sábado, 14 de julho de 2012

Bernardo Trancoso (Caderno de Sonetos I)


A ROSA BRANCA (I)

Tantas púrpuras rosas no rosal;
Grosas e grosas, tão bonitas rosas;
Entre as rosas vultosas, majestosas,
Brota uma branca rosa, desigual.

Meu olhar só percebe a rosa tal;
Prefere-lhe, entre rosas mais charmosas;
Rosas prá te dizer que, em meio às grosas,
És como a rosa branca, especial.

Tens no andar que alucina novas cores;
É por ter novas cores que alucina;
És preferida, dentre mil amores.

Como a flor no rosal, tão pequenina
Que, perante outras mais formosas flores,
Difere e, o coração, logo ilumina.

A ROSA BRANCA (II)

Tantas púrpuras rosas pelo chão;
Grosas e grosas, lá se vão as rosas;
Entre as rosas feiosas, mal-cheirosas,
Brilha uma branca rosa, em exceção.

Meu olhar escolheu tal rosa, então,
Protegeu-lhe, entre rosas perigosas.
Rosa a seiva que falta àquelas grosas,
Concede à rosa branca o coração.

Contrastes já não valem mais, nem cores
Que, dentre mil amores, são só teus,
Pois o tempo carrega esses primores.

Vale é ser essa flor que, aos olhos meus,
Nunca apodrecerá, como outras flores.
Vais brilhar nos rosais do eterno Deus.

A ROSA BRANCA (III)

Tantas púrpuras rosas na avenida;
Grosas e grosas, tão vendidas rosas;
Entre as rosas vistosas, preciosas,
Falta uma branca rosa, preferida.

Meu olhar arrancou da rosa a vida,
Elevou-lhe, entre rosas valiosas.
Rosa eterna nos versos e nas prosas,
És como a rosa branca, a mais querida.

Elegi essa cor, dentre outras cores,
Prá provar grande amor que, às vezes, vem.
Que não podem trazer vermelhas flores,

Que nem podem querer comprar, também,
Porque, nessa avenida, os vendedores
Não darão seus amores prá ninguém.

SONHO ACORDADO

Sonhei teu grande amor ter encontrado.
Quando acordado, não acreditei
No corpo que avistei, ali, deitado,
Bem ao meu lado, como desejei.

Paraíso sem lei, por mar cercado;
Diante de um reinado imenso, o rei;
De desejo, eu fiquei desencontrado;
Fui tentado a sonhar, quando acordei.

Por demais te querer, te ter também -
Sentimento que, vez em quando, imponho,
Quando alguém já me torna mais risonho -

Tive a alegria, enfim, que poucos têm,
Ao ver um dia, ao lado do meu bem,
Um sonho, transformar-se em outro sonho.

SONHOS E TROVAS

Um grande sonhador quer acordar
No meio de um amor que faz sonhar
Prá, quando se deitar, sua alma em flor,
Desperto, ele sonhar com esse amor.

Quer mais um trovador, já quer cantar
Toda forma de amor que imaginar
Prá, quando a flor murchar e ele se for,
Seu canto inda ecoar, num sonhador.

Sonhos e trovas juntos na alegria
Que, um dia, plante fé no coração,
Ao sentimento amor, que principia,

Levando o sonhador à conclusão:
Paixão não sobrevive, sem poesia;
Poesia também morre, sem paixão.

O PERFUME

O amor, como o perfume, deixa indícios
De euforia em quem sente o seu odor;
Ambos dão alegria, ambos dão vício,
E mesmo os seus resquícios têm sabor.

Em tão pequenos frascos, benefícios;
Num coração ou vidro, tanto ardor;
Mas deves desfrutar sem desperdícios,
Seja perfume d'alma, seja amor.

Têm de todos os tipos prá agradar:
Um deles, quase eterno; outro, ligeiro.
Melhor é o que mais caro te custar,

Mas importa que seja verdadeiro
Pois, tendo um falso, logo há de notar
Que paixão não vai dar, com ou sem cheiro.

NATUREZA

Tens das pedras dureza; tens, agora,
Da noite que apavora, vã frieza.
A incerteza que tens, é de quem chora
Quando o amor vai embora; tens tristeza.

Tens, porém, chama acesa; vida aflora
Do teu peito, ó senhora; és natureza -
Da fauna, tens riqueza e quem te adora,
E da flora, bem mais, pois, tem beleza.

Só pareces não ter o dom vibrante,
O desejo constante de viver,
A grandeza de ser a cada instante,

Quando o mais importante é renascer.
Esse dom de manter a dor distante,
Em plantas e animais, vais perceber.

CEM PALAVRAS

Não pode ser você quem vejo aqui!
Sim, sou... Que bom te ver! Tempo passou,
Você cresceu... Você também mudou...
Por onde andou? Aí... Muito aprendi!

Por que voltou? Saudade deu de ti!
Não fale assim... É, sim... Quem me ensinou
O amor, nunca esqueci... por isso, estou
Aqui! Prá ter de volta o que perdi!

Anos depois... Pois é... Um dia, eu cá
Pensei, não voltará! Errei... Você
Deixou-me a dor, mas cri... Quem ama, crê!

Foi tanto o que sofri! Não sofrerá!
Se depender de ti... Mudei! Virá?
Vou... Sem palavras, já... Falar, prá quê?

JARDINEIRO

- Recita uma poesia para mim!
- Jardim! - o trovador já respondia -
tens do brilho das flores a alegria.
Em teu corpo, o perfume é de jasmim.

Lugar que eu regaria tanto assim,
Com luz e com paixão, e todo dia.
Para mim, nada mais importaria
Que ter tua beleza minha, ao fim.

Faria um paraíso em teu canteiro,
Se tu me concedesses um segundo,
Prá provar meu amor, que é verdadeiro.

Nessa doce empreitada, lá no fundo,
Eu seria o teu servo, um jardineiro...
O jardineiro mais feliz do mundo.

Fonte:
Sonetos

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