quinta-feira, 26 de novembro de 2020

Aparecido Raimundo de Souza (Coriscando) 6: Sobrevivência


O GATO PRETO estava com uma fome tremenda. Uma fome de três dias ou mais. De repente, viu seu almoço suculento em forma de passarinho. Era um desses caseiros que, fora da gaiola, não enxergam um palmo adiante do bico.

Esfomeado, armou o bote para pegá-lo. Calculou milimetricamente o pulo.

Chuapppp...

Entretanto, ao tentar abocanha-lo, outro bichano, de pelos brancos, igualmente espreitava a mesma iguaria. E o gato preto, não o vira. Foi seu erro. Mais safo e despachado, o malandro miador chegou de mansinho. Veio em sentido contrario e, num salto certeiro, se adiantou.

 Chuapppp...

Arrebatou, vitorioso,  o saboroso almoço  quentinho do dia.

O gato preto, coitado, ao se deparar com esse imprevisto, arregalou os olhos e ficou a ver a gaiola vazia. Não só isso. Seu almoço tomando outro rumo na boca sorridente de um desconhecido companheiro de desdita. A maldita fome, nessa hora, como por desencanto, aumentou mais.  Além de crescer, passou a doer com mais insistência.  

Do outro lado, longe de outros predadores da mesma consanguinidade, seguro de si, protegido por alto beiral de uma casa antiga, realizado e feliz, pomposo e dono da situação o incogitado amigo de pelos brancos (amigo da onça) se banqueteava em saborosas dentadas, a desditosa avezinha.

MORAL SEM MORAL DA HISTÓRIA:

O gato preto ficou cabisbaixo, vencido.  Limitou a afagar o desequilíbrio da turbulenta roncação da barriga vazia, em face do naco deleitável, do regalado cobiçável que lhe escapara, incontinente, das humildes garras.

Resumindo: também no mundo animal, vale a inteligência do mais esperto.

Fonte:
texto enviado pelo autor.
Imagem = montagem por JGFeldman

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