quarta-feira, 6 de abril de 2022

Antonio Juraci Siqueira (Poemas Recolhidos) 2


CIVILIZAÇÃO

Tantos rostos perdidos
na imensa avenida
que a lida transforma
num abismo sem fim.

Tantas mãos que tateiam
pela escuridão
à cata de amor,
de abrigo, de pão...

Ouvidos atentos
que nada mais ouvem,
olhos abertos que nada mais veem,
pés que se movem no mesmo lugar...

Pobre caminheiro sem caminho,
pássaro sem asas e sem ninho!

Triste animal que ri da própria sorte,
que sepulta a vida e ressuscita a morte!

Mas a festa continua e ele dança.
Dança e canta,
canta e cansa,
cansa e morre
porre de orgulho e presunção
por ser integrante
de tão propalada
civilização!!!
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INCÓGNITO

Parti no alvorecer, ainda menino,
à procura do Amor e da Verdade
mas antes de se por o sol a pino
entre pedras perdi a identidade.

Debalde tento agora reencontrá-la
em cada esquina, em cada gesto e olhar...
- Quem sou?  -  pergunto ao céu e ele se cala;
- Que sou? – desesperado indago ao mar.

E sem respostas – pássaro sem ninho –
vou pela vida na indefinição
de quem procura, às cegas, um caminho
para o porto inseguro da ilusão.
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JUVÊNCIO

Assim vai Juvêncio
na sua aventura.
Da mata, o silêncio,
suave langor...
- Que motivo tanto
pra tanta bravura?
- Vai atrás do encanto
do seu santo amor.

Um riso escondido
no rosto moreno.
Herói das entranhas
das matas em flor.
No olhar sereno,
uma luz estranha...
Coisas do Cupido,
ciladas do amor!

Vai rasgando as águas
revoltas e turvas,
afogando as mágoas,
sufocando a dor.
Vai dobrando as curvas
do rio e da vida,
esquecendo a lida.
Vai ver seu amor!
      
A noite já avança,
o sol já descansa,
remar, seu ofício,
sua sina, lutar.
A canoa balança,
o remo lhe cansa.
Tanto sacrifício
pelo verbo amar!...

Não sente pavor
de fera ou visagem,
só pensa na imagem
da Rosa a esperar.
Vai pensando nela,
tão meiga, tão bela,
repleta de amor
e beijos pra dar.
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QUANDO

Quando o fogo destes versos consumir
teus segredos, virtudes e pecados,
eu estarei à margem do caminho
qual Prometeu furtivo te espreitando
para roubar a chama imorredoura
que arde na redoma indestrutível
do teu peito risonho de criança.

 Quando a fome do amor comer meus olhos
impedindo-me de ver as mariposas
que copulam sobre as pétalas noturnas
de um rubro girassol filosofal,
tu estarás oculta entre as miragens
de um sonho metafísico gravado
numa canção latino-americana.

Então, quando isso tudo acontecer,
não seremos , simplesmente, macho e fêmea:
seremos sementes de vida e esperança
a germinar nos campos da existência,
a florescer no amor e dar ao mundo
os cobiçados pomos da poesia.

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