O Poeta jamais podia supor que encontraria um amigo. Mas, numa esquina de sua vida, num dezembro longínquo, o Músico apareceu em seu caminho e acendeu a luz.
Desde então, por onde quer que vá, uma lanterna, flutuante e amarela luz, o acompanha, dando a ele um sol só seu, mesmo quando a chuva cai, mesmo a interior.
Faz muito tempo que o Músico não visita o Poeta. Mas a lanterna da amizade ainda pisca em certas datas, na esperança de que o Músico, lá de longe, a redescubra.
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O OLHAR DAQUELE HOMEM
Éramos dois homens e um elo eterno a nos ligar: o da amizade. Havíamos nos encontrado por acaso (se é que existe mesmo o acaso). Seu olhar me dizia tudo de si.
Assim, por um tempo, nos víamos sempre que dava, e quase nunca era fácil. Agendas difíceis, amigos sem Face, fomos ficando longe, você na “China”, e eu, só.
O olhar daquele homem, no entanto, se entranhou no meu e, durante o meu dia, várias vezes é com os olhos dele que eu vejo a vida. Poderia chorar... Mas, hoje, não.
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VINIL
Era o apartamento de um homem de quarenta e poucos anos de vida. E que vida! Estudara Direito, Biologia e se especializara em... Não sei, alguma coisa a ver com Bioética. Mas, no fundo, gostava mesmo era de música. Era um homem lindo. Por dentro e por fora. Sempre chamava a atenção de todas e de todos. Por onde ia, não ia em vão, era sempre visto. Mas sua alma, seu âmago, não estava nos diplomas que a duras penas conquistou. Não, senhor! Seu pedaço mais puro de si mesmo, sua pena delicada que seu anjo lhe deixara, sua luz era um pequeno vinil preto em que os Beatles entoavam a canção Hey Jude. Como adorava aquela música! Muito mesmo!
A vida era um sintoma da doença de existir. Meio forte, isso, comparar a vida e a existência a uma, uma dor. Mas que é a vida senão a sucessão de pequenos partos até que se parta de vez para... Para onde mesmo? Ah, para o Paraíso! É, para o Paraíso. Será que lá, onde Judas perdeu as botas, Pedro as reencontrou e Paulo as calçou de novo, será que lá no Paraíso tinha vitrola? Não sei, amigo.
O dono do apartamento de que falo era o Paulo. Ou Paul, para os que sabiam de sua adoração pelos Beatles. Sabe que tem gente mais nova que não sabe nem quem foram John, Paul, George e Ringo? Pois é, sinal dos (maus) tempos... Sabia que estava ficando velho e que, mais dia, menos dia, estaria ainda mais só do que já estava. O som da vida era um disco de vinil tocando os Beatles, fosse estéreo, fosse mono. O mais legal era ter alguém com quem ouvir. Não tinha, mas soltava a franga ouvindo os discos no domingo. Depois lhe dava uma tristeza, uma onda de saudade que soava em puro banzo na segunda.
Sua luz era um pequeno vinil. Hey Jude, seu hino de amor. Quer escutar?
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Textos enviados pelo autor.
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