segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Vereda da Poesia = 107 =


Trova de Angra dos Reis/RJ

JESSÉ NASCIMENTO

Mãos erguidas, força unida,
no simbolismo que encerra:
a conservação da vida,
na preservação da Terra. 
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Poema de Fortaleza/CE

NEMÉSIO PRATA

Não deixa te levar pela vingança, 
pois isto não é coisa de Cristão: 
perdoa! Com amor, e sem tardança 
vai lá, e abraça, e beija o teu Irmão! 

Se um dia alguém te fizer qualquer mal, 
não vira-lhe o rosto, imita a Jesus, 
o grande perdoador que, no final, 
perdoou os que lhe puseram na Cruz! 

Se alguma ovelha encontra-se afastada, 
procura-a, pois, pra Deus ela é preciosa; 
encontra-a, e traze-a de volta, "puxada" 
pelas cordas do amor..., esta "teimosa"!
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Trova de São José dos Campos/SP

ADAMO PASQUARELLI

Felicidade - utopia
que está bem longe de mim,
quem sabe se qualquer dia
essa utopia tem fim...
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Soneto de Volta Redonda/RJ

ANTÔNIO OLIVEIRA PENA

O Caminho

Dize a palavra que te encerre o sonho,
aquela que resuma o teu desejo;
evita aquela de pesar medonho,
aquela de lamento malfazejo.

Dize a palavra que te encerre o sonho
com a mesma intensidade do teu beijo!
Evita o murmurar insano, e põe o
teu pensamento a trabalhar, que vejo

que aquilo que dizemos é que é ouvido,
ainda que o façamos em segredo...
— Não há palavra sem repercussão!...

Na estrada em que o homem vai, tão comovido,
seja de sua pátria, ou do degredo,
antes, por ela, andou seu coração!
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Quadra de Vila Real de Santo António/Portugal

ANTONIO ALEIXO
(António Fernandes Aleixo)
1899 — 1949, Loulé/França

Esses por quem não te interessas
produzem quanto consomes:
vivem das suas promessas
ganhando o pão que tu comes.
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Poema de Caicó/RN

DILMA DAMASCENO

A Menina de Caicó

Imagino as “madeixas do sertão”,
com tranças enfeitadas de bonina,
realçando a paisagem campesina,
- a confundir-se com a plantação -,
no decorrer da flórida estação!

… E nas águas do Itans azul-turqueza,
- ao sabor indelével da pureza -,
imagino “a menina de Caicó”,
- pintando sonhos e remando só -,
em sintonia com a natureza!
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Trova Popular

Menina dos olhos verdes,
dá-me água pra beber;
não é sede, não é nada,
é vontade de te ver.
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Soneto de Curitiba/PR

JANSKE NIEMANN SCHLENCKER

Deixa que eu brinque

Deixa que eu brinque por aí, à toa;
as aves brincam, brinca a ventania...
Brincam as flores com a luz do dia
e a borboleta que por elas voa.

Deixa que eu brinque, ainda que me doa
ver escapar-se a límpida alegria
do mesmo olhar, cuja inocência via
em qualquer coisa alguma coisa boa.

Deixa que eu brinque como se, inocente,
eu não soubesse que viver é queixa,
é choro apenas... E eu só peço: deixa...

Deixa que eu brinque levianamente
como se tudo - a nossa vida inteira -
jamais passasse de uma brincadeira...
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Trova de Bauru/SP

HELVÉCIO BARROS
Macau/RN (1909 – 1995)Bauru/SP

Palhaço, visão querida,
dos meus tempos de criança...
velha saudade escondida,
no meu baú de lembrança!
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Poema de Portugal

FLORBELA ESPANCA
(Florbela d'Alma da Conceição Espanca)
Vila Viçosa/Portugal, 1894 — 1930, Matosinhos/Portugal

Poetas

Ai as almas dos poetas
Não as entende ninguém;
São almas de violetas
Que são poetas também.

Andam perdidas na vida,
Feitos as estrelas no ar;
Sentem o vento gemer
Ouvem as rosas chorar!

Só quem embala no peito
Dores amargas e secretas
É que em noites de luar
Pode entender os poetas

E eu que arrasto amarguras
Que nunca arrastou ninguém
Tenho alma para sentir
A dos poetas também!
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Trova Humorística de São Paulo/SP

THEREZINHA DIEGUEZ BRISOLLA

"Tira a mão! - Diz, enfezada -
tá pensando que é baderna?"
"Desculpe, ao dançar lambada,
nunca sei de quem é a perna!?”
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Soneto do Rio de Janeiro/RJ

VINÍCIUS DE MORAES
(Marcus Vinícius da Cruz de Melo Moraes)
(1913 – 1980)

Soneto do Maior Amor

Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.

E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.

Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer — e vive a esmo

Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo.
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Trova de Bandeirantes/PR

ISTELA MARINA GOTELIPE LIMA

O tempo passa inclemente,
sem nos pedir permissão,
e o espelho fiel não mente:
- o tempo não passa em vão!
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Poema de Guiné Bissau

HÉLDER PROENÇA
Bolama, 1956 – 2009, Bissau

Não posso adiar a palavra

Quando te propus
um amanhecer diferente
a terra ainda fervia em lavas
e os homens ainda eram bestas ferozes

Quando te propus
a conquista do futuro
vazias eram as mãos 

negras como breu o silêncio da resposta

Quando te propus
o acumular de forças
o sangue nômade e igual
coagulava em todos os cárceres

em toda a terra
e em todos os homens

Quando te propus
um amanhecer diferente, amor
a eternidade voraz das nossas dores
era igual a «Deus Pai todo poderoso criador dos céus e da terra» 

Quando te propus
olhos secos, pés na terra, e convicção firme
surdos eram os céus e a terra
receptivos as balas e punhais

as amaldiçoavam cada existência nossa

Quando te propus
abraçar a história, amor
tantas foram as esperanças comidas
insondável a fé forjada

no extenso breu de canto e morte

Foi assim que te propus
no circuito de lágrimas e fogo, Povo meu
o hastear eterno do nosso sangue
para um amanhecer diferente!
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Trova de São Paulo/SP

JAIME PINA DA SILVEIRA 

Chamar os velhos de insanos,
seria uma insanidade.
Há moços, quase aos cem anos...
e velhos, na flor da idade!
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Soneto Gaúcho

ALMA WELT
Novo Hamburgo/RS, 1972 – 2007, Rosário do Sul/RS

A Câmara Escura

Há momentos em que nos despedaçamos
Contra as arestas do nosso próprio ser,
Então a duras penas nós juntamos
Nossos cacos num mosaico de viver.

Na imagem interior restam fissuras
Como fossem cicatrizes das batalhas
Que travamos não com outras criaturas
Mas conosco mesmo e nossas falhas.

“Mas então, onde é que entra o mundo
Nessa tua síntese autofágica,
Se consideras só teu ser profundo?”

Na câmara da alma é o contrário:
O mundo é o ser na caixa mágica
Como reflexo invertido num armário...
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Trova Humorística de Nova Friburgo/RJ

MARIA LUA

“Quero uma vaca atolada!”
e o garçom, bebum de fama,
em vez da sopa esperada,
jogou a vaca na lama!...
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Poema de Maringá/PR

MARCIANO LOPES E SILVA
Porto Alegre/RS (1965 – 2013) Maringá/PR

Na Correnteza do Tempo

Negro impasse:
erguer ruínas
ou contorná-las 
em abismo?

Perplexo, vivo à deriva:
caçador de cacos
na correnteza do tempo.
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Trova de Maringá/PR

A. A. DE ASSIS

Assim que me aposentei, 
ao meu relógio dei fim... 
Sem ele eu me sinto um rei, 
dono do tempo e de mim!
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Indriso de Villanueva e La Geltrú/Espanha

ISIDRO ITURAT

Cantiga do Viajante sem Sono

Não podem dormir os meus olhos,
não podem dormir,
porque a serrana diz

que quisera ver-me amanhã.
Não podem dormir os meus olhos,
não podem dormir,

porque a verei no prado,

porque a verei amanhã.
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Trova da Princesa dos Trovadores

CAROLINA RAMOS
Santos/SP

No claro-escuro da vida,
fusão de alegria e dor,
a penumbra é colorida
se for penumbra de amor!
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Hino de Manacapuru/ AM

Salve, Manacapuru
Taba altiva do rio Solimões,
Salve, Manacapuru
Tu plasmaste nossos corações
Salve, Manacapuru
Terra fértil de um povo viril,
Os teus filhos se orgulham de ti,
E engrandecem a todo o Brasil

Eme a má, ene a na, tens maná
Ce a cá, manacá tens tu
Pê u pu, erre uru, formado está
O teu nome Manacapuru

Salve, Manacapuru
Tens nas águas piscosas, fartura,
Salve, Manacapuru
Teus rebanhos a carne assegura
Salve, Manacapuru
Tens, minério, castanha e madeira
A instrução de moral e civismo
De há muito é a tua Bandeira.
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Trova de Pinhais/PR

LÍGIA CHRISTINA DE MENEZES

Meu girassol pobrezinho
saudoso, não resistiu.
Morreu olhando o caminho
por onde meu bem partiu…
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Poema Goiano

HAROLDO DE BRITTO GIMARÃES
Goiatuba/GO (1928 – 1998) Goiânia/GO

O Disco 

Dispa-se de toda angustia
de toda a paixão, de todo o ódio:
- Olhe o disco rodando.
Sinta-o não porque ele traga
Chopin, - um, samba, moda de viola, um valsa,
um tango para os desesperados desta noite.

Sinta todo o encantamento da infância
num disco a girar! coisa estranha é, voz humana
brotando de pedra escura do limbo
que gravou a natureza selvagem da Noite.
Sinta a sua infância ou a sua velhice
observe um disco a girar:
girando no tempo, na face das águas ...
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Trova de Santos Dumont/MG

SEBASTIÃO TORRES DE LIMA

Amar... é felicidade!
É ternura... é bom demais!
- Quem tem amor de verdade,
renuncia a tudo mais!
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Fábula em Versos da França

JEAN DE LA FONTAINE
Château-Thierry, 1621 – 1695, Paris

Os peixes e o pastor que toca flauta

Tirso, jovem amante pegureiro,
Que aos sons da flauta o canto acrescentava,
Tocava um dia à borda de um ribeiro
Que com as linfas os prados refrescava.

Tocava Tirso; e a sedutora Aninha
Pescava ao mesmo tempo;
Mas — fatal contratempo! —
Nem um só peixe lhe acudia à linha!

O pastor, que com seu mavioso canto
Atraía inumanas,
Aos tais das barbatanas
Desta sorte cantou: «Deixai o encanto

Da náiade que amais; d’outra mais bela
Não temais a prisão:
Cruel pode ser ela
Com os humanos — com os peixes, não!

Cruel fosse!... a morrer quem não se afoita
Àquelas mãos galantes?»
Os tais peixinhos — moita!...
Não acodem à linha como dantes.

Tirso vê que se cansa
Em vão cantar; na água a rede lança;
E aos pés da pastorinha
Depõe o peixe que fugira à linha.

Reis, que em razões sutis fazeis estudo
Para convencer a estranhos,
Malograis vossos empenhos;
Lançai as redes. O poder faz tudo.

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