quinta-feira, 30 de maio de 2019

Caldeirão Poético XXII



DOROTHY JANSSON MORETTI
Três Barras/SC (1926 – 2017) Sorocaba/SP


Tempo


O tempo apaga um sonho já desfeito
na aridez de uma vida mal traçada,
uma paixão que se evolou do peito
como essência do frasco evaporada.

Tudo finda, como água já passada
que não retorna nunca mais ao leito:
do tempo que se foi não resta nada,
é verbo no pretérito perfeito.

Mas no incontido caminhar dos anos,
paciente, a transportar os desenganos,
ele ameniza o nosso sofrimento.

Lava que esfria e se transforma em rocha,
se algum desgosto ainda nos arrocha,
o tempo é o óleo bom… do esquecimento.

FRANCISCO NEVES MACEDO
Natal/RN, 1948 – 2012

Desistir, Jamais!


Escalava a montanha novamente…
E, alpinista de amor enlouquecido,
chegaria a um lugar desconhecido,
jamais imaginado pela mente.

Eu sentia o infinito a um batente,
e, jamais eu teria desistido!
Mas, por forças humanas, impedido…
- E a chegada tão perto, um pouco à frente.

Um grande sonhador, não fica triste,
de alcançar o ideal, jamais desiste,
quer sempre ir mais à frente, e, se cansado…

Ele tenta vencer o seu limite,
buscando o inalcançável, ele admite,
que se jamais chegar… Terá tentado!

GERSON CESAR SOUZA
São Mateus do Sul/PR

Extremos


Somos assim, estranhamente extremos,
gostos opostos, sonhos discrepantes,
somos canção de acordes dissonantes,
há divergência em tudo o que queremos…

Só defendemos pontos concordantes
até entender que não nos entendemos,
e esclarecendo aquilo que dissemos,
dizemos sempre coisas conflitantes…

Tu, me querendo, dizes que eu não presto,
e ao te querer, sempre de ti reclamo,
mas tu me chamas, disfarçando o gesto,

e entre protestos eu também te chamo,
pois, mesmo amando tudo o que eu detesto,
tu és na vida aquilo que eu mais amo!


JOÃO JUSTINIANO DA FONSECA
Rodelas/BA, 1920 – 2016, Salvador/BA

O Soneto Moderno


O soneto renasce, e a todo pano,
transita pelos mares da poesia.
é clássico ou moderno, em confraria,
navega ao vento norte ou ao minuano.

É discriminação e puro engano,
dizer que a rima é velha e sem valia.
O belo é sempre belo, na poesia,
na pintura, na música… E que dano

causa o antigo teatro, o enceno, a mímica,
que afaga o espírito e ilumina a química,
do riso alegre, da tranquilidade?

Renascendo o acadêmico soneto,
traz um sentido novo, e, em branco e preto,
tem gosto e aroma de modernidade!

RAUL DE LEONI
Petrópolis/RJ, 1895 – 1926

História Antiga

No meu grande otimismo de inocente,
Eu nunca soube por que foi… um dia,
Ela me olhou indiferentemente,
Perguntei-lhe por que era… Não sabia…

Desde então transformou-se de repente
A nossa intimidade correntia
Em saudações de simples cortesia
E a vida foi andando para a frente…

Nunca mais nos falamos… vai distante…
Mas, quando a vejo, há sempre um vago instante
Em que seu mudo olhar no meu repousa,

E eu sinto, sem no entanto compreendê-la,
Que ela tenta dizer-me qualquer cousa,
Mas que é tarde demais para dizê-la…

SYLVIO VON SÖHSTEN GAMA
Maceió/AL, 1923 – 2013

Abandonei


Abandonei a infância,
ainda cedo,
porque me fiz precoce.

Abandonei a adolescência
na excelência
de seu pleno gozo,
porque ao meu destino quis dar posse.

Abandonei a luta pela vida
quando senti cansaço.
E quanto a esta velhice?
Que é que eu faço?
Se a abandono…
Da vida passo.

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