segunda-feira, 9 de maio de 2022

Altino Afonso Costa (Macucos I)


Chego à tarde de viagem por uma estrada poeirenta e olho o que resta da minha vila.

A velha Igreja Matriz de Santa Terezinha, outrora pintada de branco e hoje suja de terra escura levada pelo vento e o tropel do gado solto pela praça, antes protegida por paineiras frondosas. Paineiras e bancos toscos; saudade da infância e das ilusões perdidas mergulhadas no tempo.

Infância despreocupada com o futuro, amores de adolescentes, nas noites quentes e enluaradas daquele sertão.

Quantos poemas inspirados na loucura dos momentos que custavam a passar.

Velhos, jovens e crianças, conhecidos como se fizessem parte de uma só família.

Gente pioneira, desbravadores de sertões; plantadores de café, arroz, algodão, milho, feijão e criadores de gado.

Gente desiludida com a Revolução Paulista, temendo a terrível Captura, com a geada e a queimada indiscriminada do café para assegurar melhores preços em pleno Governo de Getúlio Vargas.

Homens e mulheres de mãos calejadas, frontes enrugadas pela ação do sol abrasador, faces marcadas pelo  tempo e pelo sofrimento.

O nascimento era um ato não desejado e a morte um lamento triste revivido no dia de finados.

Gente que veio de longe com o coração transbordando de esperança e fazia festejos com muita alegria, fogos de artifícios, quermesses e bailes em chão batido de terra, no barracão sustentado por bambus e coberto com encerados usados na lavoura.

Leilão de frangos, leitões e cabritos assados, muita bebida e agitação: Simples festa provinciana.

Assim o tempo passava. Mortes prematuras, velhos agonizantes.

Sepulturas modestas no cemitério cujo terreno fora doado pelo meu pai, numa esquina da Fazenda Santa Rosa.

O Joaquim farmacêutico era o clínico e o parteiro da população; figura gorda, bonachona, que nadava em pé nas correntezas do Rio Tibiriçá.

Luz precária gerada com motor diesel.

Posto telefônico local com gentil telefonista que demorava uma eternidade para completar uma ligação que não se ouvia.

Velhos amigos, velhas lembranças e grande vontade de chorar sobre as ruínas dessa vila que nos viu nascer, crescer e ficar homem.

Velha praça despedaçada, cercada de poucas casas, semidestruídas pela ação do tempo e pela pobreza do povo.

Macucos da minha infância, como posso esquecer-te? Vejo que fiquei velho como tu, vila dos meus amores...

E agora, cheio de espanto com a tua destruição, como posso deixar de chorar vendo-te assim, espelho da minha vida?

Fonte:
Altino Afonso Costa. Buquê de estrelas: crônicas e poemas. Paranavaí/PR: Olímpica, 2001.
Livro enviado por Dinair Leite.

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