundo.
O primeiro amor, a faculdade, o emprego...
Em busca dos sonhos, o adeus, o desapego.
Vencendo distâncias, transpondo fronteiras
eu procuro...
Meu tempo é o futuro.

O olhar sereno
diante do mundo.
Os primeiros sonhos sendo refeitos...
Sobre o livro de orações, os óculos
e sobre a folha de papel, em branco, a caneta
à espera da inspiração para a poesia.
A visita, a carta, o telefone,
o enfado...
Meu tempo é o passado.
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A JANELA ENCANTADA

Se a luz do dia revela
que a noite de amor é finda,
fecho, depressa, a janela
e pensas que é noite ainda!


A casa pobre e singela,
um dia se enriqueceu
e os pais, cheios de alegria,
a chamaram de Maria
quando a menina nasceu.

Um quarto, a sala, a cozinha,
uma porta e uma janela...
Nessa casa pequenina
cresceu, em graça, a menina
que, aos poucos, tornou-se bela!

À tarde sai à janela,
sempre no horário marcado
a olhara rua!... Risonha,
a menina pobre sonha
com seu príncipe encantado!

E é na janela o namoro...
Pede, o moço apaixonado,
ao pai a mão de Maria
e, para sua alegria,
o casamento é marcado.

O tempo passou ligeiro...
Sem a cortina de renda,
a casa em ruínas, fechada,
hoje, a janela encantada
ostenta uma placa: À VENDA.
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CIDADE NATAL

Ao procurar as raízes,
tem o meu sonho tal ânsia,
que ao buscar dias felizes
volto à fazenda da infância.


Seu pai era jardineiro
e ele era um menino arteiro,
que só queria brincar.
Mas, quando a mãe o chamava,
as flores, logo abraçava
e o pai ele ia ajudar.

Cresceu... deixou a cidade.
Longe de tudo, a saudade,
quase que o fez regressar.
Mas, sabendo o que queria,
formou-se em agronomia
depois de muito estudar.

Já casado e com família,
passou anos em vigília
e por trabalhar assim,
formou dois filhos doutores
mas, nunca mais plantou flores
e nem cuidou de um jardim!

Ao perder a companheira,
sua ilusão derradeira,
já tendo bastante idade,
procurou suas raízes
lembrando os tempos felizes
lá, na pequena cidade.

Voltou à morada antiga,
ouviu a velha cantiga,
foi à igreja e ao botequim.
E, na praça da cidade,
onde dói mais a saudade,
plantou flores no jardim!
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HERANÇA POÉTICA
(Homenagem a Mário Quintana)

Pede cautela a razão,
no labirinto da vida...
mas, sei que o meu coração
também conhece a saída.


Na sua ruazinha sonolenta,
a velha casa, onde nasceu, resiste.
Da porta aberta quando à noite, venta
do "catavento" eu ouço o canto triste.

Sua "cadeira de balanço" tenta
ninar meus sonhos... quanto pede e insiste!
Mas, a saudade chega e ciumenta
ocupa o seu lugar e não desiste.

Abro o "baú de espantos", comovida!...
Seu "sapato florido", ao ganhar vida,
vai procurar seu dono... e, por instinto,

eu levo o seu "espelho com magia",
que me fará cativo da poesia
e hei de encontrar você no "labirinto".
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Fonte:
Therezinha Dieguez Brisolla. À procura de estrelas.
Porto Alegre/RS: Odisséia, 2014.
Livro enviado pela poetisa.

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