quarta-feira, 20 de dezembro de 2023

Jaqueline Machado (Isadora de Pampa e Bahia) – Capítulo 25: O egoísmo e seus estragos

Isadora, sentada no quarto, vestida de noiva em frente ao espelho da penteadeira, não conseguia conter a chuva de lágrimas que escorriam, molhando-lhe a face e o vestido. 

Sua alma parecia desejar ausentar-se do corpo. queria criar asas, e feito pássaro, voar livre, sem destino, mas não só, junto de seu amor. Queria Genuíno para seu parceiro de vida. pois ele era um homem de caráter, justo, sensível... O oposto de Fábio, tão egoísta.

E ela sentia desprezo por pessoas egoístas. Acreditava que as pessoas merecem se dar o devido valor, mas sem esquecer de valorizar o seu semelhante. Excesso de egoísmo, desconecta qualquer um da realidade, faz com que gente feito seu pai, tome a vida de outras pessoas para si, as destruindo em benefício próprio. O egoísmo é a régua torta usada pelos injustos para medir o mundo segundo seus próprios interesses. E, justamente por conhecer os estragos que o egoísmo é capaz de promover, ela estava ali, prestes a se sacrificar pela mulher que lhe deu a vida. 

O casamento seguiria sem amor, mas imaginava futuramente ser feliz como mãe ou desenvolver alguma habilidade útil para si e para quem mais precisasse. Ou, ainda, lecionar, reabrir a escolinha que foi da dona Almerinda. 

Isadora, mesmo chorando, não pensava em esmorecer. Sabia que encontraria um jeito de conduzir as rédeas do seu destino. 

A cerimônia seria realizada em Cachoeira, na igreja São José, construída com o empenho do Padre Orestes, o qual era uma espécie de figura histórica da cidade. Dono de uma personalidade forte, rígida. Mas era muito trabalhador. E criativo. Suas quermesses faziam sucesso e rendiam bons lucros à igreja. Unindo esforços junto aos devotos, o templo religioso mais moderno da cidade foi construído. 

A pedido da noiva, somente sua família, a família de Fábio e alguns poucos amigos se fizeram presentes.

Isadora buscou manter o controle de suas emoções e fazer o que tinha de ser feito. Enila e Júlio foram os padrinhos da noiva. E um casal de amigos de infância foram os padrinhos do noivo. 

O senhor Antônio, pai de Isadora, era todo sorriso ao conversar com os pais de Fábio. Dona Ana, mantinha-se sóbria. Pensativa sobre o sacrifício da filha. 

- Belo casal! Será uma honra realizar a cerimônia - disse o padre Orestes. 

Durante as palavras de juramento, Fábio se sentia visivelmente vitorioso. 

No momento do “sim”, Isadora sentiu a alma estremecer, mas concluiu o juramento. 

Após a cerimônia, os convidados, incluindo o padre Orestes, foram para a fazenda comemorar a união dos recém casados, num jantar discreto. 

Enquanto os homens preparavam o churrasco do lado de fora da casa, as mulheres preparavam, na cozinha, outros pratos para acompanhar a carne.

Na sala estavam os recém casados conversando a sós.

- Pareces triste – disse Fábio a Isadora  

- Não estou. É impressão tua.

- Olha, posso não ser quem sonhaste para esposo. Mas te farei feliz. Dê um sorriso. Estou constrangido em te ver assim toda vez que estou por perto.

- Tens razão. Vamos lá fora nos juntar aos demais. E tomar um bom vinho. 

- Isso. Quero nossas taças cheias.

Os peões, os pais dos noivos, os vizinhos da fazenda ao lado, Enila e Júlio, conversavam descontraidamente ao redor do fogo de chão.  

O Senhor Antônio ofereceu um “trago” ao padre.

- Só um gole. Sabe como é, sacerdotes têm que dar o bom exemplo ao seu rebanho. 

- Deixa de besteira, padre.  É noite de festa. Aproveita – disse o anfitrião.

- Não acredito. 

- O que houve, padre? 

- A velha feiticeira tá chegando. 

- É minha convidada - disse Isadora.

- Filha, não sabes? 

- Do que, padre? 

- Ela é uma feiticeira. 

- Ela é uma curandeira. Já devolveu a vida a muitos doentes desenganados pelos médicos.

- Mas por meio de sortilégios. Esses procedimentos não são da vontade do Senhor.

- “Fia”, mandou me chamar, tô aqui – disse Vó Gorda. 

- Sim. Precisava vê-la. Sua presença me dá paz - falou Isadora abraçando-a.

O padre olhou para Isadora fazendo uma expressão de espanto. 

- Como vai, Reverendo? - perguntou a benzedeira.

- Muito bem, graças a Deus. 

- Tudo que é bom vem dele, do Criador. 

- Mais a sua grande invenção foi as chinocas - disse o velho Antônio.

- A sua grande invenção foi o amor - disse Vó Gorda.

- Bem... Nesse ponto concordo com a senhora.

A mesa, belamente posta por Amélia, foi elogiada. E todos se serviram à vontade. 

Mais tarde, quando os convidados foram embora, Isadora se deparou com a situação mais delicada e difícil de sua vida: ir para cama com um desconhecido, que de repente virou seu marido, era uma situação que a assustava, mas da qual não podia escapar.

As cenas de amor com Genuíno vieram à sua mente. E pensou: “será que Fábio vai perceber que não sou mais virgem? 

Que Nossa Senhora, mãe de Jesus me cubra com seu manto de proteção e amor. 

No quarto, enquanto Fábio despia sua mulher, do outro lado do cenário, armado, Genuíno chorava a perda do seu grande amor.
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continua…

Fonte: Texto enviado pela autora 

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