sábado, 11 de janeiro de 2014

Jangada de Versos do Ceará (4)

BATISTA DE LIMA
Lavras da Mangabeira (1949)

SEGUNDA-FEIRA

A segunda-feira amanheceu
de cara feia
batendo as portas
e acordando a todos
nervosamente

Encheu os coletivos
de descontentes
entupiu as ruas de carros
e andantes apressados

A segunda-feira
estava naqueles dias

 CONSTATAÇÃO II

Na primeira viagem que fiz
estranhei não poder levara o açude
e os potes

Na segunda viagem tentei
levar o alpendre

Na terceira não tentei
mais nada
apenas acenei para o engenho

Nas outras fui esquecendo despedidas
pois finalmente descobri
que todos iam comigo
onde quer
que eu pudesse ir
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ANTONIO GIRÃO BARROSO
Araripe (1914 – 1990) Fortaleza

AS TRÊS PESSOAS

Eram três pessoas distintas mas uma só, na verdade:
eu, o Floro e o Assis.
Três corpos numa lama só.
(O povo dizia que nós éramos
três amizades perfeitas
e meninos de futuro, sim senhor.)
Depois veio o tempo mau
o tempo que tudo leva
e levou o Floro pro céu.
O Assis ficou na terra.
Eu não sei onde fiquei.

SONETO À LUA
                               A Arthur Eduardo Benevides

Lua Branca, como é terrível tua face      
No céu escancarada, a se mostrar aos homens
Ó astro fluorescente, a espiar as mazelas
Surgidas cá em baixo, ao toque das espumas.

Mulher, ó dulçorosa, o mar te espelha tímida
Mente, corça da noite, ó tu, lua fremente
Que navegas ao léu, sem bússola nem norte
Lua branca, vergel, perdida nas alturas.

Continente de gelo, o sangue tu derramas
De virgens sem fanal, ao jeito das marés
Que sacodem o meu barco, a dois passos da terra

Não te deténs, ó lua, e indiferente estás
A brisa que se espalha, terna como carícia
ou aos ventos tão febris, que acordam as madrugadas.
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ARY ALBUQUERQUE
Fortaleza (1934)
-
ECO

Meu eco extravasou-se em desatino,
perdeu sem saber o seu destino,
sumiu no mar em desaprumo
e sem querer, coitado,
perdeu seu rumo.

Melhor ficasse aqui olhando o sol que brilha,
pastorando no céu o cintilar de estrelas,
ou me envolvesse inteiro com a noite fria,
respirando o ar seco que o espaço trilha.

LAMENTAÇÕES


Não choro a chuva.
Não choro o vento.
Choro o meu lamento
por alguma coisa que me fez triste
e triste vivo ao relento.
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CÂNDIDO ROLIM
(José George Cândido Rolim)
Várzea Alegre

MÍNIMA ADJACÊNCIA

dê vez ao próximo da fila ou
facilite o troco

exame mais demorado
— luz direta
na cara —
contraria a reputação
a custo construída

riso aceno sotaque
tudo falsa
aproximação

se não corresponde
tegumento e
tez

CABEÇA A ÓLEO

atado a graúdos
adestramentos líricos
jamais neguei ao murro
sua drástica
preponderância

nunca pronto para
uma vontade nado
a grandes braçadas
contra o que se tem
seguro e certo

conto sempre na
iminência
imprestável à
atribuição

Fonte:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/ceara/ceara.html

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