segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Camila Vardarac (Radar Murnau)


Dois seres pálidos apagam suas sombras ao abandonarem as réstias de luz, seguem fracos e rastejantes como moribundos esperançosos na direção da escuridão plena, porque só no mais puro breu nasce a semente vital que alimenta os seus espíritos, semente que abre as cortinas da alma, fechadas durante a temporada do sol.

Dos habitantes diurnos só querem o sangue contaminado que corre pelos corpos debilitados, aliás, esses seres obscuros valorizam muito mais o sangue por não possuí-lo naturalmente, é preciso consegui-lo a partir dos homicídios (nem sempre premeditados), assaltos a hospitais ou contribuições dos suicidas, que estão cada vez mais raras visto que esses kamikazes de hoje só querem mesmo morrer sem dor, uma morte calada num cômodo de apartamento impenetrável.

Antigamente, corria nas veias um sangue mais limpo, regido ainda por algumas ordens naturais, sem tanta química corrosiva. Antigamente, sangue era néctar e quem quisesse morrer o fazia com honra e tiro e foice, às vezes corda e o desespero avisava aos seres da noite que o banquete estava servido, agora morre-se por pílulas, analgésicos e calmantes em excesso e nenhum alarme soa aos ouvidos dos sedentos noturnos... o fim também está próximo para eles, por mais que saiam das tocas lacradas assim que o sol se põe, na cansativa busca pela vida carregada de contagem regressiva.

O fim se aproxima e o dia é apenas o prelúdio.
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Camila Vardarac nasceu no Rio de Janeiro, em 1987.
Observadora por natureza, escritora por impulsão – pela necessidade (recorrente) de expressar-se em prosa e poesia.
Voyeur da realidade e de suas representações, encontrou no cinema um meio de materializar suas idéias no continuum do espaço-tempo, desconstruindo-se em impressões.

Fonte:
http://www.conexaomaringa.com/

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