terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Adriana Falcão (Primeiro Amor)

É que nem saudade. Mesmo que a pessoa nunca tenha sentido, quando sente já sabe logo que aquilo é saudade, ou melhor, que saudade é aquilo: aquele vazio que queria ser cheio. É que nem azia. A sensação puxa a palavra exata na hora, e a pessoa diz "Que azia!", ainda que seja a primeira vez que tem uma.

Primeiro amor é que nem festa surpresa. Quando acontece não avisa, mas é tão óbvio que dali pra frente não dá mais para viver sem pensar nele. Apesar de Tatiana só ter 14 anos, quando viu Felipe pela primeira vez, com sua roupa de goleiro, teve certeza: "Amei". E amou mesmo. Pulava. Sofria. Gargalhava de amor quando ele chegava à escola ou jogava nos treinos. Quando ele defendia uma bola, queria ser bola. Tatiana estava mesmo apaixonada.

O amor já estava transbordando quando ela foi contar a novidade pra Chiquinha Mota Pereira, sua amiga imaginária desde que elas eram pequenas. As duas cresceram juntas, Tatiana de verdade e Chiquinha de mentira, se é que se pode chamar de "mentira" alguém que, apesar de imaginária, é amiga verdadeira.

Chiquinha adorou a novidade e quis saber apenas se aquele amor era correspondido.

- Como é que eu posso saber? - respondeu (ou perguntou) Tatiana.

- Olhando fundo nos olhos dele.

Tatiana nem dormiu direito, ligada naquela urgência dos que amam pela primeira vez na vida, esperando amanhecer e ir pra escola, olhar fundo nos olhos de Felipe, pra conferir se havia algum sinal de amor vindo de lá, feito um espelho.

Finalmente deu 7 e meia e a campainha tocou. Ia começar a aula. Todos nos seus lugares, restou um lugar vazio. "Cadê Felipe, meu Deus?" Foi na hora do recreio que ela recebeu a notícia: "Felipe saiu da escola porque o pai dele foi transferido pra uma outra cidade".

E agora? Não foi fácil aquela manhã segurar o choro pra mais tarde.

- Será que todo amor de verdade tem que ter um impedimento pra se tornar impossível? - Tatiana soluçou baixinho. E Chiquinha respondeu (ou perguntou):

- Ou será que todo amor, pra se tornar possível, tem que provar que é de verdade?

Fonte:
Revista Nova Escola: Contos

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