E as “conversas com ti António “uma “figura da nossa charneca” continuam. Mas diga-se antes de mais, e que segundo ele nos diz, aos 5 anos(1922) começou a ver como iam as coisas lá pela charneca, aos 14 já lavrava, sendo que aos 16(1933)tomou conta da sua própria lavoura.
Eu já tinha nos meus planos,
que havia coisas boas
no dia de Todos os Santos,
que era o esperado das broas;
Mas era só no primeiro dia,
que não podia ser mais,
tínhamos de semear o trigo,
lavrado por animais;
Dos animais que lavravam
isto antes e depois,
e os mais apropriados
eram as vacas e os bois;
Isto já se fazia dantes
e não é uma brincadeira
aproveitar bem o mês dos Santos
pois era o melhor para as sementeiras;
Começava-se à segunda-feira
isto logo de madrugada
eram seis dias por semana,
por vezes até de empreitada;
E trabalhar de empreitada,
muita gente o fazia,
começar de madrugada
para aproveitar bem o dia;
Era uma grande alegria
a vida dantes,
muita coisa se fazia
no mês dos Santos;
Mas dentro do mês dos Santos
nem só se semeava
já se fazia dantes
azeitona se apanhava;
A azeitona se apanhava
com jeito e muita alegria,
todos os baguinhos se colhiam
ao longo de todo o dia;
Varejava-se toda pro chão
para a mulher apanhar
bago por bago
com as suas próprias mãos;
Era sempre de empreitada
ao longo de todo o dia
apanhar a bago por bago,
pois tinha que encher o saco
era a empreitada do dia;
Era a vida que corria
setenta anos atrás,
era a vida que se fazia
quando eu era rapaz;
A vida não volta pra traz,
nem nada disso pode ser,
gostava dela quando era rapaz
que não agora que estou a envelhecer;
Pouco mais posso viver,
escutem bem o que lhe digo;
Já muita coisa deixei de fazer,
até deixei de fazer trigo;
Já deixei de semear trigo,
que muito gostava de fazer,
era o pão de cada dia
pra todos terem de comer;
E o pão pra todos comerem,
é o que tem mais valor,
mas tem de ser semeado
p'lo tal dito lavrador;
E até eu o fazia
com carinho e amor,
lavrando todo o dia,
com orgulho de lavrador;
Lavrador era quem lavrava,
que sempre assim foi,
muito trigo se lavrava
com a vaca e com o boi.
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* Ti António Carqueja foi uma figura típica da nossa terra. Exímio bailador, segundo ele próprio “arranhava” umas coisitas no harmónio, na concertina e no realejo. Ensinou alguns jovens a tocar concertina. Tocava ferrinhos no Rancho, e pertencia aos grupos de Foles e de Realejos. No princípio de cada mês (logo doze vezes) ia a casa dele para me falar do mês em referência, mas a condição – ele que não era poeta – mas tinha que ser em verso.
Fonte:
Boletim em linha. Montargil Acção Cultural. N. 90. novembro de 2021.
Colaboração de Lino Mendes.
Boletim em linha. Montargil Acção Cultural. N. 90. novembro de 2021.
Colaboração de Lino Mendes.
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