quarta-feira, 30 de setembro de 2020

Thalma Tavares (Poemas Avulsos) 4


BUSCANDO OS CÉUS

Minha alma anseia pelos versos puros
que convidam à paz e à oração,
que deitam sol nos paramos escuros
mudando em luz a própria escuridão...

Versos que sobem dos prosaicos muros
para colher estrelas na amplidão,
que comparados aos meus versos duros
são vozes de anjo em celestial canção.

Minha alma busca o Céu, mas presa à Terra,
faz rimas dos contrastes que ela encerra
e olhar para o infinito já não ousa.

Mas sempre que a envolve a nostalgia,
ela percorre os céus na companhia
dos versos siderais de Cruz e Souza...
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CONSTATAÇÃO

Cobra-me o tempo os juros do descaso
ao qual eu submeti minha estrutura.
Não cogitei da idade nem do prazo
que a resistência óssea perdura.

Pulei, dancei, corri sem fazer caso
de que não sou de ferro, mas criatura
sensível ao desgaste da ossatura
que não deve deixar-se ao mero acaso.

Meu espírito é moço e ainda me pede
tarefas que hoje o corpo mal concede,
e que nem sempre são realizadas.

Ainda tenho, bem sei talento e garra,
mas esse meu orgulho agora esbarra
na velhice das pernas entrevadas.
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ROGATIVA

Senhor, que olhas os antros, as vielas,
os homens sem trabalho, o lar sem pão,
que a minha fé não morra como as velas
que ao mais leve soprar se apagarão.

Ante a ganância atroz, cujas mazelas
põe-nos em sobressalto o coração,
eu venho Te pedir pelas favelas
que ora clamam por paz e proteção.

O pobre, da miséria anda cansado
e pensa, em sofrimentos mergulhado,
que Tu, ó meu Senhor, lhe deste as costas.

E é tanta, neste mundo, a violência
que não querendo crer na Tua ausência
eu ando pela vida de mãos postas.
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SINE CERA

Conseguiste, afinal, a liberdade.
Serás agora um pássaro liberto.
Já podes esbanjar sinceridade
e povoar de sonhos teu deserto.

Sem mascarar da vida a realidade,
sem o pudor de palmilhar o incerto,
sem dar satisfações à sociedade
podes andar sem véus, a céu aberto.

Dirás hoje o que pensas, tão somente,
e assombrarás a tua pobre gente,
cativa da ilusão, do conformismo.

És livre, meu irmão, mas te prepara
que a escrava multidão, de mente avara,
jamais perdoará teu heroísmo.

Fonte:
Thalma Tavares. Alguns sonetos e sonetilhos. São Simão/SP, 2014.
Apostila enviada pelo autor.

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