A reunião de amigas se formara a pretexto de comemorar a chegada da mais nova à idade sexy. As outras quatro já se haviam tornado sexagenárias e comentavam, galhardamente, as proezas cometidas depois de ultrapassada a barreira dos sessenta.
— Nesta idade, eu me sinto livre como um passarinho e não preciso ficar constrangida em falar o que penso e rir bastante das piadas que ouço quando participo das excursões da terceira idade. — comentou Marina.
Vilma, que sempre achara a amiga "escrachada" demais para o seu gosto, observou que nunca tivera que se conter para não rir das bobagens que ouvia, pois, realmente, não achava graça nos programas apimentados da televisão e não se interessava pelo teatro, quando eram apresentadas comédias que ela considerava vulgares. Da mesma forma, evitava as pessoas que falavam palavrões e que pretendiam se tornar muito íntimas.
Julina, sempre conciliadora, admitiu que não se incomodava quando, entre amigos mais liberais, a conversa descambava para certas inconveniências, mas não se sentia em condições de "dar corda", preferindo rir discretamente e não estender o assunto.
Daí, passaram a outro tópico e as mudanças de comportamento das gerações, que se seguiram à geração delas, foram abordadas. Em muitos casos, criticaram as atitudes dos jovens; em outros, elogiaram a postura mais liberal dos pais de adolescentes nos dias de hoje e, no fundo, demonstraram uma ponta de inveja por não terem vivido em tempos mais permissivos. Reconheciam que sentimentos de culpa impediam-nas de extravasarem seus desejos e ansiedades.
A reunião tornou-se, a partir de então, uma verdadeira Noite da Saudade. Foram lembrados os primeiros namorados, os primeiros bailes, os primeiros beijos. Os encontros escondidos, os beijos furtivos, os abraços sufocantes e rápidos, pois sempre havia alguém por perto.
Zuíeika lembrou do dia em que, ao sair de casa, despistadamente, para encontrar o namoradinho na esquina, viu a irmã menor ao seu encalço e a convenceu a voltar. Ela teria a incumbência de distrair a mãe simulando uma forte dor na barriga. Assim, a mãe não perceberia a ausência de Zuíeika. A irmã sentiu-se importante pela tarefa que lhe foi atribuída, mas cobrou uma taxa que foi paga várias vezes, até que Zuleika chegou à conclusão de que o namorado não valia o rombo na mesada, tantas eram as balas e bombons que tinha de gastar para subornar a irmã.
— Ih, as irmãs menores sempre davam muita despesa - lembrou Celina. – Também comprei muita bala para que as minhas irmãs não contassem que, ao apagar das luzes no cinema, havia sempre algum namorado que se sentava ao meu lado.
— Vocês se lembram quando começamos a frequentar bailes depois da formatura do ginásio? — perguntou Marina. — Nossos pais ficavam sentados às mesas, com os olhos fixos, seguindo nossos passos. Papai até se levantava para não me perder de vista quando, espertamente, o meu par me conduzia para o miolo, Eu adorava, mas levei o maior susto quando um, mais avançadinho, me sapecou um beijo no rosto. Até parei de dançar com ele quando chegamos à extremidade da pista, de tanto medo que fiquei de meus pais terem visto tanta ousadia. E logo eu, que sempre gostei de um bom beijo tipo saca-rolhas! — contou às gargalhadas.
Vilma, a mais recatada, recordou o seu momento especial.
— Susto levei eu, numa noite em que meus pais saíram para jantar fora. Comentei com o garoto que eu estava namorando. Ele era do científico, mais sabido, e logo teve a ideia de ir lá para casa. Pouco depois da chegada dele, Mamãe entra na sala, voltando antes do esperado. Papai havia esquecido a carteira e não chegaram a entrar no restaurante. A minha sorte foi que o meu pai ficou esperando na garagem e só a minha mãe voltou ao apartamento. Mesmo assim, as consequências não foram nada agradáveis, pois a Mamãe armou um cerco de vigilância intensivo e ficou horrorizada de pensar que um rapaz estivera sozinho comigo no apartamento. É claro que a sua maior preocupação foi de que o fato fosse comentado pelos porteiros ou tivesse sido visto por algum vizinho o que me tornaria "falada", o termo usado naqueles tempos.
Todas riram, mas não deixaram de se surpreender, pois, logo a Vilma, que era considerada o exemplo das certinhas, fora a mais audaciosa e cometera o pecado mais grave na faixa dos seus quinze anos.
Brincando, insistiram que ela contasse outra das suas proezas. Entretanto, a recatada senhora não poderia demorar na reunião para não provocar desconfianças no ciumento marido.
Despedindo-se, as velhas amigas comprometeram-se a marcar um outro encontro, no qual, sem falta, haveriam de fazer o Jogo da Verdade.
— Nesta idade, eu me sinto livre como um passarinho e não preciso ficar constrangida em falar o que penso e rir bastante das piadas que ouço quando participo das excursões da terceira idade. — comentou Marina.
Vilma, que sempre achara a amiga "escrachada" demais para o seu gosto, observou que nunca tivera que se conter para não rir das bobagens que ouvia, pois, realmente, não achava graça nos programas apimentados da televisão e não se interessava pelo teatro, quando eram apresentadas comédias que ela considerava vulgares. Da mesma forma, evitava as pessoas que falavam palavrões e que pretendiam se tornar muito íntimas.
Julina, sempre conciliadora, admitiu que não se incomodava quando, entre amigos mais liberais, a conversa descambava para certas inconveniências, mas não se sentia em condições de "dar corda", preferindo rir discretamente e não estender o assunto.
Daí, passaram a outro tópico e as mudanças de comportamento das gerações, que se seguiram à geração delas, foram abordadas. Em muitos casos, criticaram as atitudes dos jovens; em outros, elogiaram a postura mais liberal dos pais de adolescentes nos dias de hoje e, no fundo, demonstraram uma ponta de inveja por não terem vivido em tempos mais permissivos. Reconheciam que sentimentos de culpa impediam-nas de extravasarem seus desejos e ansiedades.
A reunião tornou-se, a partir de então, uma verdadeira Noite da Saudade. Foram lembrados os primeiros namorados, os primeiros bailes, os primeiros beijos. Os encontros escondidos, os beijos furtivos, os abraços sufocantes e rápidos, pois sempre havia alguém por perto.
Zuíeika lembrou do dia em que, ao sair de casa, despistadamente, para encontrar o namoradinho na esquina, viu a irmã menor ao seu encalço e a convenceu a voltar. Ela teria a incumbência de distrair a mãe simulando uma forte dor na barriga. Assim, a mãe não perceberia a ausência de Zuíeika. A irmã sentiu-se importante pela tarefa que lhe foi atribuída, mas cobrou uma taxa que foi paga várias vezes, até que Zuleika chegou à conclusão de que o namorado não valia o rombo na mesada, tantas eram as balas e bombons que tinha de gastar para subornar a irmã.
— Ih, as irmãs menores sempre davam muita despesa - lembrou Celina. – Também comprei muita bala para que as minhas irmãs não contassem que, ao apagar das luzes no cinema, havia sempre algum namorado que se sentava ao meu lado.
— Vocês se lembram quando começamos a frequentar bailes depois da formatura do ginásio? — perguntou Marina. — Nossos pais ficavam sentados às mesas, com os olhos fixos, seguindo nossos passos. Papai até se levantava para não me perder de vista quando, espertamente, o meu par me conduzia para o miolo, Eu adorava, mas levei o maior susto quando um, mais avançadinho, me sapecou um beijo no rosto. Até parei de dançar com ele quando chegamos à extremidade da pista, de tanto medo que fiquei de meus pais terem visto tanta ousadia. E logo eu, que sempre gostei de um bom beijo tipo saca-rolhas! — contou às gargalhadas.
Vilma, a mais recatada, recordou o seu momento especial.
— Susto levei eu, numa noite em que meus pais saíram para jantar fora. Comentei com o garoto que eu estava namorando. Ele era do científico, mais sabido, e logo teve a ideia de ir lá para casa. Pouco depois da chegada dele, Mamãe entra na sala, voltando antes do esperado. Papai havia esquecido a carteira e não chegaram a entrar no restaurante. A minha sorte foi que o meu pai ficou esperando na garagem e só a minha mãe voltou ao apartamento. Mesmo assim, as consequências não foram nada agradáveis, pois a Mamãe armou um cerco de vigilância intensivo e ficou horrorizada de pensar que um rapaz estivera sozinho comigo no apartamento. É claro que a sua maior preocupação foi de que o fato fosse comentado pelos porteiros ou tivesse sido visto por algum vizinho o que me tornaria "falada", o termo usado naqueles tempos.
Todas riram, mas não deixaram de se surpreender, pois, logo a Vilma, que era considerada o exemplo das certinhas, fora a mais audaciosa e cometera o pecado mais grave na faixa dos seus quinze anos.
Brincando, insistiram que ela contasse outra das suas proezas. Entretanto, a recatada senhora não poderia demorar na reunião para não provocar desconfianças no ciumento marido.
Despedindo-se, as velhas amigas comprometeram-se a marcar um outro encontro, no qual, sem falta, haveriam de fazer o Jogo da Verdade.
Fonte:
Cecy Barbosa Campos. Recortes de Vida. Varginha/MG: Ed. Alba, 2009.
Livro enviado pela autora.
Cecy Barbosa Campos. Recortes de Vida. Varginha/MG: Ed. Alba, 2009.
Livro enviado pela autora.
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