Na década de 60, por intermédio de Américo Bolonha, renomado jornalista e chefe das oficinas de "A Gazeta", travei conhecimento com quem, anos depois, teria a felicidade de conviver profissionalmente - Judas Isgorogota, jornalista ativo e intelectual de rara sensibilidade e poeta dos mais inspirados dentre os que valorizam a literatura nacional.
Judas Isgorogota nasceu em Lagoa da Canoa, município de Iraipu, no estado de Alagoas, no dia 15 de setembro de 1901. Seu nome de batismo Agnelo Rodrigues de Melo. Faleceu em 10 de janeiro de 1979, aos 77 anos.
O motivo de ter adotado o pseudônimo de Judas Isgorogota é que, ao publicar o seu primeiro soneto, "Madrepérolas", como Rodrigues de Melo, surgiu um homônimo poeta menor que o acusou de assim assinar para criar confusão e que de má fé queria tirar proveito próprio. Bastante aborrecido, apressou-se Agnelo em arranjar outro nome literário.
Tendo um irmão chamado Messias, que era desenhista e ilustrador gráfico e que pelo menos por três décadas se notabilizou em todo o país, Agnelo decidiu: já que existe um Messias na família, vai também existir um Judas.
O nome lembra o apóstolo da traição - Judas Isgorogota - assim chamado por ter nascido no povoado de Kareoth. Ao invés de Iscariotes criou a corruptela de Isgorogota.Com esse pseudônimo, Agnelo Rodrigues de Melo sagrou-se um dos maiores poetas do século XX do Brasil.
Judas Isgorogota era sério e rigoroso, mas também tinha suas sacadas de humor. Vamos a uma delas; nós tínhamos um colega na Rádio Gazeta, rico em virtudes intelectuais, mas... cujos dotes morais não correspondiam ao seu douto-saber; procurava obter vantagens financeiras entre o grupo e Judas, quase que desculpando o colega que se retirava, comentou: – Sabem, fulano tem 11 filhos e vive em constante apuro financeiro. A melhor coisa que se tem a fazer é não emprestar dinheiro pra ele porque, se for pouco, ele esquece e, se for muito, não tem como pagar...
Em outra ocasião, em noite de garoa de inverno paulistano, Judas não parava de tossir. Naquele momento estava na redação o jornalista médico Monteleone, que também ocupava cargo na direção do jornal. Doutor Monteleone prescreveu uma receita para dar fim à tosse do seu ilustre colega. Judas Isgorogota guardou o papel em um dos bolsos. Antes de passar na farmácia, saímos da redação na Av. Cásper Libero e fomos em grupo, Judas, Monteleone, este que vos narra o fato e outros companheiros de imprensa tomar um cafezinho num bar da rua Antonio de Godói. No primeiro gole, Monteleone engasgou-se sendo acometido de forte tosse.
Judas comentou, assim que o médico saiu: - Vou jogar fora este papel por que, afinal, se o doutor não consegue curar a si mesmo, com que autoridade me passou esta receita?
Muito poderia dizer sobre Judas Isgorogota, mas encerro aqui reverenciando a memória desse Judas que, em contra oposição ao nome, jamais traiu alguém e muito enobreceu o mundo das letras nacionais.
Fonte:
Cláudio de Cápua. Retrovisor: crônicas. Publicado em Santos/SP, pela Editora Mônica Petroni Mathias, 2021.
Livro enviado pelo autor.
Cláudio de Cápua. Retrovisor: crônicas. Publicado em Santos/SP, pela Editora Mônica Petroni Mathias, 2021.
Livro enviado pelo autor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário