sexta-feira, 5 de julho de 2024

Vereda da Poesia = 53 =


Trova humorística do Rio de Janeiro/RJ

JOUBERT DE ARAÚJO E SILVA 
Cachoeiro de Itapemirim/ES, 1915 - 1993, Rio de Janeiro/RJ

Cegonha é coisa de rico
e não passa de pilhéria...
- Quem trouxe o filho do Chico
foi o urubu da miséria!
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Poema de São Francisco de Itabapoana/RJ

ROBERTO PINHEIRO ACRUCHE

Caminhos

Caminhos… Caminhos!
Cada um com a sua história,
cada um com um destino!…
Caminhos que levam e trazem;
caminhos cruzados, esquecidos, abandonados;
caminhos que se encontram;
caminhos que se perdem!…
Caminhos do medo, da incerteza e da revolta;
caminhos dos enganos e dos desenganos,
onde durante anos aguardei a sua volta!…
Caminho da insensatez, da vaidade;
pelo qual você foi
deixando de vez
um peito angustiado,
sofrendo de saudade.
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Aldravia de Mariana/MG

J. B. DONADON-LEAL

brigadeiro
cajuzinho
quindim
barrigas
nos
olhos
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Soneto de Caucaia/CE

JOSÉ RIOMAR DE MELO

Meu verso

 Se meu verso te agrada, te conforta,
 Faz lembrar-te emoções que já viveste,
 Com algum deles talvez te comoveste,
 Ativando a esperança quase morta!

 É sinal que choveu na minha horta,
 Na emoção que a mim tu concedeste,
 Ao sentir que no verso que tu leste
 De euforia e de paz teu peito aborta;

 Entretanto se um deles não ressoa,
 Na fiel sintonia e te magoa,
 Na palavra ou na frase te feriu...

 Eu te peço perdão em tom profundo,
 Porque mesmo agradar a todo mundo,
 Jesus Cristo também não conseguiu...
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Trova Premiada em Natal, 2008

FRANCISCO JOSÉ PESSOA
Fortaleza/CE, 1949 - 2020

Na velhice, idade mestra
já sem forças para o embate,
vem a morte e nos sequestra
sem sequer pedir resgate.
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Poema de Curitiba/PR

PAULO LEMINSKI
(1944 – 1989)

Pareça e Desapareça

Parece que foi ontem.
Tudo parecia alguma coisa.
O dia parecia noite.
E o vinho parecia rosas.
Até parecia mentira,
tudo parecia alguma coisa.
O tempo parecia pouco,
e a gente se parecia muito.
A dor, sobretudo,
parecia prazer.
Parecer era tudo
que as coisas sabiam fazer.
O próximo, eu mesmo.
Tão fácil ser semelhante,
quando eu tinha um espelho
pra me servir de exemplo.
Mas vice versa e vide a vida.
Nada se parece com nada.
A fita não coincide
Com a tragédia encenada.
Parece que foi ontem.
O resto, as próprias coisas contem.
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Quadra Popular de Portugal

MARIA DE LOURDES GRAÇA CABRITA

Já tenho sinal aberto
pra no céu poder entrar,
não sei qual o dia certo,
vou quando Deus me chamar.
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Soneto de Curitiba/PR

EMÍLIO DE MENESES
Curitiba/PR, 1866 – 1918, Rio de Janeiro/RJ

Um narigudo

Homem sério, porém politiqueiro,
De inteligência mais ou menos clara,
É um edil, camarista ou camareiro,
De raro estofo e de feição bem rara.

Mais seco do que arenque de fumeiro,
Todo feito em lasquinhas de taquara,
Sacode em contorções o corpo inteiro
E tem puxos de filme pela cara.

Tem um nariz de cinco ou seis andares.
Se ele o entulhasse, num mister diverso,
De bicha, traques, fogos populares,

Faria uma fortuna, — é incontroverso, —
Pois, naquele nariz, turvem-se os ares!
Cabem todos os traques do universo!
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Trova de São Fidélis/RJ

ANTONIO MANOEL ABREU SARDENBERG

Nascemos com o passaporte
com visto para a partida,
mas só de pensar na morte,
sinto saudade da vida!
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Poema dos Estados Unidos

LAWRENCE FERLINGHETTI
Bronxville/New York, 1919 – 2021,  São Francisco/Califórnia

15

Correndo risco constante
de absurdo e morte
toda vez que atua em cima
das cabeças da audiência
o poeta sobe pela rima
como um acrobata
para a corda elevada que ele inventa
e equilibrado nos olhares acesos
sobre um mar de rostos
abre em seus passos uma via
para o outro lado do dia
fazendo além de entrechats
truques variados com os pés
e gestos teatrais da pesada
tudo sem jamais tomar uma
coisa qualquer
pelo que ela possa não ser
Pois ele é o super-realista
que tem de forçosamente notar
a verdade tensa
antes de ensaiar um passo ou postura
no seu avanço pressuposto
para o poleiro ainda mais alto
onde com gravidade a Beleza
espera para dar
seu salto mortal

E ele um pequeno
homem chapliniano
que poderá ou não pegar
aquela forma eterna e bela
projetada no ar
vazio da existência

(tradução: Leonardo Fróes)
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Haicai de Belo Horizonte/MG

ÂNGELA TOGEIRO 

Traças nos armários,
destroem qualquer passado,
roendo o inútil.
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Soneto do Paraná

EMILIANO PERNETA 
Pinhais/PR, 1866 — 1921, Curitiba/PR

Iguaçu

Ó rio que nasceu onde nasci, ó rio
Calmo da minha infância, ora doce, ora má,
Belo estuário azul, espelhado e sombrio,
Quanto susto me deu, quanto prazer me dá!

Quantas vezes eu só, nestas manhãs de estio,
Ao vê-lo deslizar, pomposamente, lá,
Pálido não fiquei, tão majestoso vi-o,
Orgulho do Brasil, glória do Paraná!

Companheiro ideal! Durante toda a viagem,
Foi o espelho fiel a refletir a imagem,
Dos mantos e dos céus, discorrendo através

Da floresta, ora assim como um cão veadeiro,
A fugir, a fugir alegre e alvissareiro,
Ora deitado aqui quase a lamber-me os pés!
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Trova do Rio de Janeiro/RJ

APARÍCIO FERNANDES 
Acari/RN, 1934 – 1996, Rio de Janeiro/RJ

Os noivos fazem questão
de ter as mãos sempre unidas.
- É fácil unir as mãos...
difícil é unir as vidas!
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Glosa de Ipameri/GO

LUPÉRCIO MUNDIM

Sonhos e ilusões

MOTE:
Quantos sonhos e ilusões
tecemos na mocidade!
Mas, nas cinzas das paixões,
nos resta apenas saudade.
Angela Stefanelli de Moraes 
(Niterói/RJ)

GLOSA:
Quantos sonhos e ilusões
juntamos pela existência,
sendo que as desilusões
do sonho é a desistência.

Milhares de sonhos lindos
tecemos na mocidade!
Muitos deles não são findos,
nos trazendo ansiedade.

Machucamos corações,
tirando-lhes a esperança.
Mas nas cinzas das paixões
encontramos temperança.

Seguimos mesmo feridos,
mantendo a afetividade,
porque dos sonhos perdidos
nos resta apenas saudade.
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Aldravia de Anastácio/MS

FLÁVIA GUIOMAR ROHDT

seus
olhos
faróis
necessários
nessa
escuridão
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Soneto de Minas Gerais

CLÁUDIO MANOEL DA COSTA
Mariana/MG, 1729 – 1789, Ouro Preto/MG

Onde estou?

Onde estou? Este sítio desconheço:
quem fez tão diferente aquele prado?
Tudo outra natureza tem tomado;
e em contemplá-lo, tímido esmoreço.

Uma fonte aqui houve; eu não me esqueço
de estar a ela um dia reclinado;
ali em vale um monte está mudado:
quanto pode dos anos o progresso!

Árvores aqui vi tão florescentes,
que faziam perpétua a primavera:
nem troncos vejo agora decadentes.

Eu me engano: a região esta não era;
mas que venho a estranhar, se estão presentes
meus males, com que tudo degenera!
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Trova de Mangualde/Portugal

ELISABETE AGUIAR
(Elisabete do Amaral Albuquerque Freire Aguiar)

Não quero correr Contigo,
mas a Teu lado correr,
pra correr com o perigo
que corre pra me vencer.
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Poema de Portugal

ÂNGELO DE LIMA
Porto, 1872 – 1921, Lisboa

Olhos de lobas

 Teus olhos lembram círios
Acesos num cemitério...
Dr. Rogério de Barros

 Têm um fulgor estranho singular
Os teus olhos febris... Incendiados!...
 
Como os clarões finais... - Exaustinados
Dos restos dos archotes, desdeixados...
— Nas criptas dum jazigo tumular!...

 — Como a luz que na noite misteriosa
— Fantástica - Fulgisse nas ogivas
das janelas de estranho mausoléu!...

 — Mausoléu, das saudades do ideal!...

 — Oh saudades... Oh luz transcendental!
— Oh memórias saudosas do ido ao céu!...

 — Oh perpétuas febris!... - Oh sempre vivas!...
— Oh luz do olhar das lobas amorosas!...
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Triverso de de São Paulo/SP

JEFFERSON HENRIQUE MODESTO

Vovô na varanda
Só tem um pensamento –
Mais uma geada!
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Setilha de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Quanto sonho o verso opera...
Da Argentina a Portugal,
de Porto Alegre ao Caribe,
da Venezuela a Natal.
Sonho que une as nossas mãos
numa corrente de irmãos
tecendo um lindo ideal.
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Trova de Niterói/RJ

ELEN DE NOVAES FELIX

As espadas da descrença
não ferem meu coração,
nem há presságio que vença
o poder de uma oração.
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Hino de Santos/SP

Compositores: Maugeri Neto/ Maugeri Sobrinho

Santos poema, jardins pela praia
Cidade e porto de mar
Tens a magia de barcos estranhos
Na barra esperando adentrar
Morros, varandas alegres
Suspensas no arvoredo
Santos das ruas antigas
À beira do cais
Que escondem segredos

Tuas paineiras floridas
Salgueiros que choram
Nos velhos canais
Santos, cuidado menina
As tuas belezas
Não percas jamais

Os flamboiãs florescentes
Palmeiras imperiais
Ilha Urubuqueçaba
O verde reduto
Nas ondas do mar

Oh! Santos
És linda demais!
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A Beleza e a Magia de Santos: Um Hino à Cidade
O 'Hino de Santos - SP' é uma celebração poética da cidade de Santos, localizada no litoral do estado de São Paulo. A letra da música destaca a beleza natural e a importância histórica da cidade, que é conhecida por seus jardins à beira-mar, suas ruas antigas e seu porto movimentado. A canção começa exaltando a magia dos barcos que chegam ao porto, trazendo consigo um ar de mistério e aventura. Essa imagem evoca a importância de Santos como um ponto de conexão entre o Brasil e o mundo, um lugar onde culturas se encontram e se misturam.

A música também faz referência aos elementos naturais que compõem a paisagem de Santos, como os morros, as varandas alegres e as paineiras floridas. Esses elementos são apresentados de forma quase nostálgica, como se fossem guardiões dos segredos da cidade. A menção aos salgueiros que choram nos velhos canais adiciona um toque de melancolia, sugerindo que a cidade tem uma história rica e complexa, cheia de momentos de alegria e tristeza.

Além disso, o hino faz um apelo para que a cidade preserve suas belezas naturais e arquitetônicas. A referência à Ilha Urubuqueçaba e às palmeiras imperiais reforça a ideia de que Santos é um lugar único, com uma biodiversidade e uma arquitetura que merecem ser protegidas. A exaltação final, 'Oh! Santos, és linda demais!', resume o sentimento de admiração e amor pela cidade, convidando os ouvintes a valorizar e cuidar desse patrimônio. (https://www.letras.mus.br/hinos-de-cidades/467139/)
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Poetrix de Limeira/SP

CARLOS ALBERTO FIORE

dia-a-dia 

Rostos pesados.
Corações ásperos.
As ruas se apressam.
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Soneto de Joaçaba/SC

MIGUEL RUSSOWSKY
Santa Maria/RS, 1923 – 2009, Joaçaba/SC

Outono em meio

O vento desistiu de seus andares,
cansou-se e resolveu dormir mais cedo.
As folhas, nem balançam no arvoredo.
Borboletas...algumas pelos ares.

Nuvenzinhas solteiras e sem medo
buscam no céu seus noivos ou seus pares.
Cá por dentro borbulham os cismares
numa ausência de rumos e de enredo.

(- Ó tardes, de domingo, ensolaradas!...)
O silêncio murmura uma cantiga
para ouvirmos a sós...mas de mãos dadas.

Deixemos, por enquanto o lábio mudo!
E o relógio, deixemos que prossiga...
Conversar?...Para que, se sabes tudo?!.
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Trova de Santa Juliana/MG

DÁGUIMA VERÔNICA

Deixaste sobre o deserto
pegadas de tua andança;
o vento virá, por certo,
dissipar qualquer lembrança.
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

A andorinha e os passarinhos

Certa andorinha que por esse mundo
Mil viagens fizera,
De muito e muito ver muito aprendera.
Chegara a tal primor, que ainda a tormenta
Nem sequer negrejava,
E já ela às marítimas companhias
A queda anunciava.
Sucedeu que no tempo em que é costume
Começar-se do linho as sementeiras,
Viu que um maltês andava nessa faina
Pelas compridas leiras.
«Mau vai isto — disse ela aos passarinhos —
Causais-me dó; por mim, tenho caminhos
De sobra onde vogar.
Vedes-me aquela mão que diligente
Gira e torna a girar?
Pois não vem longe o dia em a semente
Que hoje essas linhas traça,
Vos cause, pobre gente,
Eu sei, quanta desgraça!
Tereis a cada canto uma armadilha,
Perpétuo susto em horas de canseira;
Que na estiva sazão quando o sol brilha,
Anda perto a gaiola da caldeira.
Devorai-me esse pão já semeado,
E lestes, podeis crer».
Fez-lhe chacota o bandozinho alado:
Tinha mais que comer.
Ao surdir o linhal volta a andorinha:
«Fora com esta planta que é daninha,
Ou perdidos ficais!
Profeta de desastres, tagarela,
Bom feito nos lembrais;
Fora mister para um desbaste desses
Mil pessoas, ou mais!»
Crescera o linho, e a astuta conselheira
Insiste em martelar:
«Vejo que não há forma nem maneira
De vos poder guiar;
Pois, olhai: dentro em pouco o seareiro.
Apenas vir que a messe lhe loureja,
Põe logo mão na rede, e muito arteiro
Convosco entra em peleja
Sem vos deixar a cola;
Não sair do cadoz, e muito tento,
Ou dar asas ao vento
Como sucede ao pato e à galinhola.
Mas vós não podeis tal, não vos é dado
Transpor o monte, o cerro, a extensa onda:
Pois cada qual, prudente e a bom recado,
Na mais profunda toca se me esconda».
Refartos de presságios, os incautos
Rompem a vozear num desatino,
Quais Troianos no tempo em que Cassandra
Lia o porvir nas folhas do destino.
Andaram por igual: da passarada.
Muita se viu prender.

Nós damos peito à nova, se ela agrada,
E só cremos no mal depois de o ver.

(tradução: E. A. Vidal)

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