Nota do Blog:
Infelizmente há na internet sonetos que não obedecem às regras obrigatórias próprias a eles. Quando os poetas quebram as regras, o soneto deixa de ser soneto, assim como em outros gêneros poéticos que exigem regras, como por exemplo a trova, que quando não segue a sua estrutura de 4 versos de sete sílabas poéticas, com sentido completo e claro, pode ter outra denominação, mas com certeza ao se denominar trova está incorreto.
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Como todos devem saber – existem dois estilos de poesia: a de composição livre, sem ser subordinada a qualquer norma e a de composição tradicional metrificada, condicionada às suas regras. São dois estilos independentes com suas subdivisões e como aqui vamos tratar exclusivamente dum segmento metrificado – isto é, do soneto – somos forçados a deixar a composição livre à parte. Portanto, vamos falar de soneto? Normalmente, o adepto de tal estilo é rigoroso, preservando-o em suas formas originais e fixas, pois, havemos de considerar que, se partirmos para versos livres estaremos invadindo o estilo oposto – portanto, uma incoerência.
Há muitas controvérsias sobre sua origem que surgiu lá pelo século XII e, embora não tenha sido seu criador, fortaleceu-se e tomou forma própria a partir do italiano Francesco Petrarca (1304/1374) – o modelo petrarquiano. Da Itália, viajou para outros países e na Inglaterra se transformou em soneto inglês, quando foram alteradas somente a colocação de seus quatorze versos – o modelo shakespeariano.
Alguém já disse que o soneto é “a sedução do cárcere” mas eu diria que é “o cárcere da sedução”, pois, conforme o poeta contemporâneo Paulo Bonfim (sagrado o ”príncipe dos poetas brasileiros” em 1991): “ Para muitos, o soneto é inibidor, mas eu acho que é a prova de fogo do poeta. Não considero o soneto o espartilho da poesia”.
Majo & Machado em seu site define muito bem o soneto em relação às suas regras rígidas, comparado-o com o vinho, essa bebida natural e original: “se servido puro, é vinho; se misturado com água e açúcar, é refresco.” Nada mais lógico e racional.
Alguns pretendem modernizá-lo, como tentou o poeta Augusto Frederico Schmidt, mas Vasco de Castro Lima já alertava que um poema de quatorze versos poderá ser muito poético, mas se não respeitar suas regras rígidas, poderá ser tudo, menos um soneto.
E por que a divergência ? Convenhamos – a beleza do soneto está em sua forma sucinta, elevada, concisa e exclusiva, pois cada estilo de poesia tem suas peculiaridades e maneira diferente de desenvolvê-la. Assim, no segmento metrificado, a trova tem suas regras básicas; o haicai outras diferentes; o ovillejo as suas e assim por diante em função de cada estrutura. Se fugisse das regras, a trova perderia seu valor se transformando numa simples quadrinha – assim é o soneto.
Esmiuçar as regras e a nomenclatura do soneto talvez seja um pouco longo, o que faremos, gradativamente, numa próxima vez. Para adiantar diria somente que é um poema de quatorze versos – dois quartetos e dois tercetos – rimando os dois quartetos e, com rimas diferentes, os dois tercetos.
texto de João Roberto Gullino (Site Casa Raul de Leoni)
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SONETOS IMORTAIS, por J. G. de Araújo Jorge
Todos os sonetos citados nesta crônica encontram-se na minha antologia
“Os mais Belos Sonetos Que o Amor Inspirou”. Volume I – Poesia Brasileira.
Na história da literatura brasileira temos o fato curioso de três grandes poetas que se celebrizaram apenas com um livro: Augusto dos Anjos, com “Eu e Outras Poesias”, Raul de Leoni, com “Luz Mediterrânea”, e Moacir de Almeida, com “Gritos Bárbaros”. Eu acrescentaria um nome bem mais recente, cuja obra “Cânticos Bárbaros”, mereceu em 1934 o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras: trata-se de Mário Cruz, que vive em Petrópolis, e é técnico do Museu Imperial.
Por acaso, são todos poetas de minha predileção, em que pese à diversidade de estilos e temperamentos, ou justamente por isso. Mas, do mesmo modo que há escritores de um único livro, ou que se consagraram por uma de suas obras, há, entre os poetas, os que se celebrizaram apenas por um poema, um soneto.
O exemplo clássico é o de Felix Arvers, autor de “Mês Heures Perdues”, e que teria mergulhado no mais completo anonimato não fosse o seu famoso soneto inspirado por Marie Nodier. Só em língua portuguesa há cerca de 200 traduções conhecidas.
No Brasil há alguns casos mais ou menos semelhantes. Autores de sonetos célebres, ou que se celebrizaram por um soneto, mas com muitas outras produções de valor pelo menos idêntico ao do trabalho consagrado. São por demais citados Bilac com o seu “Ouvir Estrelas”; Raimundo Correia, com “As Pombas” e “Mal Secreto”, e Machado de Assis, com “Carolina”. Carlos Ribeiro, o mercador de livros, me referiu que, às vezes, entram porta adentro de sua livraria e lhe perguntam à queima-roupa:
O senhor tem aí a “Carolina”, de Machado de Assis?
(hoje há outra “Carolina” concorrendo com a de Machado de Assis: a do Chico Buarque de Holanda, poeta moço, que ainda se dá ao luxo de música nos belos poemas que compõe).
Citemos outros: Raul de Leoni está nos álbuns, nos recitais, na memória do povo, cada vez mais, com aquele soneto que não incluiu em sua obra, e que é apresentado ora com o título de “Perfeição”, ora com o título de “Argila”. Eu prefiro “Perfeição”. Quem não será capaz de dize-lo?
Infelizmente há na internet sonetos que não obedecem às regras obrigatórias próprias a eles. Quando os poetas quebram as regras, o soneto deixa de ser soneto, assim como em outros gêneros poéticos que exigem regras, como por exemplo a trova, que quando não segue a sua estrutura de 4 versos de sete sílabas poéticas, com sentido completo e claro, pode ter outra denominação, mas com certeza ao se denominar trova está incorreto.
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Como todos devem saber – existem dois estilos de poesia: a de composição livre, sem ser subordinada a qualquer norma e a de composição tradicional metrificada, condicionada às suas regras. São dois estilos independentes com suas subdivisões e como aqui vamos tratar exclusivamente dum segmento metrificado – isto é, do soneto – somos forçados a deixar a composição livre à parte. Portanto, vamos falar de soneto? Normalmente, o adepto de tal estilo é rigoroso, preservando-o em suas formas originais e fixas, pois, havemos de considerar que, se partirmos para versos livres estaremos invadindo o estilo oposto – portanto, uma incoerência.
Há muitas controvérsias sobre sua origem que surgiu lá pelo século XII e, embora não tenha sido seu criador, fortaleceu-se e tomou forma própria a partir do italiano Francesco Petrarca (1304/1374) – o modelo petrarquiano. Da Itália, viajou para outros países e na Inglaterra se transformou em soneto inglês, quando foram alteradas somente a colocação de seus quatorze versos – o modelo shakespeariano.
Alguém já disse que o soneto é “a sedução do cárcere” mas eu diria que é “o cárcere da sedução”, pois, conforme o poeta contemporâneo Paulo Bonfim (sagrado o ”príncipe dos poetas brasileiros” em 1991): “ Para muitos, o soneto é inibidor, mas eu acho que é a prova de fogo do poeta. Não considero o soneto o espartilho da poesia”.
Majo & Machado em seu site define muito bem o soneto em relação às suas regras rígidas, comparado-o com o vinho, essa bebida natural e original: “se servido puro, é vinho; se misturado com água e açúcar, é refresco.” Nada mais lógico e racional.
Alguns pretendem modernizá-lo, como tentou o poeta Augusto Frederico Schmidt, mas Vasco de Castro Lima já alertava que um poema de quatorze versos poderá ser muito poético, mas se não respeitar suas regras rígidas, poderá ser tudo, menos um soneto.
E por que a divergência ? Convenhamos – a beleza do soneto está em sua forma sucinta, elevada, concisa e exclusiva, pois cada estilo de poesia tem suas peculiaridades e maneira diferente de desenvolvê-la. Assim, no segmento metrificado, a trova tem suas regras básicas; o haicai outras diferentes; o ovillejo as suas e assim por diante em função de cada estrutura. Se fugisse das regras, a trova perderia seu valor se transformando numa simples quadrinha – assim é o soneto.
Esmiuçar as regras e a nomenclatura do soneto talvez seja um pouco longo, o que faremos, gradativamente, numa próxima vez. Para adiantar diria somente que é um poema de quatorze versos – dois quartetos e dois tercetos – rimando os dois quartetos e, com rimas diferentes, os dois tercetos.
texto de João Roberto Gullino (Site Casa Raul de Leoni)
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SONETOS IMORTAIS, por J. G. de Araújo Jorge
Todos os sonetos citados nesta crônica encontram-se na minha antologia
“Os mais Belos Sonetos Que o Amor Inspirou”. Volume I – Poesia Brasileira.
Na história da literatura brasileira temos o fato curioso de três grandes poetas que se celebrizaram apenas com um livro: Augusto dos Anjos, com “Eu e Outras Poesias”, Raul de Leoni, com “Luz Mediterrânea”, e Moacir de Almeida, com “Gritos Bárbaros”. Eu acrescentaria um nome bem mais recente, cuja obra “Cânticos Bárbaros”, mereceu em 1934 o Prêmio de Poesia da Academia Brasileira de Letras: trata-se de Mário Cruz, que vive em Petrópolis, e é técnico do Museu Imperial.
Por acaso, são todos poetas de minha predileção, em que pese à diversidade de estilos e temperamentos, ou justamente por isso. Mas, do mesmo modo que há escritores de um único livro, ou que se consagraram por uma de suas obras, há, entre os poetas, os que se celebrizaram apenas por um poema, um soneto.
O exemplo clássico é o de Felix Arvers, autor de “Mês Heures Perdues”, e que teria mergulhado no mais completo anonimato não fosse o seu famoso soneto inspirado por Marie Nodier. Só em língua portuguesa há cerca de 200 traduções conhecidas.
No Brasil há alguns casos mais ou menos semelhantes. Autores de sonetos célebres, ou que se celebrizaram por um soneto, mas com muitas outras produções de valor pelo menos idêntico ao do trabalho consagrado. São por demais citados Bilac com o seu “Ouvir Estrelas”; Raimundo Correia, com “As Pombas” e “Mal Secreto”, e Machado de Assis, com “Carolina”. Carlos Ribeiro, o mercador de livros, me referiu que, às vezes, entram porta adentro de sua livraria e lhe perguntam à queima-roupa:
O senhor tem aí a “Carolina”, de Machado de Assis?
(hoje há outra “Carolina” concorrendo com a de Machado de Assis: a do Chico Buarque de Holanda, poeta moço, que ainda se dá ao luxo de música nos belos poemas que compõe).
Citemos outros: Raul de Leoni está nos álbuns, nos recitais, na memória do povo, cada vez mais, com aquele soneto que não incluiu em sua obra, e que é apresentado ora com o título de “Perfeição”, ora com o título de “Argila”. Eu prefiro “Perfeição”. Quem não será capaz de dize-lo?
Nascemos um para o outro, desta argila
de que são feitas as criaturas raras,
tens legendas pagãs nas carnes claras
e eu trago a alma dos faunos na pupila…”
de que são feitas as criaturas raras,
tens legendas pagãs nas carnes claras
e eu trago a alma dos faunos na pupila…”
Mário Pederneiras, poeta carioca, cantor de sua cidade, hoje quase esquecido, ficou com seu “Suave Caminho”, de um lirismo envolvente:
“Assim, ambos assim, no mesmo passo…”
E o final:
“Placidamente pela vida iremos
calçando mágoas, afastando espinhos,
como se a escarpa desta vida fosse
o mais suave de todos os caminhos…”
calçando mágoas, afastando espinhos,
como se a escarpa desta vida fosse
o mais suave de todos os caminhos…”
Nilo Bruzzi, o biógrafo de Casimiro de Abreu e Júlio Salusse, romancista e poeta conquistou seu lugar com um único soneto: “Única”. Pelos primeiros versos vocês se lembrarão logo:
“No turbilhão da vida cotidiana
há sempre oculto um rosto de mulher…”
há sempre oculto um rosto de mulher…”
Há outro poeta que não deixou sequer livro publicado, cearense, falecido em 1941, cujas poesias ficaram esparsas por jornais e revistas de sua terra: o Padre Antônio Tomás. Seu soneto “Contraste” é uma página que traz a marca da perenidade. Canta o poeta: “Quando partimos, no vigor dos anos,/ da vida, pela estrada florescente,/ as esperanças vão conosco à frente/ e vão ficando atrás os desencantos…” Mais tarde, no entanto, conclui: “Nós enxergamos claramente/ quando a existência é rápida e fugaz,/ e vemos que sucede exatamente/ o contrário dos tempos de rapaz:/ os desenganos vão conosco à frente/ e as esperanças vão ficando atrás!”
Julio Salusse, “o último Petrarca brasileiro”, apaixonado pela sua Laura, filha do Conde de Nova Friburgo, criou a imagem do amor eterno com o soneto “Cisnes”. Ainda hoje figura em todos os cadernos de poesia:
“A vida, manso lago azul, algumas
vezes, algumas vezes mar fremente,
tem sido para nós, constantemente,
um lago azul sem ondas nem espumas…”
vezes, algumas vezes mar fremente,
tem sido para nós, constantemente,
um lago azul sem ondas nem espumas…”
Alceu Wamosy, gaúcho, que morreu pelejando, com apenas 28 anos, imortalizou-se com os quatorze versos de “Duas Almas”. Quem não os sabe de cor?
“Ó tu que vens de longe! Ó tu que vens cansada
entra, e sob o meu teto encontrarás carinho:
eu nunca fui amado, e vivo tão sozinho,
vives sozinha sempre, e nunca foste amada…”
entra, e sob o meu teto encontrarás carinho:
eu nunca fui amado, e vivo tão sozinho,
vives sozinha sempre, e nunca foste amada…”
Da mesma maneira, Da Costa e Silva, do outro extremo do Brasil, poeta piauiense, está na memória da gente, com o soneto “Saudade”, cujo terceto final ressoa como uma balada de sino:
“Saudade! O Paraíba, velho monge
as barbas brancas alongando… E ao longe
o mugido dos bois da minha terra…”
as barbas brancas alongando… E ao longe
o mugido dos bois da minha terra…”
Quero encerrar, entretanto, esta crônica, com uma surpresa para vocês. Vou apresentar-lhes um soneto inteiramente desconhecido. Recebi-o de um amigo, num velho recorte sem data, já amarelecido, do “Correio da Manhã”, e certamente o incluirei na 3ª edição de minha antologia “Os Mais Belos Sonetos que o Amor inspirou”. O nome do poeta? Otávio Rocha. Não o conheço; nunca encontrei seu nome em qualquer citação. Mas arrisco-me a vaticinar-lhe a celebridade à proporção que se der a divulgação do soneto. Ei-lo na íntegra:
ROMANCE
“Venha me ver sem falta… Estou velhinha.
Iremos recordas nosso passado;
a sua mão quero apertar na minha
quero sonhar ternuras ao seu lado…”
Respondi, pressuroso, numa linha:
“Perdoe-me não ir… ando ocupado.
Ameia-a tanto quanto foi mocinha
e de tal modo também fui amado.
Passou a mocidade num relance…
Hoje estou velho, velha está… Suponho
que perdeu da beleza os vivos traços.
Não quero ver morrer nosso romance…
Prefiro tê-la, jovem no meu sonho,
do que, velha, apertá-la, nos meus braços!
“Venha me ver sem falta… Estou velhinha.
Iremos recordas nosso passado;
a sua mão quero apertar na minha
quero sonhar ternuras ao seu lado…”
Respondi, pressuroso, numa linha:
“Perdoe-me não ir… ando ocupado.
Ameia-a tanto quanto foi mocinha
e de tal modo também fui amado.
Passou a mocidade num relance…
Hoje estou velho, velha está… Suponho
que perdeu da beleza os vivos traços.
Não quero ver morrer nosso romance…
Prefiro tê-la, jovem no meu sonho,
do que, velha, apertá-la, nos meus braços!
Aí está, o mais velho e o mais belo dos temas, renovado sempre na poesia e no sonho de um poeta.
continua...
Fonte:
Crônicas de JG de Araujo Jorge extraído do livro ” No Mundo da Poesia ” Edição do Autor -1969
Crônicas de JG de Araujo Jorge extraído do livro ” No Mundo da Poesia ” Edição do Autor -1969
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