Tempos de Teatro de Arena, Redondo, TBC, TAIB, do Teatro das Nações, inaugurado com uma ópera para mais de mil pessoas vestidas a rigor.
A gente se reunia no Ponto de Encontro, uma livraria no subsolo da Galeria Metrópole, em frente à Praça da Biblioteca, na então Paulicéia Desvairada dos anos sessenta. Que bom ter conhecido tantas pessoas especiais.
Aquele negrão era cativante, mais ainda quando declamava e se repartia.
Solano Trindade, pernambucano de Recife, filho do sapateiro Manuel Abílio e da quituteira Emerenciana, cresceu dançando o Pastoril e Bumba-meu-boi. Participou dos Congressos Afros dos anos trinta, especialmente quando Gilberto Freyre lança seu Casa Grande & Senzala.
Em 1936, Solano funda o Centro Cultural Afro-Brasileiro e a Frente Negra Pernambucana, uma extensão da Frente Negra Brasileira. Publica os seus Poemas Negros. Inquieto, viaja para Minas Gerais e depois para o Rio Grande do Sul, onde cria, em Pelotas, um Grupo de Arte Popular.
Aquele homem de andar manso, cabeça cheia de planos e energia inabalável foi depois para o Rio de Janeiro. Em 1944 publicou o livro Poemas de uma Vida Simples. Em 1945, junto com Abdias Nascimento, criou o Comitê Democrático Afro-Brasileiro.
Com Haroldo Costa fundou o Teatro Folclórico. Atuou em filmes como A hora e a vez de Augusto Matraga e O Santo Milagroso.
Na cidade maravilhosa, Solano gostava do Café Vermelhinho freqüentado por intelectuais, políticos, jornalistas, escritores e atores teatrais. Era amigo de pessoas como o Barão de Itararé e Santa Rosa.
Solano filiou-se ao Partido Comunista, as reuniões da Célula Tiradentes ocorriam na sua residência e, durante a perseguição aos comunistas, empreendida pelo governo Dutra, entram em sua casa. Seu filho, Liberto, está deitado, doente. A polícia vira o colchão, à procura de armas. Exemplares de seus livros são apreendidos.
A filha Raquel lembra: "Papai jamais esconderia armas. Sua luta era feita com idéias". Preso, não se abala. Raquel e a mãe, Margarida, percorrem as cadeias até encontrá-lo.
Quando sai, Solano parece fortalecido. Embora com os olhos tristonhos, seu otimismo é contagiante, nasce do seu amor pela arte e pela vida. Continua escrevendo, fazendo teatro e espalhando sonhos e esperanças por onde passa.
Preocupava-se com o que chamava de folclore, com as danças populares. Dizia ser necessário pesquisar nas fontes de origem e devolver ao povo em forma de arte. Sua experiência mais bem sucedida neste sentido foi o Teatro Popular Brasileiro, criado por ele, por sua esposa Margarida Trindade e pelo sociólogo Édison Carneiro em 1950
Com Haroldo Costa fundou o Teatro Folclórico. Atuou em filmes como A hora e a vez de Augusto Matraga e O Santo Milagroso.
Na cidade maravilhosa, Solano era freqüentador do Café Vermelhinho, onde se reuniam intelectuais, políticos, jornalistas, escritores e artistas de teatro. Ali era amigo de pessoas como o Barão de Itararé e Santa Rosa.
O Embu é um agradável município distante cerca de uma hora do centro de São Paulo. Embora tão próxima à metrópole, a cidade guarda um clima bucólico, aconchegante.
Quem chega no Embu aos domingos, quando é grande o movimento de turistas, não imagina estar diante da concretização do sonho de artistas negros, dentre eles o poeta Solano Trindade, pesquisador das nossas tradições populares, teatrólogo, pintor e boêmio; um ser humano de grande carisma e visão, para quem a arte representava parte essencial da vida.
Solano vem a São Paulo e é convidado pelo escultor Assis para apresentar-se no Embu e leva o seu grupo. Dormem no barracão de Assis nos finais de semana, quando mostram sua arte para um número cada vez maior de pessoas. Participam da peça "Gimba", de Gianfrancesco Guarnieri. Em 1967, apresentam-se para um dos criadores da Negritude: Leopold Senghor.
Solano apaixona-se pelo Embu, muda-se para lá e sua casa torna-se uma núcleo artístico. Na cidade já havia um movimento com artistas como Sakai e Azteca, mas a atividade de Solano e Assis faz surgir a feira de artesanato e revoluciona o local, aumentando o fluxo turístico.
Solano chegou a ser conhecido como "o patriarca do Embu". A casa e o coração de Solano estavam sempre prontos para receber, na panela, havia comida para quem chegasse a qualquer hora.
Ironicamente, no final da vida, vários desses amigos se afastaram, mas talvez este seja o cruel destino dos grandes criadores, de profetas e poetas assinalados. A poesia de Solano o marcou. Orgulhava-se ser chamado de “poeta negro”; - “Sou negro, meus avós foram queimados pelo sol da África minh'alma recebeu o batismo dos tambores atabaques, gonguês e agogôs.”
Casou-se três vezes e teve quatro filhos. Raquel Trindade, que hoje continua o trabalho do pai, no Embu, descreve-o: "Existem artistas que aparentam ser uma coisa e, no fundo, são outra. Papai mostrava-se como era, um pai fantástico".
Último ato: esse poeta dava-se completamente à arte e à vida sem se importar com bens materiais, ainda que seu trabalho tenha favorecido a muitos. A partir de 1970, sua saúde começou a apresentar problemas. Morreu no Rio de Janeiro, em 1974.
Em 1976, voltou aos braços do povo como tema da escola de samba Vai-Vai, com enredo elaborado por sua filha Raquel. Os versos do samba de Geraldo Filme ainda ecoam: “Canta meu povo, vamos cantar em homenagem ao poeta popular Vai-Vai é povo, está na rua saudoso poeta, a noite é sua.”
Palavras escritas num poema à filha Raquel se tornam proféticas: “Estou conservado no ritmo do meu povo Me tornei cantiga determinadamente, nunca terei tempo para morrer.”
Um de seus trabalhos mais famosos, intitulado "Tem gente com fome", foi musicado e gravado por Nei Matogrosso: Trem sujo da Leopoldina correndo, correndo, parece dizer tem gente com fome, tem gente com fome, tem gente com fome. O ritmo é o de um trem em movimento. No final, quando vai parando, a voz ouvida pelo poeta exige: se tem gente com fome, dá de comer. Solano também cantou continuamente o amor. - Fonte Márcio Barbosa
Em tempos de Beto Carneiro, o Vampiro Brasileiro, e Emílio Surita com seu Pânico na TV, vale a pena homenagear Solano Trindade:
Tem gente com Fome
Trem sujo da Leopoldina
correndo correndo
parece dizer
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Piiiiii
Estação de Caxias
de novo a dizer
de novo a correr
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Vigário Geral
Lucas
Cordovil
Brás de Pina
Penha Circular
Estação da Penha
Olaria
Ramos
Bom Sucesso
Carlos Chagas
Triagem, Mauá
trem sujo da Leopoldina
correndo correndo
parece dizer
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Tantas caras tristes
querendo chegar
em algum destino
em algum lugar
Trem sujo da Leopoldina
correndo correndo
parece dizer
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Só nas estações
quando vai parando
lentamente começa a dizer
se tem gente com fome
dá de comer
se tem gente com fome
dá de comer
se tem gente com fome
dá de comer
Mas o freio de ar
todo autoritário
manda o trem calar
Psiuuuuuuuuuuu
Fonte:
Revista Entrementes
A gente se reunia no Ponto de Encontro, uma livraria no subsolo da Galeria Metrópole, em frente à Praça da Biblioteca, na então Paulicéia Desvairada dos anos sessenta. Que bom ter conhecido tantas pessoas especiais.
Aquele negrão era cativante, mais ainda quando declamava e se repartia.
Solano Trindade, pernambucano de Recife, filho do sapateiro Manuel Abílio e da quituteira Emerenciana, cresceu dançando o Pastoril e Bumba-meu-boi. Participou dos Congressos Afros dos anos trinta, especialmente quando Gilberto Freyre lança seu Casa Grande & Senzala.
Em 1936, Solano funda o Centro Cultural Afro-Brasileiro e a Frente Negra Pernambucana, uma extensão da Frente Negra Brasileira. Publica os seus Poemas Negros. Inquieto, viaja para Minas Gerais e depois para o Rio Grande do Sul, onde cria, em Pelotas, um Grupo de Arte Popular.
Aquele homem de andar manso, cabeça cheia de planos e energia inabalável foi depois para o Rio de Janeiro. Em 1944 publicou o livro Poemas de uma Vida Simples. Em 1945, junto com Abdias Nascimento, criou o Comitê Democrático Afro-Brasileiro.
Com Haroldo Costa fundou o Teatro Folclórico. Atuou em filmes como A hora e a vez de Augusto Matraga e O Santo Milagroso.
Na cidade maravilhosa, Solano gostava do Café Vermelhinho freqüentado por intelectuais, políticos, jornalistas, escritores e atores teatrais. Era amigo de pessoas como o Barão de Itararé e Santa Rosa.
Solano filiou-se ao Partido Comunista, as reuniões da Célula Tiradentes ocorriam na sua residência e, durante a perseguição aos comunistas, empreendida pelo governo Dutra, entram em sua casa. Seu filho, Liberto, está deitado, doente. A polícia vira o colchão, à procura de armas. Exemplares de seus livros são apreendidos.
A filha Raquel lembra: "Papai jamais esconderia armas. Sua luta era feita com idéias". Preso, não se abala. Raquel e a mãe, Margarida, percorrem as cadeias até encontrá-lo.
Quando sai, Solano parece fortalecido. Embora com os olhos tristonhos, seu otimismo é contagiante, nasce do seu amor pela arte e pela vida. Continua escrevendo, fazendo teatro e espalhando sonhos e esperanças por onde passa.
Preocupava-se com o que chamava de folclore, com as danças populares. Dizia ser necessário pesquisar nas fontes de origem e devolver ao povo em forma de arte. Sua experiência mais bem sucedida neste sentido foi o Teatro Popular Brasileiro, criado por ele, por sua esposa Margarida Trindade e pelo sociólogo Édison Carneiro em 1950
Com Haroldo Costa fundou o Teatro Folclórico. Atuou em filmes como A hora e a vez de Augusto Matraga e O Santo Milagroso.
Na cidade maravilhosa, Solano era freqüentador do Café Vermelhinho, onde se reuniam intelectuais, políticos, jornalistas, escritores e artistas de teatro. Ali era amigo de pessoas como o Barão de Itararé e Santa Rosa.
O Embu é um agradável município distante cerca de uma hora do centro de São Paulo. Embora tão próxima à metrópole, a cidade guarda um clima bucólico, aconchegante.
Quem chega no Embu aos domingos, quando é grande o movimento de turistas, não imagina estar diante da concretização do sonho de artistas negros, dentre eles o poeta Solano Trindade, pesquisador das nossas tradições populares, teatrólogo, pintor e boêmio; um ser humano de grande carisma e visão, para quem a arte representava parte essencial da vida.
Solano vem a São Paulo e é convidado pelo escultor Assis para apresentar-se no Embu e leva o seu grupo. Dormem no barracão de Assis nos finais de semana, quando mostram sua arte para um número cada vez maior de pessoas. Participam da peça "Gimba", de Gianfrancesco Guarnieri. Em 1967, apresentam-se para um dos criadores da Negritude: Leopold Senghor.
Solano apaixona-se pelo Embu, muda-se para lá e sua casa torna-se uma núcleo artístico. Na cidade já havia um movimento com artistas como Sakai e Azteca, mas a atividade de Solano e Assis faz surgir a feira de artesanato e revoluciona o local, aumentando o fluxo turístico.
Solano chegou a ser conhecido como "o patriarca do Embu". A casa e o coração de Solano estavam sempre prontos para receber, na panela, havia comida para quem chegasse a qualquer hora.
Ironicamente, no final da vida, vários desses amigos se afastaram, mas talvez este seja o cruel destino dos grandes criadores, de profetas e poetas assinalados. A poesia de Solano o marcou. Orgulhava-se ser chamado de “poeta negro”; - “Sou negro, meus avós foram queimados pelo sol da África minh'alma recebeu o batismo dos tambores atabaques, gonguês e agogôs.”
Casou-se três vezes e teve quatro filhos. Raquel Trindade, que hoje continua o trabalho do pai, no Embu, descreve-o: "Existem artistas que aparentam ser uma coisa e, no fundo, são outra. Papai mostrava-se como era, um pai fantástico".
Último ato: esse poeta dava-se completamente à arte e à vida sem se importar com bens materiais, ainda que seu trabalho tenha favorecido a muitos. A partir de 1970, sua saúde começou a apresentar problemas. Morreu no Rio de Janeiro, em 1974.
Em 1976, voltou aos braços do povo como tema da escola de samba Vai-Vai, com enredo elaborado por sua filha Raquel. Os versos do samba de Geraldo Filme ainda ecoam: “Canta meu povo, vamos cantar em homenagem ao poeta popular Vai-Vai é povo, está na rua saudoso poeta, a noite é sua.”
Palavras escritas num poema à filha Raquel se tornam proféticas: “Estou conservado no ritmo do meu povo Me tornei cantiga determinadamente, nunca terei tempo para morrer.”
Um de seus trabalhos mais famosos, intitulado "Tem gente com fome", foi musicado e gravado por Nei Matogrosso: Trem sujo da Leopoldina correndo, correndo, parece dizer tem gente com fome, tem gente com fome, tem gente com fome. O ritmo é o de um trem em movimento. No final, quando vai parando, a voz ouvida pelo poeta exige: se tem gente com fome, dá de comer. Solano também cantou continuamente o amor. - Fonte Márcio Barbosa
Em tempos de Beto Carneiro, o Vampiro Brasileiro, e Emílio Surita com seu Pânico na TV, vale a pena homenagear Solano Trindade:
Tem gente com Fome
Trem sujo da Leopoldina
correndo correndo
parece dizer
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Piiiiii
Estação de Caxias
de novo a dizer
de novo a correr
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Vigário Geral
Lucas
Cordovil
Brás de Pina
Penha Circular
Estação da Penha
Olaria
Ramos
Bom Sucesso
Carlos Chagas
Triagem, Mauá
trem sujo da Leopoldina
correndo correndo
parece dizer
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Tantas caras tristes
querendo chegar
em algum destino
em algum lugar
Trem sujo da Leopoldina
correndo correndo
parece dizer
tem gente com fome
tem gente com fome
tem gente com fome
Só nas estações
quando vai parando
lentamente começa a dizer
se tem gente com fome
dá de comer
se tem gente com fome
dá de comer
se tem gente com fome
dá de comer
Mas o freio de ar
todo autoritário
manda o trem calar
Psiuuuuuuuuuuu
Fonte:
Revista Entrementes
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