“Não Será Sempre Assim”
Não será sempre assim... Quando não for;
Quando teus lábios forem de outro; quando
No rosto de outro o teu suspiro brando
Soprar; quando em silêncio, ou no maior
Delírio de palavras desvairando,
Ao teu peito o estreitares com fervor;
Quando, um dia, em frieza e desamor
Tua afeição por mim se for trocando:
Se tal acontecer; fala-me. Irei
Procurá-lo, dizer-lhe num sorriso:
"Goza a ventura de que já gozei:"
Depois, desviando os olhos, de improviso,
Longe, ah tão longe, um pássaro ouvirei
Cantar no meu perdido paraíso.
(Tradução de Manuel Bandeira)
“Os lábios que meus lábios beijaram ”
Os lábios que meus lábios beijaram, onde e quando,
eu esqueci, e os braços que se estenderam
sob minha cabeça até o amanhecer... Mas a chuva
se povoa de espectros esta noite; eles batem à janela
e espiam pelos vidros atrás de uma resposta.
Uma dor silenciosa em minha alma se agita,
rapazes esquecidos que não voltarão mais
a procurar-me entre lágrimas à noite.
Assim também no inverno a árvore solitária
ignora quais os pássaros que se foram um a um
e, no entanto, sente mudos seus galhos, mais que antes;
não sei contar os amores que se foram um a um,
sei apenas que o verão cantou em mim
um curto instante, e já não canta mais...
(Tradução livre de Sérgio Milliet)
“Num Certo Lugar Da Alma”
Num certo lugar da alma, entre muros de olvido
em terra estéril, seca, enterram-se os amores
que nasceram sem vida; em chão sempre querido
de onde, sonho após sonho, a vida se abre em flores;
os que intentavam ter seu ninho, construído
quando os minutos maus, terríveis, caçadores
atingiram-lhes a asa... e os que apenas têm sido
piedoso lenitivo a aplacar nossas dores!
A tais sepulcros, sei, devemos o tributo
que a nossa alma nos cobra o seu denso mistério...
Por mortos tais, porém, eu nunca ponho luto
e ao entrar em mim mesma, - esse lugar esquivo...
Que numa tumba está, desse meu cemitério
um grande amor que tive e que enterraram vivo!
(Tradução de Luis Antonio Pimentel)
Coisas de Pássaros
Quase a romper-se parecia o fino
tecido, ao voo palpitante e belo
dos teus seios que, ansiavam num anhelo,
se transformar num manancial divino
de leite e vida, amor, ternura e mel.
Oh, lindos seios, túmidos arminhos,
que dás aromas de fragrantes vinhos!
-redondezas de pombos pelo céu!
Amo-te as formas e o perfume; canto
perfume e forma do teu duplo encanto.
Oh, nobre encanto que a atrair, deleitas,
doce mistério da estação mais pura
bendita fonte de vital doçura
frutos que prenunciam mil colheitas!
(Tradução de J. G. de Araujo Jorge)
Fonte:
J G de Araujo Jorge. Os Mais Belos Sonetos Que O Amor Inspirou.
vol. III (Poesia Universal - Européia e Americana), 1966.
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