Quando a conheci era mesmo cheia de graça. Uma beleza original misturando traços exóticos num corpo perfeito que chamava a atenção de todos. Tão logo chegou à cidadezinha foi trabalhar no bar do Sr. Manoel, um velho português que se estabelecera na rua principal. O bar servia refeições, bebidas, salgados e doces e no fundo mantinha uma escondida casa de jogo.
Assim “Pedaço”, (assim a apelidaram, era mesmo um pedaço de mulher), começou então a conhecer um pouco da vida. Bonita, sorridente, andar provocante em que suas ancas largas se jogavam com elegância chamando a atenção de todos. Acho que na sua ingenuidade nem sabia o poder de sedução que tinha. Sr. Manoel era ranzinza e exigente e também parecia ter ciúmes dela uma vez que se sentia como seu “proprietário”. Na casa dos quase setenta ter ao lado uma mulher daquele porte era coisa rara.
Sempre alegre, saia cantando, servindo a clientela com um especial bom humor que contagiava o ambiente e atraia fregueses, além dos seus dotes culinários que prendiam pelo tempero e pelo paladar dos seus deliciosos quitutes. Com chuva ou sol lá estava ela brincando e fazendo piadas com todos que por ali passavam. Era quase inacreditável ver sempre a brancura do seu belo sorriso iluminado pelo seu olhar brilhante que provocava simpatia. Cantarolando, zombeteira cruzava a cidade fazendo suas piadas conquistando pelo seu poder da comunicação.
Certo dia apareceu no bar um homem de longe. Chamava Zé Carreteiro e dizem que tinha chegado lá das bandas da Bahia. Homem experiente transportava madeira e ficava na cidade hospedando-se na pensão ao lado do Bar do Portuga. A sua vida começou a mudar. Um forte relacionamento surgiu e Pedaço conheceu o amor. Entregou o seu coração ao Zé Carreteiro como também o seu corpo virgem cheio de tanta pureza.
Ele prometera tudo, casamento, casa, cobrindo-a de presentes baratos como perfumes e roupas do velho bazar da esquina. Tudo era novidade. Ela teria, vejam só, um marido. Sairia das rabugices do seu Manoel e iria viver uma vida de dama da sociedade além de viajar na boleia do caminhão e conhecer as estradas que tanta curiosidade lhe despertavam por que os casos do Zé a motivavam a sair mundo afora.
Caiu por amor totalmente apaixonada pelo parrudão do Zé, um baianão bem apresentado que levava todo mundo na conversa. Tinha boa lábia e uma prosa que encantava. Foi assim que ela se entregou. Passou a morar no quartinho da pensão e para acompanhar os carretos deixou o trabalho e saía toda feliz ao lado do Zé para onde o vento a levasse. Que vidão! Nunca pensou que teria tanta sorte.
O tempo foi passando e nada de casamento. Certo dia o Zé foi viajar sozinho. Disse para ela que teria que vazar o sertão da Paraíba e que ela ficasse esperando. Não deixaria de mandar sempre notícias. Pela madrugada tomou o rumo do Nordeste e partiu não se sabe para que destino. Pedaço ficou esperando. Os dias, as semanas, os meses. Ansiosa vivia de olho no posto de gasolina na esperança de ver o Zé chegar e apear da carreta trazendo de novo a alegria em seus braços. Só que o Zé não mais voltou e o seu coração foi murchando de saudade. Nunca mais sorriu, nem contou as suas pilhérias. Entristeceu de uma dor profunda e adoeceu. A saudade era tanta que Pedaço acabou consolando-se na bebida. O que lhe dava uma falsa coragem para prosseguir. Virava copos e nem podia trabalhar. Embriagada passava pelas ruas desleixada, sem cuidar da sua aparência. Até que foi encontrada no mesmo quartinho onde vivia com Zé, abraçada com o seu retrato. Havia morrido de tristeza, havia morrido de saudade. Deixara para sempre de ser Pedaço!
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