quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Professor Garcia (Reflexões em Trovas) 14


A aurora, em seu esplendor,
no silêncio da alvorada...
Põe reticências de amor
nos versos da madrugada!
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A existência é dividida,
em partes bem desiguais:
Na infância, o esplendor da vida,
no ocaso, a explosão dos ais!
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Amo o silêncio da noite,
e as ondas sem vendavais,
quando a brisa em leve açoite
me leva de volta ao cais!
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A noite passa enfadonha;
na jangada, a cerração,
molha os sonhos de quem sonha
nos mares da solidão!
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Ao nosso amor, fiz a jura,
por ser do amor, tão devoto.
Mas da foto da moldura,
resta a moldura sem foto!
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Ao ver o fogo apagado,
eu vejo aos pés do fogão,
que os sonhos do meu passado
viraram cinza e carvão!!!
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A todo instante, eu medito,
sobre tudo que componho,
bordando um sonho bonito
com bordados de outro sonho!
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De um grande amor, não se prive
que, a solidão é bisonha;
nunca tem dó de quem vive
nem tem pena de quem sonha!
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De volta à tapera amada,
revi meus passos incertos,
ao ver a infância abraçada
a velhos braços abertos!
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Disseste adeus!... Que maldade!...
E, essa ausência, tão vazia,
virou um grão de saudade
que germina todo dia!
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Dói a saudade! ...E, entretanto,
a dor do teu triste adeus,
não cabe na dor do pranto
que rola dos olhos meus!
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É tarde, o vento murmura,
e, à noite, de alma indefesa,
põe um pouco de ternura
na solidão sobre a mesa!
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Eu busco nas horas plenas,
toda a essência que me acalma,
num verso, que diz apenas
que a trova também tem alma!
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Eu pensei voltar cantando
do meu chão de primavera!...
Mas chorei, por ver chorando
sombras na velha tapera!
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Foi machucando a lembrança,
de volta ao meu velho ninho,
que eu chorei feito criança
pisando o mesmo caminho!
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Há um pobre vulto na rua
que entre os trapos se agasalha;
por leito, os lençóis da lua
e os véus da noite grisalha!
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Moldei tua despedida,
nos versos que te compus,
mantendo a mesma medida
dos braços de tua cruz!
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Na dor da tarde morena,
há um lenço de rubra cor,
que toda tarde me acena
fingindo acenos de amor!
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Na foto, os meus desenganos!
É que a foto envelhecida,
mostra a maldade dos anos,
nos anos de minha vida!
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Naquela velha pracinha,
não tem quem conte as pegadas
de nós dois, toda tardinha,
caminhando de mãos dadas!
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No instante em que o Sol desmaia,
aos poucos, mantenho a calma,
a espera que a noite caia
trazendo paz a minha alma!
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No sonho, tudo se alcança;
e, o tempo, insano e arbitrário,
arbitra qualquer mudança
e molda tudo ao contrário!
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O entardecer, de mansinho,
em silêncio e, sem alarde,
toda tarde faz seu ninho,
no teto do fim da tarde!
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O rio, entre os seixos canta,
canção que é quase divina;
nem reclama da garganta,
nem erra e nem desafina!
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Ouço passos na janela,
que ao passado me transporta;
se não for os passos dela,
é de alguém no pé da porta!
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Para escapar da velhice,
tentei fugir pelos flancos;
mas percebi que é tolice,
pelos meus cabelos brancos!
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Por crer neste amor imenso,
de forma tão comedida,
é que sempre enfrento e venço
os maus presságios da vida!
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Qualquer rosa na janela,
de uma palhoça sem teto,
mostra o quanto a vida é bela
quando é cercada de afeto!
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Quando a ganância insensata,
destrói a mata florida,
depois de morta, ela mata
quem tirou-lhe a flor da vida!
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Relógio, por que tu choras,
se tens segundo a segundo,
os dedos cegos das horas
marcando as horas do mundo?!…
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Sem se queixar da pobreza,
na palhoça tão singela,
se faltasse o pão na mesa,
sobrava amor dentro dela!
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Se uma lágrima desaba,
quando é pura, nos ensina,
que a lágrima não se acaba
na fonte da alma divina!
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Só Deus, com saber profundo,
permite de forma ordeira,
que o Sol beba num segundo,
o orvalho da noite inteira!
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Teu bilhete apaixonado,
que alguém me entregou com medo,
esconde o nosso passado
e expõe o nosso segredo!
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Triste num canto da sala,
brilha uma velha candeia;
muda, em silêncio, não fala,
mas mostra a tristeza alheia!
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Um velhinho e uma criança,
são barcos em dois extremos:
Um com remos de esperança
outro à deriva e sem remos!
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Fonte:
Professor Garcia. Versos para refletir. Natal/RN: Trairy, 2021.
Livro enviado pelo trovador.

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