Ricardo conheceu Rosita na janela: ela morava no quinto andar, ele no sexto, bem em frente. Toda vez que ele chegava, ela baixava a persiana. Depois de algum tempo, não baixou mais, começou até a sorrir e a cumprimentá-lo. Ricardo fazia sinalzinho com a mão, ela respondia, conversavam por mímica durante horas. À noite, trancava a janela e sumia. Nunca havia uma luz acesa, Ricardo vivia intrigado, não sabia se ela era casada ou solteira, ou viúva ou lá o que fosse. No verão ela ficava de short o dia inteiro e muitas vezes chegou a mudar de roupa e só depois fechava a janela, fingindo ignorar que estava aberta.
Ricardo não resistia: seus olhos eram hóspedes permanentes da vizinha. Fez tudo pra transferir o namoro da janela para a porta, mas não conseguiu. Rosita era muito esquiva, muito enigmática, embora soubesse que ele costumava vê-la completamente nua.
Uma noite, Ricardo decidiu bater à porta, tomou-se de coragem e foi até lá.
Quando tocou a campainha, sentiu que o olho mágico estava se mexendo. Quis desistir, mas a porta se entreabriu e ouviu uma voz de homem:
— Quem é?
Ricardo ficou imobilizado. A porta foi se abrindo, devagarinho, e surgiu o rosto de Rosita. Tomou fôlego.
— Sou eu. Tem alguém aí?
Ela falou:
— Não, estou sozinha.
Ricardo insistiu, meio incrédulo:
— Ouvi uma voz de homem.
Ela esclareceu:
— Sou eu mesma, minha voz é assim.
Ricardo saiu correndo, desceu as escadas de quatro em quatro lances, passou três meses sem aparecer na janela.
Fonte:
Leon Eliachar. A mulher em flagrante. (desenhos e paginação de Fortuna). Publicado em 1965.
Leon Eliachar. A mulher em flagrante. (desenhos e paginação de Fortuna). Publicado em 1965.
Nenhum comentário:
Postar um comentário