quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Antonio Carlos de Barros (Chimarrão) Parte 2, final

( Nota: as palavras em itálico negritado possuem o seu significado no vocabulário no final a postagem)
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Engana-se quem pensa que o Chimarrão é popular apenas no Sul do Brasil. A bebida é muito consumida também em outros países, como Uruguai e Argentina. Originária das culturas indígenas caingangue, guarani, aimará e quíchua, o mate foi logo incorporado no dia-a-dia dos imigrantes europeus que vieram para o Sul do Brasil e de outros países da região dos Pampas, e se tornou um símbolo local.

Benefícios do consumo do Chimarrão para a saúde

Não, o chimarrão não é só uma água verde e quente que a gurizada do sul gosta de beber em grupo. A bebida é ótima para a saúde e rica em vitaminas. Quem bebe um mate amargo está consumindo importantes vitaminas, como o complexo B, vitamina C e vitamina D, além de sais minerais, como cálcio, manganês e potássio.

Dentre os benefícios para a saúde quando se consome o chimarrão, está o combate aos radicais livres, melhora na digestão e combate ao reumatismo. O Chimarrão deixa a  pele mais bonita, pois favorece a regeneração celular, e regula funções cardíacas e respiratórias. Também fortalece os ossos, ajudando a prevenir doenças como osteoporose.

O Chimarrão também é um excelente diurético e laxante, além de estimular a libido (Opa!), pois contém saponina, que é um dos componentes da testosterona.

Chimarrão é ótimo aliado na dieta, já que, por ser um estimulante natural, acelera o metabolismo.

E se você percebeu que, ao beber um chimarrão enquanto estava com fome, teve sensação de saciedade depois, você não está pirando não. O chimarrão realmente tem este poder, isso porque a erva-mate tem um valor nutricional absurdo. Segundo estudos científicos, o chimarrão oferece praticamente todas as vitaminas necessárias para sustentar a vida.

Acessórios para tomar chimarrão 

Para fazer um chimarrão, são necessários uma cuia (recipiente aonde vai o chimarrão), a bomba (Tacuapy) “canudo” em que se bebe o chimarrão, uma chaleira ou uma garrafa térmica para manter a água quente, erva-mate e água quente. Quanto à temperatura da água depende muito de cada pessoa. Aqui no Sul, no inverno costuma-se deixar a água com 70º centígrados, no verão um pouco menos. Não se deve jamais deixar a água ferver. 

Regras do Chimarrão - Estilo de beber o mate

O mate pode ser tomado de três maneiras, em relação à companhia: o mate solito (isoladamente); o mate de parceria (uma companheira ou companheiro) e, finalmente, em roda de mate (em grupo).

A MÃO DIREITA

Para se receber o mate ou entregar a cuia de mate, deverá ser feito com a mão direita. No caso da mão direita estar ocupada, a pessoa deverá dizer:

- Desculpe a mão!

Ao que o outro responde:

- É a do coração.

Fora dessa exceção, sempre com a mão direita.

SÓ O CEVADOR PODE MEXER NO MATE

A menos que se obtenha licença, só o cevador deve arrumar o mate, considerando-se falta de respeito alguém mexer sem permissão. O bom cevador, cada vez que recebe a cuia, antes de enchê-la, dá uma ajeitada na bomba, de modo que renove o fluxo de seiva, demonstrando, assim, seu conhecimento na intimidade com o mate.

O PRIMEIRO MATE

Como já falamos, todo aquele que fecha um mate (faz o mate) deve tomar o primeiro em presença do parceiro ou na roda de mate.

Este fato tornou-se tradicional devido a épocas remotas em que o mate serviu de veículo para envenenamentos. Por isso, o ato do mateador  tomar o primeiro indica que o mate está em condições de ser tomado.

Ainda no caso do primeiro mate, outro motivo que nos chega foi devido aos jesuítas, que atribuindo valores afrodisíacos ao mate, e para evitar que os índios passassem a maior parte do dia mateando, tentando afastá-los do hábito, criaram o mito entre os silvícolas cristianizados que Anhangá Pitã (diabo) estava dentro do mate.

Mas não foram bem sucedidos os jesuítas e o hábito salutar sobrepujou o temor que lhes fora impresso. Por isso, toda vez que o indígena ia tomar um mate em presença dos outros, tomava o primeiro mate como demonstração que Anhangá Pitã não se encontrava no mate.

RONCAR CUIA

Uma vez servido o mate, deve ser tomado todo, até esgotá-lo, fazendo roncar a cuia.

O grande poeta, músico e cantor Paulinho Pires ensina o legado em sua canção: CEVADOR DE MATE.

Eu já nasci prá cevador de mate,
Da madrugada ao anoitecer,
Cresci amando a natureza bugra
Sina bonita do meu bem querer.

E na música CEVADOR com Letra de João Tadeu Soares da Silva e Salvador Lamberty e Melodia de Leonardo Sarturi.

A Cuia, em forma de taça, Cevador e Chimarrão 
Lembram o gesto de Cristo, dividindo vinho e pão. 
Trazem, no ritual do mate, a fraterna comunhão, 
Querendo mostrar ao mundo que somos todos irmãos. 
A Cuia foi a parceira dos Guaranis combatentes, 
Que elevaram corpo e alma, ao sorver da água quente. 
Em forma de coração - parece um seio moreno – 
Um mapa do meu Rio Grande, mesmo com porte pequeno. 
Cuia, cevador e mate na seiva da convivência, 
São relíquias que afagam e adoçam minha existência! 
Nas Rodas de Chimarrão os assuntos vêm à tona: 
Embates, Tropas, Aprontes, um cortejo pra Siá Dona. 
Sorvem-se reminiscências - tempos deixados pra trás: 
Quantos Heróis Comandantes, quantos Tratados de Paz! 
Cuia, cevador e mate - vertentes de telurismo, 
Que jujam, ao pé do fogo, sementes de um atavismo 
Quando eu parar deste mundo quero levar, no costado, 
Meus Avios de Chimarrão pra matear d'outro lado!

Outra regra importante é não agradecer após beber o chimarrão. Não é falta de educação, pelo contrário. É sinal que você ainda não terminou de beber chimarrão com estas pessoas, e quer continuar participando da roda.

Somente um ícone da cultura gauchesca, poeta, escritor, cantor e músico, o consagrado Telmo de Lima Freitas para nos brindar com a sua "Alma de Galpão"

Como faz bem um chimarrão feito a capricho
Quando cevado com o calor da própria mão
A madrugada negaceando mostra a cara
Cheiro de garras e pelegos pelo chão.

Como faz bem ouvir o relincho do potro
Lá na mangueira a espera do buçal,
Baio sebruno, cabos negros de respeito,
Que pelo jeito, não nasceu pra ser bagual.

Como faz bem tomar um banho na restinga
Vestir as pilchas domingueiras pra passear
Ouvir a gaita de oito baixos resmungando
Adivinhando o pensamento do seu par.

Como faz bem sentir o gosto da querência
Ouvir um grito explodindo no rincão
O venha, venha, do tropeiro nas estradas
Rezando a prece, de retorno ao velho chão.

Como faz bem lavar a fuça na gamela
Tirar o freio pra depois chimarronear
E o gado manso ruminando junto às casas,
E a terneirada num berreiro pra mamar.

Como faz bem sentir o cheiro do borralho
Respirar fundo o braseiro do tição
Rio Grande velho, que retrata diariamente,
Como se forja uma alma de galpão.

Bueno, após sorver o mate dos ervais de nossa convivência. Posso chama-lo de: “Mate da Esperança”. O sabor é o da comunhão, da partilha, do sonho coletivo e da fraternidade. Não deixe morrer a esperança que existe em seu coração. Haverá sempre uma luz para iluminar nosso caminho. E quando esse dia chegar, tomares um mate de Patrão. Um mate pra ti.
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VOCABULÁRIO
Atavismo – herança dos ancestrais.

Avios – objetos necessários para tomar mate.

Bagual – animal ainda não domado, selvagem.

Borralho – brasas cobertas de cinzas.

Cabos Negros – diz-se do cavalo de qualquer pelo que tem negras as quatro patas.

Chimarronear – tomar chimarrão, matear.

Fuça – rosto, face, cara.

Jujam / Jujo – erva medicinal, chá.

Mate de Patrão - o significado é comparativo à uma Estância ou Fazenda, onde existem o Patrão (dono da fazenda) Capataz, peões, etc. Então o Mate de ou do Patrão é sempre o melhor, mais bonito, mais vistoso, etc. O CTG - Centro de Tradições Gaúchas, foram pensados como se fossem uma grande Estância ou Fazenda, onde existem: Patrão, Capataz, Peões, Invernadas, Piquetes, etc. Na sociedade Urbana o Patrão representa o Presidente da entidade, o Capataz seria o Vice Presidente, a Invernada seria os Departamentos, os Piquetes seriam as seções, os Peões os demais funcionários.

Pilchas – adorno, joias, roupas, vestimenta típica do Gaúcho.

Querência – lugar onde nasceu, se criou ou viveu.

Restinga – mato constituído de árvores de pequeno porte, nas baixadas , à margem de rios.

Rincão – ponta de campo cercada de rios, matas.

Sebruno – animal cavalar de pelo escuro. 

Telurismo – influência do solo sobre os usos e costumes habitantes.

Fonte:
Artigo e vocabulário enviados pelo autor.

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