segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Malba Tahan (O Domador de Elefantes)


Evita o iracundo; afasta-te do homem colérico.
Salomão, Provérbios, 22, 24.


Na décima quinta página do livro Yu-King poderás ler, ó Irmão dos árabes, a singular aventura ocorrida na Índia com um domador de elefantes.

Vamos traduzi-la com a maior fidelidade, seguindo, nas linhas e nas entrelinhas, o pensamento do velho sacerdote budista que a escreveu. No antigo paix (pequeno domínio) de Carvásti, para além do Ganges, o rá (rei, senhor) Lauit anunciou ao povo que precisava, com certa urgência, de um domador de elefantes.

Apresentou-se um homem chamado Sougraha, que se dizia perito nesse perigoso ofício.

— Conheço, ó rei — declarou Sougraha —, três maneiras seguras por meio das quais será fácil domesticar um elefante. A primeira é pelas argolas de prata…

— Está bem — acudiu secamente o monarca. — Aceito a tua oferta. Poderás amanhã, depois da prece, iniciar o teu trabalho. O elefante bravio, de minha predileção, será trazido para o pátio. Terás, no fim, uma boa recompensa.

Momentos depois, ao deixar o palácio, o vaidoso Sougraha passou ao lado de um grupo de servos e um destes proferiu um gracejo qualquer. Não se conteve o domador; avançou impetuoso, colérico, contra o jovem e feriu-o gravemente.

Preso pelos guardas, foi o agressor conduzido à presença do rei.

— Que foi isso, meu amigo? — interpelou, muito sério, o monarca. — Que se passou, afinal?

— Senhor — respondeu Sougraha, com tremores na voz. — Não poderei ocultar a verdade. Ao sair deste palácio, depois da audiência, cruzei, na escada, com um grupo de servos. Um destes dirigiu-me uma pilhéria. Não me contive. Avancei, de golpe, contra o gaiato e castiguei-o com extrema violência. Foi tudo, confesso, obra irrefletida do impulso de um momento.

Ponderou, então, o rei, serenamente, com intencional frieza:

— Como pretendes, ó Sougraha, domesticar um elefante bravio, se não és capaz de conter a fera odienta que vive dentro de ti? Aprende, primeiro, meu amigo, a dominar os teus impulsos, o teu gênio, a tua cólera.

E, numa decisão irrevogável, concluiu:

— Retira-te! Não mais me interessa a tua colaboração. Educa-te primeiro, para que possas, depois, educar.

Fonte:
Malba Tahan. Novas Lendas Orientais. RJ: Record, 2013.

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