Quem esteve naquele 70° aniversário de casamento não esquecerá o que presenciou. A esposa sofria do mal de Alzheimer. Com mais de 90 anos de idade, o marido a tratava com uma ternura comovente. Ele quis ler em público uma oração que tinha preparado para a ocasião.
Agradeceu a Deus pelos filhos numerosos, todos vivos, honrados e motivo de orgulho para os pais. Depois, rendeu graças pela companheira de tantos anos. A ela creditou os méritos pela linda família e por tudo que conseguiu como profissional e como cidadão: “Graças vos dou, Senhor, pela mulher extraordinária que me destes por esposa. Sem ela não sei o que teria sido de mim e de minha querida família”.
O fato me veio à memória quando li, nesta semana, que nossa cidade tem uma separação para cada dois casamentos. A matéria falava de casamento civil, não do religioso. Ainda assim, a proporção é assustadora. Assisti a casamentos – diácono ou padre assistem; quem celebra são os noivos – que duram mais de 40 anos e os esposos continuam amando-se intensamente. Falo de amor, não de paixão sexual. Também assisti a casamentos que não duraram três meses.
Depois de 50 anos de matrimônio, uma vovó dizia: “Estamos juntos não porque é fácil, mas porque Deus nos deu a graça de sabermos nos amar”. O segredo está no binômio Deus e amor. Funciona melhor que todas as lições de psicologia, antropologia ou sociologia.
Já foi dito que muitos filhos hoje exigem, como seu direito inalienável, que os pais lhes deem felicidade. Seja qual for sua condição, os pais são obrigados a torná-los felizes. Eles não têm que fazer nada: aos pais é que competem, por ofício, todos os encargos. O dramático é que, em sua maioria, os pais aceitam esse figurino calcado no consumismo, no hedonismo, no materialismo e no subjetivismo. Muitos suportam até agressões verbais dentro de casa, sofrem privações pessoais para que aos filhos não faltem mimos que julgam seu dever oferecer-lhes. Quantos pais e mães vivem autêntico drama de consciência por não conseguir dar aos filhos o que eles exigem.
Assim fica difícil. Filhos que, dentro de casa, desde bebezinhos, jamais ouviram um “não” crescem convencidos de que o mundo existe para satisfazer aos seus caprichos. Quando se casam, esperam que a nova vida lhes assegure os mesmos privilégios de que, como pequenos ditadores, desfrutavam junto de pais fracos. Que não terão que encontrar dificuldade ou sofrimento de espécie nenhuma. Imaginam que na condição de casados prosseguirão com as veleidades costumeiras. Quando não, com verdadeiras extravagâncias. Como no seu tempo de solteiros (as).
Aí, meu amigo, quando descobrem que não têm capacidade para sua nova situação, só resta pular fora do barco. As dolorosas consequências sobram para os outros.
Como, aliás, sempre aconteceu.
Fonte> https://angelorigon.com.br/2014/05/03/uma-para-cada-dois/. 03.maio.2014.
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