Amanhecia, mas ainda estava escuro. Nenhum vento. A calmaria era total na beira do mar naquela manhã de março. O sol, preguiçosamente, banhava seu rosto no horizonte sem ondas. E as ondas calmas vinham, em procissão, beijar meus pés semi-enterrados na areia molhada, como que querendo saudar o raro veranista naquela solidão de pós-verão. Foi então que avistei, ao lado de uma grande pedra, um verdadeiro colchão de espumas. O mar, durante a noite, por certo, deveria ter depositado carinhosamente aquela espuma na beira da praia, bem assim como a insônia, que me fizera sair a caminhar tão cedo, depositara uma grande quantidade de saudade tua no meu coração.
Com os pés, comecei a abrir sulcos na espuma. Sem querer querendo, terminei escrevendo o teu nome, deixando as letras marcadas na areia, cercada de espuma. A primeira estrela da manhã chegou mais perto para ler o meu poema-espuma. Seus raios cintilaram nas gotas brilhantes, tingindo de prata aquele nome que um sonho quase impossível havia gravado, bem forte, no meu coração.
Sentei na pedra molhada e tentei desenhar mentalmente, na neblina da manhã, o teu rosto que tanto me fascina. Uma gaivota passou voando, atravessando com suas asas brancas o teu sorriso imaginário. Uma leve brisa começou a soprar quando a saudade quis brincar de transformar em lágrimas o nó que eu trazia preso na garganta. Aos poucos, o vento foi ficando mais forte, fazendo a espuma voar e despedaçando as letras do teu nome. Os flocos de espuma subiram no ar e foram se chocar contra o meu rosto e com meu corpo semi-despido. Em poucos segundos, meus ombros e meus braços nus ficaram tomados por pedaços de espuma gelada. A gaivota voltou, piando alto, como que zombando dos soluços que brotavam de dentro de mim.
Chorei naquele exato momento, porque entendi a mensagem que a natureza estava me passando. Entendi que o sentimento que eu sinto por ti é do tamanho daquele mar que, calmo ou violento, não para nunca de se agitar, exatamente como o meu coração. Entendi também que o aquilo que sentias por mim era como a espuma que esvoaçava: algo frágil, inconstante e facilmente levado pelo vento da tua vontade para qualquer lado. Talvez por isso, tantas vezes, inventavas desvios para teus passos não cruzarem com os meus. Outras vezes, porém, parecendo querer brincar comigo, atiçavas perigosamente o fogo que ardia dentro de mim.
O sol até resolveu despontar mais rápido, quando sentiu as lágrimas deslizando pelo meu rosto. Carinhosamente, fez com que seus raios deslizassem até mim, secando com o seu calor as minha lágrimas salgadas. O mar, avançando rapidamente, destroçou o resto das espumas que ainda mantinham alguns pedaços das letras do teu nome. E, depois, voltou a beijar levemente os meus pés, completando aquele conforto que eu estava necessitando. Não sei por quanto tempo fiquei fazendo parte daquele belo quadro composto por Deus. Só sei que, aos poucos, fui me acalmando e fazendo aquela saudade doída voar ao lado daquela gaivota errante. Lentamente, segui caminhando pela beira do mar, mas sempre mantendo os olhos presos no horizonte, na esperança inútil de ver o teu vulto surgindo, como numa miragem, naquela faixa de areia tingida de dourado pela luz do sol…
Fonte: Recanto das Letras do autor
https://www.recantodasletras.com.br/cronicas/68473
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