A Emília avista o professor Bebeto da licenciatura de Português no corredor, a caminho do refeitório. Lindamente bonita e extrovertida, acondicionada numa sainha muito curta e acima dos joelhos, recém chegada na casa dos dezoito, dá um jeito de despistar as colegas e puxar conversa, despachando as chatas e se colocando ao lado do professor.
O mestre Bebeto, como é conhecido por todos seus alunos, esperto, macaco velho na cadeira que mantém há anos, e sobretudo, sabendo das intenções da jovem, procura tirar por menos levando tudo o que ela fala, na brincadeira. Por assim, as conversações da moça entram por um ouvido e saem pelo outro.
Toda vez que o encontra, Emília dá um jeito de atacar, indo direito ao ponto, não se importando com o que seus amigos de sala ou mesmo os demais restantes da escola venham a pensar ou a fofocar depois. Aliás, o estabelecimento de ensino em peso (da galera da cantina às faxineiras), sabem que ela se joga leve e solta, para o charmosíssimo e muy encantador amado mestre tentando entabular, com ele, um romance, custe o que custar:
- Bom dia, meu amado professor. Estava com saudades. Desde ontem não o vejo. Sei que o senhor é duro na queda, mas procuro levar em conta aquela velha frase que ensina: ‘água dura em pedra mole, tanto bate até que sai molhada’.
O professor Bebeto sorri um sorriso encantador e envolvente e trata de dar um fora na musa, sem ferir seus brios:
- Emília, a frase está errada. ‘Agua mole, em pedra dura, tanto bate até que fura’.
Emília bate palmas e em seguida devolve a resposta do professor, se abrindo numa magia divinal e mais aconchegante ainda:
- Estou gostando de ver, meu très charmant (formosíssimo) e amado mestre. Está prestando mais atenção ao que digo.
- Nada disso: só estou lhe corrigindo o erro da oração como foi posta e mostrando como se pronuncia o enunciado corretamente.
Ela não quer saber do papo furado. Enlaça o professor pelo braço e segue atentando o seu lado homem, objetivando acertar uma flechada naquele lugarzinho secreto que ele não deixa brecha para que ninguém ultrapasse os limites. Encostada a seu ouvido, a deusa sussurra numa vozinha doce e gostosa de ouvir:
- Vou prender o senhor com meu laço. Saiba, meu príncipe encantado, que até hoje ninguém... Eu disse ninguém escapou nem resistiu ao meu charme.
O professor Bebeto, seguro de si e sem deixar de lado o seu melhor sorriso (exatamente aquele que cativou a Emília, desde a primeira vez em que o viu), rebateu, de pronto:
- Asseguro que a senhorita não conseguirá, ainda que leve em consideração todas as hipóteses que poderiam acontecer entre um homem e uma mulher... Ah, quase me esquecia do mais importante. Leve em acolhimento que pelo fato de ter sido a única da sua sala a ganhar nota máxima na redação, sempre haverá um enorme distanciamento entre nós.
- E por que o meu amado mestre acha que eu não terei sucesso em meu empreendimento? Lembra, meu gato: a carne é fraca. Sei que o senhor está doido para me levar para uma aventura esplendorosa, inimitável, inesquecível. E ela acontecerá mais rápido que o senhor pensa...
- Isto jamais se tornará real e palpável.
- Qual o quê! Logo o senhor estará preso em meu laço.
- Emília, desde que entrei para esta escola... Há exatos dez anos atrás, eu me tornei um sujeito lasso.
Com estas palavras, o professor Bebeto se desvencilhou carinhosamente da esfuziante e tentadora aluna e entrou correndo na sala dos professores.
Fonte:
Texto enviado pelo autor.
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