sexta-feira, 25 de março de 2022

Contos e Lendas do Paraná - 9 (Campo Mourão – Paranaguá)


CAMPO MOURÃO
A lenda do profeta


A história que vou lhes contar aconteceu há muito tempo atrás. Guarapuava ainda era um lugarejo, cercado por fazendas em toda a extensão geográfica que vai do rio Piquiri ao Ivaí e Corumbataí. Conta-se que por volta de 1850 o tráfico de escravos negros, embora proibido, era praticado vergonhosamente. Com a emancipação política do Paraná, em 1853, iniciou-se a marcha para o progresso do Estado. Entre os anos de 1856 a 1858, o toldo dos índios Kaingang, no vale do Piquiri, foi cruelmente atacado e destruído. A partir dessa data, tropeiros paranaenses começaram as suas passagens pelos campos de Guarapuava e, bem mais tarde, pelo picadão que unia Guarapuava ao Mato Grosso do Sul, sendo Campo Mourão o local de repouso para os peões e as tropas.

Contam os moradores da região de Guarapuava, Pitanga e Campo Mourão, que naquela época prevalecia a lei do mais forte; havia muitas chacinas e emboscadas, pois a ganância era muito grande. Pela região sempre aparecia um senhor idoso, longas barbas brancas, sandálias de couro nos pés, um lenço na cabeça, roupas maltrapilhas, um autêntico andarilho. Homem de poucas palavras, porém de sábias ações, era apenas conhecido como João Maria de Agostinho, “o profeta”. Chamavam-no de São João Maria, o santo profeta que curava pestes, doenças e até domesticava animais ferozes e cobras venenosas.

O incrível é que ele sempre aparecia na hora e no lugar onde estavam precisando. Nada se sabia dele. Só que realizava milagres. Dizem que passou por um olho d’água do Jordão, em Guarapuava, e que até hoje aquela água tem poder de cura para os que têm fé.

Todo mundo queria encontrar e falar com o tal profeta. A fonte virou um verdadeiro local de romeiros que ficavam de molho nas águas e no próprio barro e afirmavam que eram curados. Por onde o monge passava, falava de Jesus e plantava uma cruz. Ensinava sobre o amor, a fé e a caridade para com o próximo. Também ensinava a utilizar ervas caseiras e dizia que até a água pura curava, se a pessoa tivesse fé em Deus, não nele. Sempre ressaltava isso.

Também passou por Campo Mourão e dizem que aqui havia muitas cobras venenosas. Quando aparecia alguma cobra na propriedade era só pensar no profeta e ele aparecia. Ele ia até o local e conversava com a cobra, ordenando que ela e toda a sua prole sumissem dali. Em seguida a essa ordem, fazia uma oração e nunca mais aparecia cobras naquele local.

Em uma ocasião apareceu uma velha beata que começou a tirar vantagens em nome do profeta. Fazia bolinhas de barro e as vendia como pílulas milagrosas de São João Maria, dizendo que curavam todos os males. Era só engolir com um pouco de água e se livrar dos vermes, febres e outras doenças. Um dia, essa senhora adoeceu gravemente, porém nem médicos, nem as pílulas milagrosas conseguiam curá-la. No leito de morte, gritava:

– Perdoe-me profeta, a minha ganância foi maior que minha fé.

Ao anoitecer, ela faleceu. Dizem que o profeta passou a noite sentado num tosco banquinho, próximo à tarimba onde a morta era velada. Cabeça baixa, pernas cruzadas, sem pronunciar uma só palavra.

Quando o cortejo saiu para o sepultamento, ele gritou:

– O amor, a fé e a caridade não têm preço. Jesus Cristo foi exemplo disso. Deu sua vida por nós. Vão em paz. Quando precisarem, basta invocá-lo, que ele está sempre perto de vocês.

A partir daquele dia, nunca mais ninguém viu, ou ouviu falar sobre o profeta, que era sempre o mesmo, com as mesmas roupas e sandálias.
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PARANAGUÁ
A lenda das rosas loucas

Foi no ano de 1680. A Costeira do Rossío (Rocio), da Vila de Nossa Senhora do Rosário de Paranaguá, era habitada por humildes pescadores, que viviam do que o mar lhes dava, nas noites calmas daqueles arrebaldes. Eles vendiam uma parte da pesca, o resto ficava para o sustento da família.

Corria o mês de novembro. Uma noite, na calmaria do verão, estavam eles nas suas canoas ao largo da baía, com suas redes nas águas, à espera de uma boa pescaria. Por um desses acasos, olhando o céu recamado de estrelas, um dos pescadores viu que uma das estrelas despejava um facho luminoso até uma grande moita de rosas, nascidas na barranca da baía. Em minutos desaparecia e reaparecia; isso por várias vezes. Ele chamou, então, a atenção dos companheiros, que presenciaram o fato.

Quando voltaram da faina noturna, acharam, uns, de bom alvitre o aviso; outros, porém, mais medrosos, alegaram que era o prenúncio de grandes males. Todos passaram a comentar o ocorrido nos seus lares. O fenômeno continuou por várias noites, até que os praieiros tomaram uma decisão: decepar a moita das “rosas loucas”.

Num domingo, pela manhã, com facão, enxada e foice, começaram a devastação. Mas, quando estavam na metade do trabalho se depararam com uma pequenina imagem da virgem mãe de Jesus, bem no lugar onde todas as noites descia o facho luminoso. O alvoroço foi grande entre aquela gente inculta.

Um preto velho, por nome Pai Berê, que ali também morava, pediu para fazer uma igrejinha de pau-a-pique, coberta de palha, a fim de colocar a imagem num altar e ficar como guarda do achado. Todos os pescadores concordaram. No mesmo lugar, Pai Berê fez um ranchinho em forma de ermida e todos os domingos os moradores rezavam o terço, pela manhã e à tarde.

A notícia espalhou-se logo pela vila e a curiosidade do povo não se fez esperar; a princípio, para ver; depois, para crer. Os anos foram passando e a devoção crescendo.

Os pedidos e os milagres também foram surgindo, até chegar aos nossos dias; tornando-se, por fim, uma tradição.

Fonte:
Renato Augusto Carneiro Jr (coordenador). Lendas e Contos Populares do Paraná. Curitiba : Secretaria de Estado da Cultura , 2005.

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