quinta-feira, 15 de julho de 2021

Olivaldo Júnior (Cristais Poéticos) = 2 =

O HOMEM DA MÁSCARA DE PANO


De ferro, entre árvores queridas,
o “homem da máscara de pano”
enxerga o próprio rosto em vidas
que o enxergam como humano.

Humano, não de ferro, espero
que a ferrugem das vivências
não corroam o que mais quero,
o semblante das consciências
que pipocam no meu cérebro,
que transbordam de minhalma
sobre o colo de quem acalma
minha máscara e meu espírito.

Pois o espírito desse homem
quer no espírito de outro ser
se iluminar e ser o horizonte
que, um dia, irá se conhecer
na fonte que deságua a fonte
em que Deus vai beber: mito.

O que há por trás da máscara
que forçosamente usa o homem
nem mesmo o homem poderá
saber até que ela caia e, ao longe,
suspenda de todos os “parças”
suas máscaras de pano também.
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UMA ORQUÍDEA COMO AQUELA
Para a amiga que me mandou a foto de sua cattleya

No quintal daquela amiga,
com a cigarra e a formiga,
entre várias borboletas,
ou monarcas, ou plebeias,
uma orquídea cattleya
espreita o dia.

Espreita o dia,
que é feito a rósea poesia
de suas pétalas,
artimanhas poéticas
para ver se algum inseto
vem ter com elas
seu colóquio amoroso,
honra aos poetas.

Não, o quintal dessa amiga
não é uma floresta tropical,
mas guarda um ar especial
para que uma flor que intriga
seu sonho enfim prossiga
e se mostre, gloriosa, linda,
no quintal daquela amiga!
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SEU REI MENINO IRÁ CHEGAR
(Em especial, para a amiga Walkyria Garcia Maia)

Querida amiga adormecida,
Seu Rei Menino irá chegar.

Não, não sei de onde ele vem,
mas sei que, a passos largos,
rasga o céu de suas íris e vem,
montado num branco cavalo,
não de verdade, mas de nuvem,
ele vem, todo senhor de si
deixar em ti seu beijo e, sim,
ficar contigo para sempre!

Por isso, arrume a casa,
tome um banho e se perfume
com aquele néctar doce
que só as melhores flores
podem dar. Sim, amiga,
é tempo de amar!

Pedirei a um vaga-lume
que seja a presilha viva
em teus cabelos
e a uma borboleta,
o broche vivo
em tua blusa.

Usa aquele riso de menina
que o rio da vida te mostra
que tens em horas de amor
e espera, mesmo dormindo,
Seu Rei Menino, amiga,
que irá chegar.
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HOJE OS POETAS MORTOS ESTÃO TODOS EM CASA
(31 de outubro: Dia Nacional da Poesia)

Sim, amigo, é verdade o que lhe digo:
- Hoje os poetas mortos estão todos em casa.
Por isso, ponho os fones de ouvido
e deixo a canção portuguesa impregnar-me
os ouvidos com o sal
que salga o espirito
dos que vieram de lá
das últimas terras
de Portugal, ó pá!

Onde foi que Pessoa achou a fresta
no Céu dos Poetas que dava direto
para a casa tão simples deste poeta
que vos fala sobre o mais completo
sentimento que o recobre, concreta,
acimenta em seus olhos a vã beleza
das palavras de um poema, seminu,
desfile ao léu no quarto escuro, vão
por onde os ratos, répteis da língua
se amontoam e, em pele e coração,
tecem as redes que põem à míngua
os corações desavisados?...

Sim, amigo, os poetas mortos se deixam
entrever na minha cama, na cadeira
atrás de mim, no meu cangote, e beijam,
lambem as palavras como brincadeira
de colar os selos nas cartas
que jamais serão mandadas...

Cecília, Bandeira, Cabral, Drummond,
Quintana, Cora e o Manoel de Barros,
todos no balaio, de soslaio, dão o tom
de minha noite da poesia, aos berros
sem berrarem, balbuciam o que é bom
para eu dizer, para eu deixar de birra,
que o futuro quase tem o mesmo som
do vão passado, que o futuro é borra
no fundo da xícara, caixa de bombons
que a vida empresta ao pobre burro
que se julga um catedrático dos sons.

Sim, amigo, hoje os poetas mortos
ressuscitaram, e nem é Dia de Finados!
Hoje é o Dia Nacional da Poesia,
e todos os portos e celestes aeroportos
estão abertos aos meus chegados,
inconclusos companheiros que dia a dia
me acompanham, mesmo tortos,
pela reta que eu tomei,
linhas tortas que cruzei
para ver onde é que dá
toda a vida que inda há...

Fonte:
Poemas enviados pelo poeta.

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