terça-feira, 30 de março de 2021

Alvitres do Prof. Renato Alves – 3

20.
O rio vem correndo tranquilamente... De repente, acelera, agita-se, e nos oferece o imponente espetáculo visual da queda d’água. Logo adiante, retoma a calma e continua seu curso...

Vejam como a sensibilidade do poeta nos conta isso através de uma linda trova!

Vestem-se as águas de prata,
saltam no espaço vazio.
Findo o show da catarata,
sereno refaz-se o rio...
( A. A. de Assis)


21.
No poema “A um poeta”, Olavo Bilac retrata o trabalho exaustivo que é escrever.

Ressalta, porém, que, pronta a obra, este trabalho não deve ser percebido pelo leitor (“...que na forma se disfarce o emprego do esforço...”). A mesma ideia parece estar presente na trova de Adelmar: “tão fácil, depois de feita, / tão difícil de fazer...”.

Certamente é também a este esforço que se refere a expressão “dura prova” na trova de Jotagê.

Ao ler uma bela trova
depois que pronta ficou,
quem calcula a dura prova
por que o poeta passou?
(J. G. de Araújo Jorge)


22.
Diz-se que “o Perdão traz mais bem-estar espiritual a quem perdoa do que a quem é perdoado”...

O perdão ilumina e fortalece o coração do perdoador, capacitando-o a continuar perdoando e, portanto, aprimorando-se espiritualmente, numa espécie de círculo virtuoso. Veja como o trovador conseguiu traduzir com simplicidade esta ideia, com base nos pares: perdão/luz, ilumina/eleva, eleva/perdoa.

O perdão é luz na treva
do coração da pessoa.
Quem se ilumina se eleva
e quem se eleva, perdoa!
(Alfredo de Castro)


23.
Na trova humorística é mais que conhecida a preferência pela temática da “sogra”, que sofre avassaladora e sistemática gozação. No entanto, nesta primorosa trova de Sérgio Ferreira da Silva, a sogra levou a melhor...

A minha sogra me deu
um troféu e uma medalha...
e, no diploma, escreveu:
“VENCEDOR – TEMA: CANALHA”
(Sérgio Ferreira da Silva)


24.
Às vezes, a repetição (reiteração) pode valorizar muito uma trova. Veja como o uso deste recurso foi fundamental para a ideia central e o efeito humorístico das trovas abaixo:

Ao por-lhe a esmola no prato
pergunta ao surdo, baixinho:
– És mesmo surdo de fato?
E ele: – ”Surdinho, surdinho!”
(Vasques Filho)

Nunca vi almas! – diz rindo.
E o cara na sua frente,
foi sumindo, foi sumindo,
transparente, transparente...
(José Maria M. de Araújo)


25.
Na mesma linha camoniana do “fogo que arde e não se vê / ferida que dói e não se sente”, eis, na trova ao lado, uma bela aplicação da “antítese”, figura de linguagem tão adequada para definir a natureza
contraditória do amor.

O amor é sorriso... ou pranto.
O amor é nuvem... ou sol.
O amor é lágrima... ou canto.
O amor é treva... ou farol.
(Maria Thereza Cavalheiro)


26.
Além do escorreito português dos verbos em 2ª pessoa do plural (rireis, saberdes, pousais), esta trova apresenta um interessante emprego da palavra “verde” com carga semântica dupla: verde = cor e verde = jovem, em oposição aos maduros olhos do poeta.

Rireis talvez ao saberdes
como eu me sinto em apuros
se pousais os olhos verdes
nos meus olhos já maduros!
(José Fabiano)


27.
Na literatura, o efêmero, o passageiro, o transitório sempre esteve representado pela metáfora do “nome escrito na areia” que o mar vem e logo apaga. Veja que belo aproveitamento desta imagem na trova ao lado.

Malgrado a graça suprema
que o nosso olhar incendeia,
a juventude é poema
que a vida escreve na areia.
(Élen de Novaes Félix)


28.
Está no jogo de palavras, na inteligente manipulação das variantes semânticas do vocábulo “pena”, a beleza do achado desta primorosa trova do mestre Izo Goldman.

Que pena que as minhas penas
não te causem pena alguma,
e, sem pena, eu seja apenas,
entre as penas... só mais uma!
(Izo Goldman)


29.
A maioria dos concursos exige a menção da palavra-tema na trova. Muito já se discutiu sobre tal obrigatoriedade e as opiniões são bem divergentes. Mas veja aqui uma bela trova, premiada em Nova Friburgo em que a ausência da palavra não prejudicou em nada a ideia de “Presença”, o tema proposto

O livro, o cigarro ao lado,
o rádio, o abajur antigo...
Eu deixo tudo arrumado
fingindo que estás comigo...
(Maria Tereza Noronha)

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