A Chuva Desce a Ladeira
A água da chuva desce a ladeira.
É uma água ansiosa.
Faz lagos e rios pequenos, e cheira
A terra a ditosa.
Há muitos que contam a dor e o pranto
De o amor os não qu'rer...
Mas eu, que também não os tenho, o que canto
É outra coisa qualquer.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
A Aranha
A aranha do meu destino
Faz teias de eu não pensar.
Não soube o que era em menino,
Sou adulto sem o achar.
É que a teia, de espalhada
Apanhou-me o querer ir...
Sou uma vida balançada
Na consciência de existir.
A aranha da minha sorte
Faz teia de muro a muro...
Sou presa do meu suporte.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
A Criança Que Ri na Rua
A criança que ri na rua,
A música que vem no acaso,
A tela absurda, a estátua nua,
A bondade que não tem prazo -
Tudo isso excede este rigor
Que o raciocínio dá a tudo,
E tem qualquer coisa de amor,
Ainda que o amor seja mudo
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
A Estrada, Como Uma Senhora
A estrada, como uma senhora,
Só dá passagem legalmente.
Escrevo ao sabor quente da hora
Baldadamente.
Não saber bem o que se diz
É um pouco sol e um pouco alma.
Ah, quem me dera ser feliz
Teria isto, mais a calma.
Bom campo, estrada com cadastro,
Legislação entre erva nata.
Vou atar a lama com um nastro*
Só para ver quem ma desata.
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A água da chuva desce a ladeira.
É uma água ansiosa.
Faz lagos e rios pequenos, e cheira
A terra a ditosa.
Há muitos que contam a dor e o pranto
De o amor os não qu'rer...
Mas eu, que também não os tenho, o que canto
É outra coisa qualquer.
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A Aranha
A aranha do meu destino
Faz teias de eu não pensar.
Não soube o que era em menino,
Sou adulto sem o achar.
É que a teia, de espalhada
Apanhou-me o querer ir...
Sou uma vida balançada
Na consciência de existir.
A aranha da minha sorte
Faz teia de muro a muro...
Sou presa do meu suporte.
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A Criança Que Ri na Rua
A criança que ri na rua,
A música que vem no acaso,
A tela absurda, a estátua nua,
A bondade que não tem prazo -
Tudo isso excede este rigor
Que o raciocínio dá a tudo,
E tem qualquer coisa de amor,
Ainda que o amor seja mudo
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A Estrada, Como Uma Senhora
A estrada, como uma senhora,
Só dá passagem legalmente.
Escrevo ao sabor quente da hora
Baldadamente.
Não saber bem o que se diz
É um pouco sol e um pouco alma.
Ah, quem me dera ser feliz
Teria isto, mais a calma.
Bom campo, estrada com cadastro,
Legislação entre erva nata.
Vou atar a lama com um nastro*
Só para ver quem ma desata.
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nastro = laço, tira.
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Ah, a Esta Alma Que Não Arde
Ah, a esta alma que não arde
Não envolve, porque ama,
A esperança, ainda que vã,
O esquecimento que vive
Entre o orvalho da tarde
E o orvalho da manhã.
= = = = = = = = = = = = = = = = = = = = = =
Ah, Como Incerta, na Noite em Frente
Ah, como incerta, na noite em frente,
De uma longínqua tasca vizinha
Uma ária antiga, subitamente,
Me faz saudade do que as não tinha.
A ária é antiga? É-o a guitarra.
Da ária mesma não sei, não sei.
Sinto a dor-sangue, não vejo a garra.
Não choro, e sinto que já chorei.
Qual o passado que me trouxeram?
Nem meu nem de outro, é só passado:
Todas as coisas que já morreram
A mim e a todos, no mundo andado.
É o tempo, o tempo que leva a vida
Que chora e choro na noite triste.
É a mágoa, a queixa mal definida
De quanto existe, só porque existe.
Ah, a Esta Alma Que Não Arde
Ah, a esta alma que não arde
Não envolve, porque ama,
A esperança, ainda que vã,
O esquecimento que vive
Entre o orvalho da tarde
E o orvalho da manhã.
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Ah, Como Incerta, na Noite em Frente
Ah, como incerta, na noite em frente,
De uma longínqua tasca vizinha
Uma ária antiga, subitamente,
Me faz saudade do que as não tinha.
A ária é antiga? É-o a guitarra.
Da ária mesma não sei, não sei.
Sinto a dor-sangue, não vejo a garra.
Não choro, e sinto que já chorei.
Qual o passado que me trouxeram?
Nem meu nem de outro, é só passado:
Todas as coisas que já morreram
A mim e a todos, no mundo andado.
É o tempo, o tempo que leva a vida
Que chora e choro na noite triste.
É a mágoa, a queixa mal definida
De quanto existe, só porque existe.
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