domingo, 3 de fevereiro de 2013

Manuel Bandeira (Poética)


Estou farto do lirismo comedido
 Do lirismo bem comportado
 Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor

 Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo

Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
 Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
 Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
 Político
 Raquítico
 Sifilítico
 De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo.

De resto não é lirismo
 Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar
com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
 O lirismo dos bêbados
 O lirismo difícil e pungente dos bêbados
 O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber de lirismo que não é libertação.

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