quarta-feira, 6 de março de 2013

Mevlana Jalaluddin Rumi (Poesias da Pérsia Antiga)

O CORAÇÃO e A ALMA
A brisa da manhã trouxe-nos uma mensagem:
Viste tu no caminho um coração pleno de fogo,
Viste tu este coração abraçado e cheio de paixão
Que incendeia cem rochedos de sua chama?

A VISÃO

Quem terá visto algo que em realidade existe, mas não se manifesta?
Quem terá visto o que se manifesta no coração, mas não repousa nos lábios?
Quem terá visto aquele que é a realidade do mundo, mas não se encontra no mundo?
Quem terá visto na existência e na não-existência uma tal não-existência?

A CASA DE HÓSPEDES

O ser humano é uma casa de hóspedes.
Toda manhã uma nova chegada.

A alegria, a depressão, a falta de sentido, como visitantes inesperados.

Receba e entretenha a todos
Mesmo que seja uma multidão de dores
Que violentamente varrem sua casa e tira seus móveis.
Ainda assim trate seus hóspedes honradamente.
Eles podem estar te limpando
para um novo prazer.

O pensamento escuro, a vergonha, a malícia,
encontre-os à porta rindo.

Agradeça a quem vem,
porque cada um foi enviado
como um guardião do além.

NO AMOR…
"Sai do círculo do tempo
e entra no círculo do amor.
Desce à rua das tavernas
e senta entre os beberrões.

Se queres a visão secreta,
fecha teus olhos.
Se desejas um abraço,
abre teu peito.

Se anseias por uma face com vida,
rompe este rosto de pedra.
Por que hás de pagar o dote da vida
a essa velha bruxa, a terra?

Mil gerações já gozaram
do que agora tens.
Prova a doçura em tua boca
que antes foi flor, abelha e mel.

Vamos, aceita esta pechincha:
dá uma única vida
e leva uma centena."
––––––––––––––-

"Existe melhor solução que a loucura?
Cem âncoras despedaçadas por causa da loucura.

Quantos pela razão se tornaram infiéis?
Alguém jamais viste infiel por loucura?

A tristeza engordou, então vai, torna-te louco,
A tristeza definha por causa da loucura.

À taverna aonde vão os loucos de amor,
Vá logo, e toma da taça oferecida pela loucura.

Infelizes, foram eles, e sem nenhum proveito,
Os sultões turcos, privados da loucura.

Felizes e vitoriosos, amados da fortuna,
os ginetes guerreiros, por causa da loucura.

Tu sobes aos céus, semelhante à Jesus,
Se tens por auxílio a pluma da loucura.

Ó tu, Chams de Tabriz, impelido por teu amor,
Cem portas se me abriram pela loucura”

TREZE POEMAS

I
As palavras, mesmo que venham da alma,
ocultam a alma, como a névoa pairando sobre o oceano
cobre a costa, os peixes, as pérolas.
É um trabalho nobre construir discursos filosóficos coerentes,
mas eles bloqueiam o sol da verdade.
Veja as qualidades de Deus como um oceano
e este mundo como a espuma sobre a pureza delas.
Limpe a superfície e veja além do alfabeto direto para a essência,
assim como você faz com os cabelos
que cobrem os olhos de sua amada. 

Eis o mistério: esse mundo complexo e surpreendente
é a prova da presença de Deus
mesmo estando cobrindo a beleza.
Um floco da parede de uma mina de ouro
não dá muito a ideia de como é quando
o sol brilha lá dentro e torna o ar e os trabalhadores dourados.

II

Você é o amanhecer que chega no meio da noite,
fios de cabelo de música preenchendo a flauta,
a compreensão entrando através do ouvido e do olho,
o perfumado vapor do sabonete.
Sinais e instruções específicas articulam-se de você,
ensinando-nos novas maneiras de peregrinar.
Perguntar por que e como já não é mais correto.
Digamos que a alma é como os pés de uma formiga,
ou a água do mar, amarga e salgada,
ou uma cobra que tem também o antídoto
para o seu veneno em seu crânio:
nós rompemos através destas formas enigmáticas
para nos sentar em sua sombra da manhã.

III

Este momento maravilhoso, o gosto do nada,
na companhia dos pobres e dos vazios.
Sente-se com Bistami, não com algum adivinho.
Existem mais do que dois feriados no ano!
Nós celebramos um nascimento e um solstício a cada segundo.
Recém-nascidos, precisamos de pão fresco!
A vida cresce dos mortos,
da mesma forma que os vivos são levados para a morte.
Ramos secos para o fogo:
galhos verdes curvam-se no chão com os frutos;
o prazer preenche o seio de uma mãe:
coloque sua boca ali e mame. Você deve.
Fiz muitos discursos elegantes para a assembleia.
Agora é hora de andar lá fora e ficar em silêncio.
Shams me atrai para as palavras, depois dois dias de silêncio.

IV

O cantor canta sobre o amor,
até que o Amigo aparece na soleira da porta.
A fumaça da cozinha flutua para as nuvens
e se torna um vinho de mil anos.
Estou aqui,
não calculando o crédito acumulado ou com especulações futuras.
Sou a vinha e o barril onde as uvas são esmagadas,
toda a operação cuja transação despeja esta taça de vinho,
este momento, este poema.
Um homem se depara com a bagagem,
papeis da casa, arrependimento e desejo,
não sabendo para qual tender.
Nenhum deles.
Depois que você tiver visto a face, as preocupações mudarão,
assim como a água do lago torna-se bruma.

V

O amor está vivo e alguém recebendo seu suporte
está mais vivo do que os leões rugindo
ou que os homens com uma coragem feroz.
Bandidos armam emboscadas uns para os outros na estrada.
Eles conseguem riqueza, mas permanecem em um só lugar.
Os amantes ficam se movendo,
nunca o mesmo, nem por um segundo!
O que faz os outros chorarem eles apreciam!
Quando eles parecem bravos eles não acreditam em suas faces.
É um raio da primavera, uma piada diante da chuva.
Eles mastigam espinhos até o fim juntamente com a grama do pasto.
Gazelas e leões jantando.
O amor é invisível exceto aqui em nós.
Às vezes louvo o amor, às vezes o amor louva a mim.
O amor, uma pequena concha
em algum lugar do fundo do oceano,
abre sua boca. Você e eu e nós, esses seres imaginários,
entram na concha como um único gole de água do mar.

VI

 Você veste uma lã grosseira, mas você é um rei,
assim com a energia da alma se esconde,
 como o amor se lembra.
Você entra nesta sala numa forma humana
e como a atmosfera que respiramos.
Você é o polo central através dos nove níveis
conectando nós e eles a absoluta ausência.
Para que possamos obter o que queremos
você dá falha e frustração.
Você quer apenas a companhia do leão e seu filhote,
não de pernas vacilantes.
Aquele homem ali que você sugere
deve remover sua cabeça antes de entrar no templo.
Então ele poderá ouvir sem ouvidos a voz que diz:
Minha criatura.
A estrada que leva um mês para ser percorrida
você cobre essa distância em um dia.
Não ligue para pagamentos de ouro e prata.
Quando sentir-se generoso, dê a sua cabeça.
Minha beleza, você não precisa de um guia.
Aquele que segue e aquele que lidera são inseparáveis,
assim como a lua e o círculo ao seu redor.
Um árabe arrasta seu camelo de cidade em cidade.
Você segue através de seus problemas e mudanças de crença,
ambos não são diferentes da lua movendo-se
ou do manjericão crescendo e sendo cortado para um buque.
Não importa que você tem estado perdido.
A poupa ainda está lhe procurando.
É um novo começo, meu amigo,
esse acordar numa manhã sem neblina
e a ajuda chegar sem você pedir!
Uma taça submersa está girando dentro do vinho.
Com o pesar mandado para longe chega uma doce gratidão.

VII

Para a ausência o incenso queima perfumado.
O amor que sentimos é a fumaça disso.
 A existência é pintada pela não existência – sua fonte,
o fogo por trás da tela.
A fumaça nascida desse fogo esconde o fogo!
Passe através da fumaça.
A alma, um rio um movimento,
o corpo, o leito do rio.
A alma pode quebrar o círculo do destino e do hábito.
Segure as mãos da ausência
e deixe-a o levar através das Plêiades,
abandonando seco e molhado, quente e frio.
Você se tornará um confidente de Shams de Tabriz.
Você verá claramente a glória do nada
e inexplicavelmente permanecerá ali.

VIII

Veja como o desejo mudou em você,
O quão leve e sem cor ele está,
Com o mundo gerando novas maravilhas
Por causa de sua mudança.
Sua alma tornou-se uma abelha invisível.
Não vemo-na trabalhando, mas ali está uma colmeia inteira!
Seu corpo mede por volta de um metro e tanto,
mas sua alma eleva-se pelos nove níveis do céu.
Um barril arrolhado com terra e uma estaca de madeira bruta
Mantém em seu interior o mais velho vinho da vinha.
Quando lhe vejo, não é tanto a forma física,
mas a companhia de dois cavaleiros,
sua devoção de puro fogo e seu amor por aquele que lhe ensina;
em seguida o sol e a lua um passo atrás.

IX

Para um dervixe todos os dias são como sexta-feira,
como o início de um feriado,
Um começo de uma viagem que não terá fim.
Vestido na beleza da alma, você é um mês todo de sextas-feiras,
Doce lá fora, doce aqui dentro.
Sua mente e seu ser profundo caminham juntos
como dois amigos caminham para dentro de sua amizade.
As ruínas não permanecem no lugar num riacho que corre rápido.
Deixe os ressentimentos serem lavados no oceano.
O olho de sua alma assiste um ramo verde da primavera mover-se,
enquanto que esses outros olhos amam velhas histórias.

X

Siga o conselho de janeiro. Empilhe a lenha.
O tempo ficará frio inevitavelmente
e você fará fogo para permanecer saudável.
Estude a grande metáfora desse trabalho anual.
A lenha é um símbolo para a ausência.
O fogo, para o seu amor por Deus.
Nós queimamos a forma para aquecer a alma.
A alma ama o inverno, por isso ela aceita relutantemente
o conforto da primavera com suas dádivas elegantes e proliferastes.
Tudo é parte do plano: o fogo virando cinzas,
virando o solo do jardim, virando hortelã, salgueiro e tulipa.
O amor se parece com o fogo. Alimente-se nele.
Seja a lareira e a lenha.
Parabéns por essa metalurgia que faz uma agulha de uma barra de metal fundido.
Acalme o fogo agora: para a mariposa uma janela,
para você uma armadura de rosas!
O faraó dissolve como iogurte na água.
Moisés vem para o topo como óleo.
Árabes finos carregam a realeza.
Cavalos, os sacos de esterco seco.
A linguagem é um barulho irritante no moinho do significado.
Um rio silencioso gira a pedra de moer.
As palavras-grão são ruidosamente despejadas na esteira,
pulverizadas sob a pedra como fofoca.
Deixe este poema ser assim moído.
Deixe-me retornar para o fogo do amor
que refina o puro ouro de meu amigo, Shamsuddin.

XI

Vejo minha beleza em você. Torno-me um espelho
que não pode fechar os olhos para o seu anseio.
Meus olhos molhados com os seus na luz do alvorecer.
A cada momento minha mente dá a luz, sempre concebendo,
sempre no nono mês, sempre no ponto. Como aguento isso?
Tornamo-nos estas palavras que dizemos,
o som de um pranto movendo-se no ar.
Estes milhares mundos que surgem de lugar nenhum,
como pode sua face contê-los?
Sou uma mosca no seu mel, então mais perto,
uma mariposa pega na fascinação da chama,
depois um céu vazio estendido em homenagem.

XII

A lua vem visitar como um convidado da noite.
A rosa senta-se ao lado do espinho.
Alguém lavando roupas pede pela misericórdia do sol!
O compasso da perna circula o ponto.
Maomé chega aqui, um estranho,
uma nascente para esta árvore seca.
Hallaj sorri em sua cruz.
A romãzeira floresce. Todos falam sobre as folhagens,
não com palavras mas quietamente
de mesma forma que o próprio verde fala de dentro,
conforme começamos a viver nosso amor.

XIII

Estou aqui, neste momento, dentro da beleza,
o presente que Deus deu, nosso amor:
este sinal circular e dourado
significa que estamos livres de qualquer dever:
da eternidade volto minha face para você
e para dentro da eternidade:
temos estado apaixonados todos esse tempo.

Fontes:
http://poesiaexpressaodaalma.blogspot.com/search/label/Jalal-ud-Din%20Rumi
http://ricardo-yoga.blogspot.com/2012/05/jalaluddin-rumi-treze-poemas.html

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