quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Lúcia Constantino (Poemas Avulsos) 2


ASILO OU EXÍLIO?

Os chinelos não produzem som.
Nem o rádio tocando baixinho.
Mas a respiração se ouve do lado de fora.
E o sonho de ainda poder tocar as estrelas
talvez chegue até Deus.

DIMENSÃO DA NOITE

Teu olhar mudo.
Uma sombra toma-me pelo pulso.
Réstias de luz são meus vultos,
meu país é o crepúsculo.

Derrubo os muros,
mendiga de sol e ventos
que tragam lá do futuro
fontes pro pensamento...

Cai a noite, noite inquieta...
suspeita de mil anjos adormecidos
Nenhum portal, nenhuma seta.
Só um silêncio vivo.

E a última estrela no céu
é acendedor dos esquecidos.

ESSA PAZ DOLOROSA

Essa paz dolorosa,
perfume que no vento
traz espinhos
e não a rosa.

Essa paz cansada
de escolher um novo caminho
e sempre e de novo
errar a estrada.

Essa paz que nos vãos da noite
procura estrelas nos abismos
onde elas brilham tão fortes.
Sentinelas do deus destino.

Paz dolorosa e imensurável
e por demais amiga:
minha mesa, meu vinho,
meu pão.

Deixarei que nela
minha alma  refaça caminhos,
vertendo saudade nos linhos
aonde um dia pousei
o teu coração.

ROSAS BRANCAS

Rosas brancas do santuário,
são como cristais em manhã de inverno.
Refletem o encanto dos campanários,
e têm um rosto de sonho eterno.

Dou-te um buquê de brancas rosas
para que te adornem por toda a vida.
No teu puro linho, em verso e prosa,
borde-as sempre, pela alma florescidas.

Que pelos mares da vida, em sábio norte
naveguem teus poemas a mágicos horizontes
encantando ondinas, estrelas...imensidão.

São rosas brancas que o universo doa
esses teus versos em cujas asas voam
os mais belos sonhos do coração.

SOBRE OS LÍRIOS

Esta Tua mão se abaixa
e toca o lírio do campo.
Me dás o fruto dos Teus gestos
ao tecer meu sorriso
ao determinar meu pranto.

Teus pés caminham firmes.
Cidadela em torno d'alma,
de minha alma que vestistes
sob o contorno de Tua palma.

Tu te abaixas e persistes
a acolher lírios dos campos.
Neste meu tão breve céu
sou lírio asilado sob Teu manto.

TEMPO DE EXISTIR

Ainda recordo meu tempo de fé:
O movimento das horas
cinzelando meus sonhos.
As palavras sem travas,
as ossadas das lembranças
mergulhadas nas sombras.
Um canteiro de cânfora
perfumando as mãos.

Meu tempo de esperança
não era essa caricatura de estrelas
que borram o céu dos sentidos.
Era um rosto organizando a vida.
Era um culto velando o sono,
um oráculo em vestes amarelas,
fomentando o divino,
nas pequeninas coisas.
Uma semente, um sorriso,
uma palavra dispersa que nutria.

Medito sobre estes restos de caminhos
que me chegam,
sobre esse tempo que se estende
diante da colina:
um tempo inanimado em seu degredo,
mas que, vez ou outra, acende uma luz
a serviço dessa minha noite
de vigília eterna.

UM DIA…

Um dia o mundo abriu-se em uma página,
despontando o sol do sonho no papel.
E num impulso ao mar azul soltei a lágrima
pra que fosse navegando até teu céu.

Deste, à noite escura o que importava:
mil estrelas que foram portas concebidas
pra passagem de minh’alma que andava
perdida em si mesma, procurando a vida.

Mas o destino traçou seu rumo ao léu
e quis que o tempo falasse como um deus
pra levar o coração a canto algum...

Meus olhos, de cansados, ferem lágrimas
pra um destino ignorado e em brancas páginas
escrevem para ti ou talvez pra céu nenhum!

Fonte:
http://asasonoras.blogspot.com

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