A arte de escrever poesia e ficção é nem menos nem mais, que a sensibilidade de criar o ignoto ou recriar o vivido. Nessa, a dor de carregar o sofrimento da personagem ou alegria de viver o gozo de sua felicidade; a satisfação de gerar um filho. Quando a gente se põe dentro do próprio cérebro para tirar, daí, a composição literária, é como se fosse outro espírito, desligado deste da vida material. O mundo do escritor é, no momento de criar, o mundo do imaginário, um pouco o mundo dos deuses. Vem-me a lembrança ao fim da leitura de Oswaldo Evandro Carneiro Martins, em "Contos Realistas".
Trabalhador das letras clássico e purista, o autor transita livre e desembaraçadamente pelas mais despenhadas cachoeiras da arte das letras. É uma simples comparação com as coisas que amo e por isso me ocorrem mais constantemente. Bem comparando, ele tem, no manejo da pena, a facilidade do nativo brasileiro navegando seu rio, remo firme nas mãos ao piloto da igara. Tem o desembaraço dos mestres no exercício de sua profissão; a força do poder criador; a sensibilidade do iluminado. No conto manobra com a vivacidade do intelectual mais experiente no jogo das luzes do intelecto para sua formulação. Bate firme e pesado. Seu vocabulário é farto e elegante, e sendo lírico é forte, fincado na realidade dos que sabem o que escrevem e como o escrever. A erudição transparente no encadeamento das idéias sugere um sábio devorador de livros e um vivido observador do mundo.
A história curta, seja no conto contemporâneo, realista; seja na ficção pura, científica ou lírica; seja na novela policial, tem a preferência dos que lêem a título de lazer, mais que as longas histórias romanceadas. Nestas o leitor quer o enredo e o encadeamento dos fatos que se movem no conjunto. Naquela, busca o suspense. E o suspense incita a ir à frente, na leitura. Pergunte-se a quem é aficionado ao prazer da palavra impressa. E a resposta não será outra.
Hoje já não são poucos os que se contentam em ver o escrito eletrônico, preferindo-o ao impresso, e é outra história, que aqui não se comporta. Pretendo, antes, dizer do que li e entendi sobre este livro. O contista Oswaldo Evandro revela uma maneira especial de deixar com o leitor a oportunidade de ser co-autor de suas cogitações, forma de contar que eu desconhecia. Fecha a estória de uma maneira tão de leve, que nos induz a reler e imaginar, ao cabo escrever sobre seu escrito.
Quer ver se sim ou se não? Vamos ler sentados numa poltrona ao lado da poltrona do autor, os dois primeiros contos - A ÙLTIMA PACA e 0 "TRABALHO".
Abre as duas estórias criando suspense, acordando no leitor o vivo interesse pelo desfecho. E fecha-as simplesmente estimulando-o a idear sobre a sua fabulação, como se dissesse: conte você também o seu caso!
Com efeito. As palavras finais do primeiro conto: - "ela fugiu, mas ferida. Deixou sangue", indicam quase perfeita segurança de que a paca voltará a ser caçada festivamente. De fato. Essa primeira caça foi uma festa. E a seguinte, competirá ao leitor.
De igual modo o segundo conto. O larápio levou uma semana espionando a casa onde pretendia tirar "o seu". Mais quatro dias preparando a entrada. E o leitor ansioso pelo resultado do "trabalho". O camarada cai, sem nunca o imaginar, em uma gaiola. Tire-o desta, agora, quem chegar ao fim da bem imaginada estória.
Vamos para o terceiro conto e encontramos a mesma filosofia de trabalho, o mesmo empenho de envolver o leitor na trama. O personagem pesquisa, pesquisa, trabalha, trabalha, busca informações, chega a uma conclusão e sabe-se que ao falecer deixa um volumoso texto, que não é encontrado. Vá, a partir daí, o leitor embrenhar-se na novela um tanto policial, para saber que fim levou este e, encontrando-o, saber qual o seu conteúdo e a conclusão a que chegara o pesquisador. É tarefa sua, se pretende ser co-autor do mestre na criação e no estímulo à criação de estórias realistas. Falar nisso, sendo formulados nas proximidades do real, isto é, do que pode acontecer deveras, os contos presentes neste livro, bem que trazem, na textura, bons punhados de pura imaginação, de história de fantasia e muito do simbolismo metafórico.
Continua o contista trilhando o mesmo caminho, com algum raro desvio para veredas nas quais passeia pela filosofia e pela ciência, às vezes pelo devaneio. O devaneio é quase inevitável aos escritores de imaginação fértil. Este e até o sonho, como que são intrínsecos ao desenvolvimento da narrativa de ficção e da poesia.
Surpresa é, por exemplo, e ao mesmo tempo mensagem espiritual, a história do homem que não acredita em Deus. "DEUS EXISTE...", o título é seguro, insofismável. Apresenta, apesar disso, um incrédulo. E vai seguindo o caso até que o leitor entenda que se trata de um maluco. Ponto final. Ou não? Ou entenderá que o cara estava bêbado e o observador fazia mau juízo? À cena o leitor.
E "O MORTO E O VIVO"? E as seguintes estórias, bem engendradas e um tanto mentirosas, sendo realistas? Dissecar o que vem em cada uma delas, não. Para não reduzir ou tirar o gosto daquele a quem se destina, como foi comigo, a avaliação do livro e a quem desejo boa e alegre leitura, enquanto parabenizo o autor.
Mas... Mas... Por que não dizer um pouco mais? Por que não encerrar com o coração, essa modesta palavra? FEIRA DE PÁSSAROS, o último conto, apresenta vestida de inocência e simplicidade quase doces, uma abordagem humana. Uma temática tão forte que nos deixa a pensar nas implicações das necessidades do homem e nos problemas do dia-a-dia na vida das pessoas. Um cidadão simples e bom, honesto e sensível, chega a vazar os olhos dos passarinhos a vender na feira, porque descobre que cegos eles cantam melhor, e melhor cantando são mais vendáveis. Carecia do pão para a mesa de seus filhos. Ah, meu caro Oswaldo, só esse conto valeria pelo livro, se todo ele não valesse como esse conto.
Que, impresso, o trabalho chegue ao leitor. De certo este o entenderá como lazer e cultura.
Fonte:
http://www.joaojustiniano.net/files/prosa18.htm
Trabalhador das letras clássico e purista, o autor transita livre e desembaraçadamente pelas mais despenhadas cachoeiras da arte das letras. É uma simples comparação com as coisas que amo e por isso me ocorrem mais constantemente. Bem comparando, ele tem, no manejo da pena, a facilidade do nativo brasileiro navegando seu rio, remo firme nas mãos ao piloto da igara. Tem o desembaraço dos mestres no exercício de sua profissão; a força do poder criador; a sensibilidade do iluminado. No conto manobra com a vivacidade do intelectual mais experiente no jogo das luzes do intelecto para sua formulação. Bate firme e pesado. Seu vocabulário é farto e elegante, e sendo lírico é forte, fincado na realidade dos que sabem o que escrevem e como o escrever. A erudição transparente no encadeamento das idéias sugere um sábio devorador de livros e um vivido observador do mundo.
A história curta, seja no conto contemporâneo, realista; seja na ficção pura, científica ou lírica; seja na novela policial, tem a preferência dos que lêem a título de lazer, mais que as longas histórias romanceadas. Nestas o leitor quer o enredo e o encadeamento dos fatos que se movem no conjunto. Naquela, busca o suspense. E o suspense incita a ir à frente, na leitura. Pergunte-se a quem é aficionado ao prazer da palavra impressa. E a resposta não será outra.
Hoje já não são poucos os que se contentam em ver o escrito eletrônico, preferindo-o ao impresso, e é outra história, que aqui não se comporta. Pretendo, antes, dizer do que li e entendi sobre este livro. O contista Oswaldo Evandro revela uma maneira especial de deixar com o leitor a oportunidade de ser co-autor de suas cogitações, forma de contar que eu desconhecia. Fecha a estória de uma maneira tão de leve, que nos induz a reler e imaginar, ao cabo escrever sobre seu escrito.
Quer ver se sim ou se não? Vamos ler sentados numa poltrona ao lado da poltrona do autor, os dois primeiros contos - A ÙLTIMA PACA e 0 "TRABALHO".
Abre as duas estórias criando suspense, acordando no leitor o vivo interesse pelo desfecho. E fecha-as simplesmente estimulando-o a idear sobre a sua fabulação, como se dissesse: conte você também o seu caso!
Com efeito. As palavras finais do primeiro conto: - "ela fugiu, mas ferida. Deixou sangue", indicam quase perfeita segurança de que a paca voltará a ser caçada festivamente. De fato. Essa primeira caça foi uma festa. E a seguinte, competirá ao leitor.
De igual modo o segundo conto. O larápio levou uma semana espionando a casa onde pretendia tirar "o seu". Mais quatro dias preparando a entrada. E o leitor ansioso pelo resultado do "trabalho". O camarada cai, sem nunca o imaginar, em uma gaiola. Tire-o desta, agora, quem chegar ao fim da bem imaginada estória.
Vamos para o terceiro conto e encontramos a mesma filosofia de trabalho, o mesmo empenho de envolver o leitor na trama. O personagem pesquisa, pesquisa, trabalha, trabalha, busca informações, chega a uma conclusão e sabe-se que ao falecer deixa um volumoso texto, que não é encontrado. Vá, a partir daí, o leitor embrenhar-se na novela um tanto policial, para saber que fim levou este e, encontrando-o, saber qual o seu conteúdo e a conclusão a que chegara o pesquisador. É tarefa sua, se pretende ser co-autor do mestre na criação e no estímulo à criação de estórias realistas. Falar nisso, sendo formulados nas proximidades do real, isto é, do que pode acontecer deveras, os contos presentes neste livro, bem que trazem, na textura, bons punhados de pura imaginação, de história de fantasia e muito do simbolismo metafórico.
Continua o contista trilhando o mesmo caminho, com algum raro desvio para veredas nas quais passeia pela filosofia e pela ciência, às vezes pelo devaneio. O devaneio é quase inevitável aos escritores de imaginação fértil. Este e até o sonho, como que são intrínsecos ao desenvolvimento da narrativa de ficção e da poesia.
Surpresa é, por exemplo, e ao mesmo tempo mensagem espiritual, a história do homem que não acredita em Deus. "DEUS EXISTE...", o título é seguro, insofismável. Apresenta, apesar disso, um incrédulo. E vai seguindo o caso até que o leitor entenda que se trata de um maluco. Ponto final. Ou não? Ou entenderá que o cara estava bêbado e o observador fazia mau juízo? À cena o leitor.
E "O MORTO E O VIVO"? E as seguintes estórias, bem engendradas e um tanto mentirosas, sendo realistas? Dissecar o que vem em cada uma delas, não. Para não reduzir ou tirar o gosto daquele a quem se destina, como foi comigo, a avaliação do livro e a quem desejo boa e alegre leitura, enquanto parabenizo o autor.
Mas... Mas... Por que não dizer um pouco mais? Por que não encerrar com o coração, essa modesta palavra? FEIRA DE PÁSSAROS, o último conto, apresenta vestida de inocência e simplicidade quase doces, uma abordagem humana. Uma temática tão forte que nos deixa a pensar nas implicações das necessidades do homem e nos problemas do dia-a-dia na vida das pessoas. Um cidadão simples e bom, honesto e sensível, chega a vazar os olhos dos passarinhos a vender na feira, porque descobre que cegos eles cantam melhor, e melhor cantando são mais vendáveis. Carecia do pão para a mesa de seus filhos. Ah, meu caro Oswaldo, só esse conto valeria pelo livro, se todo ele não valesse como esse conto.
Que, impresso, o trabalho chegue ao leitor. De certo este o entenderá como lazer e cultura.
Fonte:
http://www.joaojustiniano.net/files/prosa18.htm
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