tão longe eu lhe disse até logo
um pouco de tudo passou-se outra vez
e foi uma vez toda feita de jogos
aquela outra vez que não soube ser vez
pois voltou e voltou e voltou
sem saber que de duas uma
nunca são três
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carta ao acaso
a carta do baralho
grande gilete
corta sem barulho
o olho do valete
o rei a fio de espada
a água e a farinha
uma só passada
a espada na rainha
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soubesse que era assim
não tinha nascido
e nunca teria sabido
ninguém nasce sabendo
até que eu sou meio esquecido
mas disso eu sempre me lembro
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meus amigos
quando me dão a mão
sempre deixam
outra coisa
Presença
olhar
lembrança calor
meus amigos
quando me dão
deixam na minha
a sua mão
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dia de reis passou
o ano avança a maio
os reis passaram
flor
maria
trabalho
o povo ficou
mãe
maioria
os povos ficaram
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nascemos em poemas diversos
destino quis que a gente se achasse
na mesma estrofe e na mesma classe
no mesmo verso e na mesma frase
rima à primeira vista nos vimos
trocamos nossos sinônimos
olhares não mais anônimos
nesta altura da leitura
nas mesmas pistas
mistas a minha a tua a nossa linha
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acordei bemol
tudo estava sustenido
sol fazia
só não fazia sentido
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Amor, então,
também, acaba?
Não, que eu saiba.
O que eu sei
é que se transforma
numa matéria-prima
que a vida se encarrega
de transformar em raiva.
Ou em rima.
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parem
eu confesso
sou poeta
cada manhã que nasce
me nasce
uma rosa na face
parem
eu confesso
sou poeta
só meu amor é meu deus
eu sou o seu profeta
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o barro
toma a forma
que você quiser
você nem sabe
estar fazendo apenas
o que o barro quer
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o poema
na página
uma cortina
na janela
uma paisagem
assassina
Fonte:
Paulo Leminski. caprichos & relaxos (saques, piques, toques & baques). Publicado em 1983.
Paulo Leminski. caprichos & relaxos (saques, piques, toques & baques). Publicado em 1983.
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