sábado, 11 de janeiro de 2014

Nilto Maciel (Contistas do Ceará) Paulo Véras

Paulo Roberto da Trindade Véras (Parnaíba, Piauí, 1953 – Fortaleza, 1983), poeta, contista, novelista e romancista, cedo se mudou para Fortaleza, onde se formou em Letras pela Universidade Federal do Ceará. Exerceu o magistério. Membro do Grupo Siriará. Publicou o livro de contos Cabeça de Cuia (São Paulo: Ed. Moderna, 1979). Em parceria com Leila Mícolis, editou o livro de poesia Maus Antecedentes, em 1981. Também de poesia lançou O Centro da Pedra. Escreveu um livro de literatura-infantil e poemas. Publicou também a novela Ita. Participou da revista Escrita, nº. 6, de São Paulo, com o poema “Tranlucidez”, e de O Saco Cultural, nº. 5, do Ceará, com o conto “O circo do vidro ou a Imitação da Fantasia”. Em Queda de Braço: uma antologia do conto marginal saíram os contos “O aniversário” e “Os corações devem ser postos na lata de lixo”.

Na opinião de Ligia Morrone Averbuck, “os vagos limites entre o real e o fantástico, a razão e a loucura, a verdade e o faz-de-conta emergem das páginas de O Cabeça-de-Cuia” (...)

Seus contos são quase todos tecidos a partir do fio da memória, razão por que os personagens situam-se entre a infância e a adolescência.

Como está nos manuais, o conto é uma peça literária curta, de poucos personagens, de um só núcleo fático. É o caso dos contos de O Cabeça-de-Cuia. Todos curtos, quase sintéticos, quase à maneira de Dalton Trevisan. Períodos incisivos, sem rodeios, sem malabarismos de linguagem. Espécie de roteiro para elaboração de narrativas mais extensas. Ao lado disso, um linguajar bem nordestino, tal como em Graciliano Ramos ou Juarez Barroso, sem o folclorismo da literatura regionalista, apesar dos “num” em vez de “não”, dos “tá” em vez de “está”. O povo rude fala assim. Mas também não diz, por exemplo: “duas bilas de vidro”. Diz: “duas bila de vrido”. Isto, que Graciliano não fazia, não pode desmerecer a literatura de Paulo Véras. Não chega a ser um grande pecado.

Os vinte e seis contos de O Cabeça-de-Cuia carregam esta mesma maneira de escrever, apesar de não haver homogeneidade temática. Uns são mais voltados para o interior das personagens, outros para o binômio homem-ambiente. E são estes últimos, quase todos circunscritos ao espaço rural, os que apresentam melhor feição. Gravitam em torno de personagens situados entre a infância e a adolescência. Neles o contista melhor se revela. Certamente Paulo é dono de prodigiosa memória, pois, movimentando personagens antigos e complexos, como as crianças no mundo rural, pinta quadros tão coloridos que é de se imaginar ter ele escrito os contos quando ainda criança. Não menos coloridas e vivas são as personagens.

Porém, um senão deve ser registrado – o conto “O Equívoco”, de tão comum, tão falto de criatividade, deveria ter sido excluído do livro. Apesar disso, Paulo Véras se situa ao lado dos bons narradores das pequeninas criaturas do interior nordestino.

Não fosse o conto “O Equívoco” (título excelente para um trocadilho), O Cabeça-de-Cuia poderia ser incluído no rol dos bons livros de contos surgidos no período histórico aqui estudado. E é justamente o único em que o contista tenta mostrar-se engajado. É o caso de se dizer: quem nasceu para Cornélio Pena nunca chega a Lima Barreto.

Fonte:
MACIEL, Nilto. Contistas do Ceará: D’A Quinzena ao Caos Portátil. Fortaleza/CE: Imprece, 2008.

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