sexta-feira, 18 de março de 2022

Hans Christian Andersen (A Borboleta)


Era uma vez uma borboleta macho que buscava uma noiva. Como vocês podem imaginar, ele queria a mais bonita das flores. Com olhos clínicos, ele analisou todos os canteiros e percebeu que as flores estavam sentadas bem quietas e comportadas em seus caules, como as mocinhas devem se sentar. Mas eram muitas, e ele percebeu que chegar a uma decisão seria uma tarefa muito demorada. A borboleta não gostava de coisas trabalhosas, então partiu dali para visitar as margaridas.

Os franceses chamam a margarida de Marguerite e dizem que ela é capaz de fazer adivinhações. Os enamorados puxam as pétalas e, a cada puxada, fazem uma pergunta: “Ela ou ele me ama? Muito? Só um pouco? Profundamente? Nem um tiquinho?” e assim por diante. Cada um faz as perguntas no próprio idioma.

A borboleta também foi até a Marguerite para fazer uma pergunta, mas não arrancou nenhuma pétala; em lugar disso, deu um beijo em cada uma, pois acreditava que se consegue muito mais com gentileza.

– Querida senhorita Marguerite, você é a mulher mais sábia de todas. Por favor, diga qual das flores devo escolher como esposa. Qual deve ser minha noiva? Quando eu souber, voarei direto até ela e farei o pedido.

Mas a Marguerite não respondeu. Ela havia se ofendido por ele chamá-la de mulher quando ela era só uma menina, e a diferença é grande. Ele perguntou pela segunda vez e depois uma terceira, mas ela permaneceu muda, sem oferecer nenhuma resposta. Então ele decidiu que não iria esperar mais, e saiu voando para começar de uma vez a fazer seus cortejos. Era o começo da primavera, quando as flores de açafrão e de galanto estavam no auge da florescência.

“São encantadoras”, a borboleta pensou, “mas um pouco rígidas e formais demais”.

Então, como rapazes jovens costumam fazer, ele foi procurar meninas mais velhas. Voou para as anêmonas, mas as achou muito amargas para seu gosto. A violeta era exageradamente sentimental; as flores de lima eram muito pequenas e, além disso, a família delas era imensa. A flor da macieira, embora parecesse uma rosa, podia desabrochar em um dia e cair no outro, com o primeiro vento que soprasse, e a borboleta achou que um casamento assim poderia durar muito pouco. A flor da pera era a que mais o agradava; era branca e vermelha, delicada e esguia, e pertencia àquele grupo de senhoritas que, além de serem bonitas, podem ser aproveitadas na cozinha. Estava prestes a fazer a proposta quando, perto dela, ele viu uma vagem com uma flor murcha dependurada.

– Quem é ela?

– É a minha irmã – a flor de pera respondeu.

– Ah, sério? Então, um dia você vai ficar como ela – a borboleta macho exclamou e fugiu voando, chocado.

Uma madressilva totalmente desabrochada pendia de uma cerca viva. Ah, mas havia tantas garotas como aquela, com rostos compridos e pálidos! Não, ele não gostava dela. Mas de qual ele gostava?

A primavera passou e o verão se aproximava do fim. Veio o outono, e a borboleta ainda não tinha feito sua escolha. As flores se exibiam agora em seus mais lindos trajes, mas era tudo em vão; elas não mais possuíam o ar fresco e perfumado da juventude. O coração pede perfume mesmo quando já não é jovem, e há bem pouco perfume a ser encontrado nas dálias e nos crisântemos secos. Assim, a borboleta se voltou para o canto onde estava plantada a menta. Esta planta, como vocês sabem, não tem flores, mas é toda doçura: exala fragrância da cabeça aos pés, com perfume floral em cada folhinha.

– Vou ficar com ela – a borboleta disse, e logo fez o pedido.

Mas a menta permaneceu muda e rígida enquanto o escutava, até que por fim respondeu:

– Posso lhe oferecer amizade se você quiser, nada mais que isso. Eu sou velha e você é velho, mas podemos nos dedicar um ao outro mesmo assim. Quanto a casar, contudo, não! Seria ridículo na nossa idade.

E foi assim que a borboleta macho acabou sem esposa nenhuma. Passou tempo demais escolhendo, o que é sempre uma má ideia, e se tornou o que chamamos de solteirão.

O outono chegava ao fim, e o tempo estava nublado e chuvoso. O vento soprava nas costas encurvadas dos salgueiros, curvando-os ainda mais. Não era o clima ideal para se voar por aí em roupas de verão, mas a borboleta não estava ao ar livre. Por uma feliz coincidência, ele tinha conseguido um abrigo. Era uma sala aquecida por um forno, quentinha  como um dia de verão. Ele poderia viver ali muito bem.

– Mas simplesmente existir não basta. – ele concluiu. – Preciso de liberdade, dos raios de sol e de uma florzinha como companheira.

Ele então saiu voando, mas se chocou contra o vidro da janela, onde foi notado pelas pessoas que estavam na sala. Elas o capturaram e guardaram em uma caixa de curiosidades. Não poderiam ter feito nada melhor por ele.

– Agora estou espetado como uma flor. – ele disse. – Certamente não é muito agradável. Estou amarrado aqui, imagino que seja parecido com ser casado.

E com esse pensamento ele se consolou um pouco.

– Parece um consolo bem fraco. – disse uma das plantas da sala, que vivia em um vaso.

“Ah”, pensou a borboleta, “não se pode confiar muito nessas plantas que vivem em vaso, elas tiveram contato demais com os seres humanos”.

Fonte:
Hans Christian Andersen. Publicado originalmente em 1860.

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