3. MOÇAMBIQUE
Em
Moçambique, com um índice menor de europeus do que em Angola, com uma fixação
de população branca mais instável, não deveriam ter sido criadas as condições
culturais suficientes para o desenvolvimento de uma actividade literária cujo
eco chegasse até aos nossos dias [30]. Nem se dá pela presença do notável poeta
português Tomás António Gonzaga (1744 — 1810), degredado do Brasil para a ilha
de Moçambique cerca de 1792, onde faleceria. Não obstante, a imprensa da época
faz-se eco de críticas ao poder e à administração; e a literatura, através de
poemas publicados de quando em quando, ensaia os primeiros passos da sua
existência. Destacam-se os semanários O Africano (1877), O vigilante (1882?),
Clamor Africano (1892?) que não usavam desencadear denúncias e ataques à
corrupção e ao desumano tratamento dado às populações africanas, embora por
vezes revelando uma perspectiva contraditória na análise global dos problemas
(«Contributo para a história da Imprensa em Moçambique». Vide Bibliografia). Jornalistas prestigiados a partir da
primeira década do século XX são os irmãos, mestiços, José e João Abasini que
fundam O Africano (1908-1920) e vão continuar a sua acção política e pedagógica
em O Brado Africano (1918). A estes dois nomes se junta o do seu compatriota
Estácio Dias. Todavia, não há, até agora, conhecimento de haver sido publicado
em Moçambique qualquer romance ou livro de poemas, antes do Uvro da dor, 1925
(contos) de João Albasini, o que não significa, de maneira nenhuma, a hipótese,
ainda que remota, da existência de qualquer obra que não tenha sido ainda
detectada.
Como
quer que seja, para a formulação de uma correcta ideia dos valores que povoam a
última parte do século XIX e a primeira do século XX, em relação a qualquer
destes países, é necessário ter em conta a colaboração dada aos almanaques, com
especial atenção ao Almanach de Lembranças (1851 — 1932), publicado em Iisboa,
mas para onde convergiam muitos poetas africanos da língua portuguesa.
4. GUINE-BISSAU
Conforme
adiante procuraremos desenvolver, não foram criadas na Guiné-Bissau condições
sócio-culturais propícias à revelação de valores literários. Basta termos
presente que o primeiro jornal dessa ex-colónia, o Pró-Guiné, foi fundado em
1924. Há, no entanto, que destacar uma figura de relevo, a solicitar as
atenções da investigação, o cónego Marcelino Marques de Barros (1843 — 1929)
que no campo da etnografia (Literatura dos
Negros, 1900) desenvolveu grande
aplicação, sintonizando-se em qualidade com os especialistas portugueses
coevos que, frize-se, eram de nível europeu. Para além da obra citada deixou
colaboração dispersa, inclusivamente no Ahnanach LusoAjricano para 1899 (Cabo
Verde), na Revista Lusitana, A Tribuna, Boletim da Sociedade de Geografia de
Usboa, Anais das Missões Ultramarinas; Voz da Pátria, na qual publicou canções
e contos, dois dos quais republicados por J. Leite de Vasconcelos em Contos
populares e lendas, vol. 1, 1964. Finalmente parece ter deixado um manuscrito:
«Contos e cantares africanos», por certo da Guiné-Bissau.
–––––-
Nota:
[30]
Aqui nos cumpre esclarecer, se para tanto houver necessidade. Quando ao longo
das nossas intervenções nos referimos a uma maior ou menor presença europeia ou
a um maior ou menor índice de mestiçagem como fundamento de uma maior ou menor
actividade cultural ou literária, é evidente que não pretendemos emprestar a
estas afirmações um carácter racial, mas sim cultural e político. Os alicerces
de uma literatura neo-africana do período colonial construíram-se a partir de
uma burguesia europeia, europeizada ou africana. O povo, o homem africano, esse
continuando analfabeto, longe das influências culturais de raiz europeia,
manteve-se alheio ao processo literário. Os jornalistas, os poetas, os
ficcionistas teriam forçosamente de ser recrutados nos estratos sociais de onde
emergiam, normalmente, aqueles que teriam acesso à escola, à instrução, à
cultura.
Continua…
S. Tomé e Príncipe
Fonte:
Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa I Biblioteca Breve / Volume 6 – Instituto de Cultura Portuguesa – Secretaria de Estado da Investigação Científica Ministério da Educação e Investigação Científica – 1. edição — Portugal: Livraria Bertrand, Maio de 1977
Literaturas Africanas de Expressão Portuguesa I Biblioteca Breve / Volume 6 – Instituto de Cultura Portuguesa – Secretaria de Estado da Investigação Científica Ministério da Educação e Investigação Científica – 1. edição — Portugal: Livraria Bertrand, Maio de 1977
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