No Soneto de
Despedida, Vinícius de Morais cantou a lua e a mulher amada. Ambas nuas,
uma no céu e outra na terra, igualmente formosas a mexer com a sua alma
irrequieta como são as de quem ama. Mulher e lua, portanto, serviram de
inspiração e o fizeram suar em gotas gigantes o sentimento a que se dá o
nome amor.
Sua inspiração boêmia fê-lo "o poetinha do Brasil",
na acepção mais carinhosa do termo; e nos legou frases, poemas e canções
lindas extraídas - como ele próprio confessou do seu âmago anestesiado
pelo fumo e uísque.
O verbo despedir, de certa forma, soa
tristeza: tanto na sua forma transitiva direta que significa "terminar
unilateralmente", como adeus, não quero mais, ou para mim basta!, ou
como enquanto verbo pronominal quando alguém diz palavras de despedida
no momento da sua saída: -"vou-me embora... pra Pasárgada" como o disse
Bandeira, numa alusão a um suposto amigo que o esperava.
Quando se termina algo é sinal que chegou o fim; e, como fim a conclusão de qualquer coisa, daí o questionamento; o fim existe?
Ouso
dizer que materialmente sim, como o construtor quando acaba de vez um
trabalho, ou o artista quando dá a última pincelada de tinta em seu
quadro. Mas, no sentido imaterial, é possível afirmar que o fim existe?
Cora
Coralina versejou que "o que vale na vida não é o ponto de partida e
sim a caminhada. Caminhando e semeando, no fim terás o que colher."
Acreditando nesse conceito, quando se tem o que colher não aconteceu o
fim propriamente dito, mas apenas e tão somente uma leve parada. Um
repouso para ganhar força e continuar como faz a flor que morre para
deixar a semente, mas não antes de atrair com seu perfume abelhas,
borboletas e passarinhos com o propósito de deixar que misturem o
androceu com o gineceu que carrega em seu seio e possibilitam a
fecundação, e de distribuir sua continuidade pela natureza através do
pólen que os insetos e animais (e o próprio vento) arrastam em seus
corpos, pernas, bicos e do vai e vem das brisas.
Sábio como a
flor que renasce em cada semente, Vinícius com seu Soneto de Despedida
não se despediu; apenas engoliu mais um copo e mais outros, fumou uma
série de carteiras de cigarro que lhe alimentavam a inspiração e, depois
a cada intervalo, curado dos porres, retornou a compor novos sonetos, a
ruminar novos versos, trovas e cantigas a várias e diferentes musas
terrenas, porque sua alma de poeta era tão volátil quanto a nuvem
passageira que apenas rabisca momentaneamente o céu na sua passagem sem
lhe deixar marcas perenes.
Aliás, a nuvem não deixa nem um traço
em sua passagem, pois o dia seguinte será sempre outro dia, cuja noite
envergará no céu a mesma e linda lua de sempre, em qualquer das fases,
com o mesmo poder de atração e sedução a retirar dos amantes palavras
torneadas pela paixão e gestadas pelo entusiasmo. E de colocá-las no
papel para o deleite de todos como o fez o "poetinha".
Fonte:
Renato Benvindo Prata. Azarinho e o caga-fogo.
Paranavaí/PR: Eg. Gráf. Paranavaí, 2014.
Livro enviado pelo autor.
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