Isadora, sentada no quarto, vestida de noiva em frente ao espelho da penteadeira, não conseguia conter a chuva de lágrimas que escorriam, molhando-lhe a face e o vestido.
Sua alma parecia desejar ausentar-se do corpo. queria criar asas, e feito pássaro, voar livre, sem destino, mas não só, junto de seu amor. Queria Genuíno para seu parceiro de vida. pois ele era um homem de caráter, justo, sensível... O oposto de Fábio, tão egoísta.
E ela sentia desprezo por pessoas egoístas. Acreditava que as pessoas merecem se dar o devido valor, mas sem esquecer de valorizar o seu semelhante. Excesso de egoísmo, desconecta qualquer um da realidade, faz com que gente feito seu pai, tome a vida de outras pessoas para si, as destruindo em benefício próprio. O egoísmo é a régua torta usada pelos injustos para medir o mundo segundo seus próprios interesses. E, justamente por conhecer os estragos que o egoísmo é capaz de promover, ela estava ali, prestes a se sacrificar pela mulher que lhe deu a vida.
O casamento seguiria sem amor, mas imaginava futuramente ser feliz como mãe ou desenvolver alguma habilidade útil para si e para quem mais precisasse. Ou, ainda, lecionar, reabrir a escolinha que foi da dona Almerinda.
Isadora, mesmo chorando, não pensava em esmorecer. Sabia que encontraria um jeito de conduzir as rédeas do seu destino.
A cerimônia seria realizada em Cachoeira, na igreja São José, construída com o empenho do Padre Orestes, o qual era uma espécie de figura histórica da cidade. Dono de uma personalidade forte, rígida. Mas era muito trabalhador. E criativo. Suas quermesses faziam sucesso e rendiam bons lucros à igreja. Unindo esforços junto aos devotos, o templo religioso mais moderno da cidade foi construído.
A pedido da noiva, somente sua família, a família de Fábio e alguns poucos amigos se fizeram presentes.
Isadora buscou manter o controle de suas emoções e fazer o que tinha de ser feito. Enila e Júlio foram os padrinhos da noiva. E um casal de amigos de infância foram os padrinhos do noivo.
O senhor Antônio, pai de Isadora, era todo sorriso ao conversar com os pais de Fábio. Dona Ana, mantinha-se sóbria. Pensativa sobre o sacrifício da filha.
- Belo casal! Será uma honra realizar a cerimônia - disse o padre Orestes.
Durante as palavras de juramento, Fábio se sentia visivelmente vitorioso.
No momento do “sim”, Isadora sentiu a alma estremecer, mas concluiu o juramento.
Após a cerimônia, os convidados, incluindo o padre Orestes, foram para a fazenda comemorar a união dos recém casados, num jantar discreto.
Enquanto os homens preparavam o churrasco do lado de fora da casa, as mulheres preparavam, na cozinha, outros pratos para acompanhar a carne.
Na sala estavam os recém casados conversando a sós.
- Pareces triste – disse Fábio a Isadora
- Não estou. É impressão tua.
- Olha, posso não ser quem sonhaste para esposo. Mas te farei feliz. Dê um sorriso. Estou constrangido em te ver assim toda vez que estou por perto.
- Tens razão. Vamos lá fora nos juntar aos demais. E tomar um bom vinho.
- Isso. Quero nossas taças cheias.
Os peões, os pais dos noivos, os vizinhos da fazenda ao lado, Enila e Júlio, conversavam descontraidamente ao redor do fogo de chão.
O Senhor Antônio ofereceu um “trago” ao padre.
- Só um gole. Sabe como é, sacerdotes têm que dar o bom exemplo ao seu rebanho.
- Deixa de besteira, padre. É noite de festa. Aproveita – disse o anfitrião.
- Não acredito.
- O que houve, padre?
- A velha feiticeira tá chegando.
- É minha convidada - disse Isadora.
- Filha, não sabes?
- Do que, padre?
- Ela é uma feiticeira.
- Ela é uma curandeira. Já devolveu a vida a muitos doentes desenganados pelos médicos.
- Mas por meio de sortilégios. Esses procedimentos não são da vontade do Senhor.
- “Fia”, mandou me chamar, tô aqui – disse Vó Gorda.
- Sim. Precisava vê-la. Sua presença me dá paz - falou Isadora abraçando-a.
O padre olhou para Isadora fazendo uma expressão de espanto.
- Como vai, Reverendo? - perguntou a benzedeira.
- Muito bem, graças a Deus.
- Tudo que é bom vem dele, do Criador.
- Mais a sua grande invenção foi as chinocas - disse o velho Antônio.
- A sua grande invenção foi o amor - disse Vó Gorda.
- Bem... Nesse ponto concordo com a senhora.
A mesa, belamente posta por Amélia, foi elogiada. E todos se serviram à vontade.
Mais tarde, quando os convidados foram embora, Isadora se deparou com a situação mais delicada e difícil de sua vida: ir para cama com um desconhecido, que de repente virou seu marido, era uma situação que a assustava, mas da qual não podia escapar.
As cenas de amor com Genuíno vieram à sua mente. E pensou: “será que Fábio vai perceber que não sou mais virgem?
Que Nossa Senhora, mãe de Jesus me cubra com seu manto de proteção e amor.
No quarto, enquanto Fábio despia sua mulher, do outro lado do cenário, armado, Genuíno chorava a perda do seu grande amor.
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continua…
Fonte: Texto enviado pela autora
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