AMORZANDO
Este longo viver já me fatiga,
mas há o amor; o amor é uma serpente
que às delicias da carne nos instiga,
fazendo-nos de Adão impenitente.
De ti quero o milagre que consiga,
pela magia do teu corpo ardente,
— das cinzas, que renasça a chama antiga,
— do amor, que eu não me canse e não me ausente.
Por este amor eu luto bravamente,
enquanto houver no frasco dos desejos
a ânsia derradeira dos meus beijos,
que um dia há de exaurir-se finalmente;
e este animal que existe em mim se afasta
restando apenas amizade casta.
****************************************
BREVE ENTRECHO
Eis-me aqui, triste e só, onde moramos.
Neste palco de eterno encantamento,
o amor que nos ligou por um momento
foi breve ato que então representamos.
Neste cenário, os pássaros nos ramos
vinham de longe em busca de alimento;
além, no rio, o gado ia sedento,
e nós, artistas, quanto nos amamos!
Tu foste a estrela, bela, sem igual,
e eu o galã, indômito, sem medo,
na trama de uma história tão banal.
Porém não foi feliz o autor do enredo;
sem ao menos ter sido original,
o desenlace veio muito cedo.
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O MILAGRE DE UMA IMAGEM
Sem possuí-la, o que de mim seria?
Vivia sem ninguém, desesperado;
a mim nada de bom acontecia,
enfim, eu era um pobre desgraçado.
Ela veio, coberta, e ainda fria,
mas, logo, diante dela, já sentado,
revelou-se-me a imagem que eu queria,
como um corpo de fêmea desejado.
Gozei-lhe as formas, tão sensuais e belas,
com brilho e nitidez de um claro dia.
Foram horas vividas de alegria.
Porém, como acontece a todas elas,
a conserto mandei num caminhão
a minha "comercial" televisão.
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TEMPO
Não te apresses, não vás assim voando,
pois, preso em tuas asas, vou contigo,
és um corcel alado sem comando,
e em teus arrancos loucos há perigo.
Sê calmo como antigamente, quando
em minha infância foste meu amigo;
é mister que progridas lento e brando
neste breve caminho que ora sigo,
onde és prazo da vida, mensurável
no espaço que me resta tão precário.
A Morte sempre chega em seu horário
e cumpre seu destino inexorável.
Detém-te, Tempo, escuta o que te peço,
minha viagem não terá regresso!
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UMA MENINA E UM RAPAZ
Sempre via passando pela rua
a menina de encantos celestiais;
seu sorriso a beleza lhe acentua,
sua graça ela exibe até demais.
Uma saudade logo se insinua
na lembrança sentida de um rapaz:
sua ausência mais triste fez a rua,
como tristes meus olhos ela faz.
Nos meus braços, à luz sutil da lua,
- sonho impossível — eu quisera tê-la,
mas Deus lhe deu para morada sua
o céu, onde é talvez errante estrela,
que vejo nos meus sonhos, clara e nua,
eu que daria um mundo para vê-la.
Fonte:
Aparício Fernandes (org.). Anuário de Poetas do Brasil – Volume 4. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1979.
Este longo viver já me fatiga,
mas há o amor; o amor é uma serpente
que às delicias da carne nos instiga,
fazendo-nos de Adão impenitente.
De ti quero o milagre que consiga,
pela magia do teu corpo ardente,
— das cinzas, que renasça a chama antiga,
— do amor, que eu não me canse e não me ausente.
Por este amor eu luto bravamente,
enquanto houver no frasco dos desejos
a ânsia derradeira dos meus beijos,
que um dia há de exaurir-se finalmente;
e este animal que existe em mim se afasta
restando apenas amizade casta.
BREVE ENTRECHO
Eis-me aqui, triste e só, onde moramos.
Neste palco de eterno encantamento,
o amor que nos ligou por um momento
foi breve ato que então representamos.
Neste cenário, os pássaros nos ramos
vinham de longe em busca de alimento;
além, no rio, o gado ia sedento,
e nós, artistas, quanto nos amamos!
Tu foste a estrela, bela, sem igual,
e eu o galã, indômito, sem medo,
na trama de uma história tão banal.
Porém não foi feliz o autor do enredo;
sem ao menos ter sido original,
o desenlace veio muito cedo.
O MILAGRE DE UMA IMAGEM
Sem possuí-la, o que de mim seria?
Vivia sem ninguém, desesperado;
a mim nada de bom acontecia,
enfim, eu era um pobre desgraçado.
Ela veio, coberta, e ainda fria,
mas, logo, diante dela, já sentado,
revelou-se-me a imagem que eu queria,
como um corpo de fêmea desejado.
Gozei-lhe as formas, tão sensuais e belas,
com brilho e nitidez de um claro dia.
Foram horas vividas de alegria.
Porém, como acontece a todas elas,
a conserto mandei num caminhão
a minha "comercial" televisão.
TEMPO
Não te apresses, não vás assim voando,
pois, preso em tuas asas, vou contigo,
és um corcel alado sem comando,
e em teus arrancos loucos há perigo.
Sê calmo como antigamente, quando
em minha infância foste meu amigo;
é mister que progridas lento e brando
neste breve caminho que ora sigo,
onde és prazo da vida, mensurável
no espaço que me resta tão precário.
A Morte sempre chega em seu horário
e cumpre seu destino inexorável.
Detém-te, Tempo, escuta o que te peço,
minha viagem não terá regresso!
UMA MENINA E UM RAPAZ
Sempre via passando pela rua
a menina de encantos celestiais;
seu sorriso a beleza lhe acentua,
sua graça ela exibe até demais.
Uma saudade logo se insinua
na lembrança sentida de um rapaz:
sua ausência mais triste fez a rua,
como tristes meus olhos ela faz.
Nos meus braços, à luz sutil da lua,
- sonho impossível — eu quisera tê-la,
mas Deus lhe deu para morada sua
o céu, onde é talvez errante estrela,
que vejo nos meus sonhos, clara e nua,
eu que daria um mundo para vê-la.
Fonte:
Aparício Fernandes (org.). Anuário de Poetas do Brasil – Volume 4. Rio de Janeiro: Folha Carioca, 1979.
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