sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

João Justiniano da Fonseca (Antologia Poética)


A BELEZA DA VIDA

A beleza da vida está na própria vida,
nas flores do jardim, no fruto do pomar.
No amanhecer do dia, o sol vindo do mar,
ou da várzea, da serra - eterno na subida.

A beleza da vida está no conjugar
os rios, a floresta, e a comprida avenida...
Pista e velocidade, os pneus a rolar!
Ou, no espinho e na rosa? Ou na idade vivida?

A beleza da vida – o homem no trabalho,
no campo ou na cidade. A enxada. A pena. O malho.
Mover de sonho e fé, de luz, de cabedais.

A beleza da vida – o todo na impulsão
de tudo que se move. O amor, o coração...
O destino da paz, a paz. A íntima paz!

A MORTE DO SONHO

Era o sustento e a crença, a fé, o arrimo
em que me equilibrava para a luta.
Veio a ser desespero e dor - cicuta
que a esperança levou à morte e ao limo.

Assim mesmo o bendigo - ao sonho ardente
que, infinito, vivemos cem por cento
e ao ocaso passou. Gemia o vento
quando o sonho descia no poente...

Hoje, que tudo foi, direi apenas,
que as tuas rosas, dálias e açucenas,
murchas, guardei-as com o maior carinho...

Morreu, morreu! Vamos adiante, eu me erga,
ator no palco da tragédia grega
busque outro sonho, siga outro caminho...

AS PLANTAS DO SERTÃO

É um milagre do Eterno; não sei de onde
vem, a potente força com que vinga
a planta no Sertão, por mais que a ronde
e roa, da canícula a língua!

O umbuzeiro sagrado, na caatinga,
alarga, entrança e reentrança a fronde,
para se proteger do sol; e à míngua
da chuva, a água na raiz esconde.

Macambira, umburana, xiquexique,
têm as raízes ou o caule aquosos,
para que o sol não os seque e mumifique.

Em outras plantas, troncos mal porosos,
pode ser que a dureza justifique
a resistência aos raios venenosos.

CORAÇÃO DO VELHO

O coração do velho é a mansidão do lago,
a angústia do passado, a lembrança do sonho...
Roída pelo tempo, é uma raiz, suponho,
exposta, ressequida, à procura de afago.

O amor que se lhe dê, pesa tanto em conforto,
que sendo uma migalha, é por milhões que vale...
Se quer vê-lo feliz, do futuro lhe fale,
se quer vê-lo sofrer, lembre o passado morto...

Consente em rir e é sol, tão só porque lhe apontem
a gota de ilusão que a velha angústia acalma,
chora o belo perdido, as mágoas que se contem...

O coração do velho é a sensitiva da alma,
que marca desolada e triste, o riso do ontem,
tem lembrança e não fé, já não espera a palma...

O ESQUECIMENTO

Não dá para esquecer: Um sonho. Nos seus braços
Corria mansa a vida. O amor de adolescente
Ensejava a esperança e a fé. Primeiros passos
De um mundo idealizado – o futuro da gente.

Eu e você. A casa erguida na colina
No mais alto do topo. A fonte. O minadouro.
Um córrego descendo. A água cristalina
Banha meu corpo e o seu. Aqui nosso tesouro.

Vem o primeiro filho, agora somos três.
As vacas no curral. As cabras. As galinhas.
Crescia a vida. O tempo andava mês a mês.

E fomos quatro, cinco... O tempo, ano a ano
Levou a mocidade. Os filhos e as vizinhas...
De nós o esquecimento, em nós o desengano...

O TECELÃO DA VIDA

O tempo tece a vida fio a fio,
sem pressa e sem recuo na memória.
Como o curso das águas, vão, em rio,
um para o mar, o outro para a história.

Não pára o tecelão. A sua glória,
é a força do tear. E, como em cio,
a si se soma subtraindo a escória.
Ao fim da era é fósforo e pavio.

Explode em chamas ou submerge, ou oculto,
sobe ao espaço aéreo e aí se planta
por milênios sem pôr à mostra o vulto.

Renasce na pesquisa e se suplanta.
É o passado remoto. Cresce, e adulto,
às novas gerações empolga e espanta.

Fonte:
http://www.joaojustiniano.net/

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