domingo, 3 de outubro de 2021

Minha Estante de Livros (Uma Breve História da Literatura, de Johm Sutherland)


De Homero ao e-book
A literatura – formada pela tríade narrativa, lírica e drama – é a um só tempo forma de expressão e arte; fruto de sua época e de gênios individuais; testemunho de momentos históricos e devaneio fantástico.

Na literatura, tudo é possível: sereias, vampiros, um narrador morto ou um personagem que rejuvenesce à medida que o tempo passa. É, em última análise, a mente humana no auge de seu talento para expressar e interpretar o mundo ao nosso redor.

Neste livro genial, o britânico John Sutherland aceitou o quase insano desafio de abordar, num volume curto e acessível, todo o espectro temporal da literatura, desde os tempos da mitologia transmitida de forma oral até os dias de hoje. E – sorte nossa! – a tarefa é desempenhada primorosamente. 
 
O autor segue (mais ou menos) cronologicamente não só os principais nomes e acontecimentos da literatura de língua inglesa, mas também da literatura universal. Assim, saímos das epopeias para em seguida passar pela tragédia na Grécia antiga, as formas literárias medievais, o advento da imprensa com Gutenberg, o teatro elisabetano e Shakespeare, por obras que prenunciavam o romance (Decameron, Gargântua e Pantagruel, Dom Quixote), a formação de um público leitor feminino que revolucionaria o mercado; a invenção dos direitos autorais; a literatura do século XX, com a experiência radical de duas guerras mundiais e seus reflexos (Woolf, Joyce, Kafka, Eliot; Beckett e o teatro do absurdo); o realismo mágico; as histórias em quadrinhos e a graphic novel. Sutherland não larga a pena ao chegar no século XX; trata de autores contemporâneos experimentais, do mercado editorial de hoje e suas premiações, de gêneros surgidos via internet, como a fanfiction, e dos caminhos que a literatura ainda poderá trilhar.

Ao contrário do que se poderia esperar, Uma breve história da literatura é isento de dogmatismos: o autor não decreta o que o leitor deve ler; antes, mostra-se um entusiasta de que a literatura, esta multifacetada criação do gênio humano, seguirá – na forma, no gênero e no suporte que for – enriquecendo nossas breves existências.
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John Sutherland é professor emérito de Literatura de Língua Inglesa Moderna na University College London, colaborador do The Guardian e especialista em literatura vitoriana e do século XX e na história do mercado editorial. Já lecionou para estudantes de todas as faixas etárias, e é autor e editor de mais de vinte livros.
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Trechos do Livro

Toda obra de literatura, por mais humilde que seja, em Aguin nível está perguntando: "Qual é o sentido disso tudo? Por que estamos aqui?". Filósofos e ministros da religião e cientistas respondem a essas perguntas a seu próprio modo. Na literatura, é a "imaginação" que encara essas perguntas básicas.

[…] Uma grande obra de literatura nunca deixa de nos dar algo, qualquer que seja o momento de sua vida em que você a leia, e seja lá de que fonte ela venha.

[…] A literatura nos distrai da tarefa real de viver. (p. 13)

[…] Por que ler literatura? Porque ela enriquece a vida de maneiras que não encontramos em nada mais. Ela nos torna mais humanos. E quanto melhor aprendermos a lê-la, tanto melhor ela fará isso. (p. 14)

[…] Criar mitos faz parte da nossa natureza. Diz respeito a quem somos enquanto seres humanos.

[…] Um modo, então, de pensar sobre o mito é que ele extrai um sentido da falta de sentido na qual, enquanto seres humanos, nós todos nos encontramos. Por que estamos aqui, e estamos aqui "para" quê? Normalmente, o mito fornece uma explicação através de histórias (a espinha dorsal da literatura) e símbolos (a essência da poesia). (...) Mas você precisa, de alguma maneira, "dar sentido" ao fenômeno. (p. 16)

A palavra "épico" é usada hoje em dia para tudo, mas com bas­tante indefinição. […] Ela descreve um conjunto de textos muito seleto, muito antigo, que carrega valores cujo tom é "heroico" ("heroico" sendo outra palavra que tendemos a usar com indefinição excessiva). Ela mostra o gênero humano, podemos dizer, em seu aspecto mais másculo. (O preconceito de gênero é, infelizmente, apropriado: uma "heroína épica" é quase sempre uma contradição em termos.)

[…] Quando pensamos a sério sobre epopeias, somos defrontados por uma pergunta intrigante. Se essa é uma literatura tão fantástica, por que hoje não a escrevemos mais? Por que não a escrevemos (com êxito, pelo menos) há vários séculos? A palavra ainda está conosco; a literatura, por algum motivo, não está. (p. 22)


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