A COBRA E A RÃ
Junto à lagoa
coaxa a rã;
seu canto entoa
toda manhã!
- A vida é boa,
se é livre e sã.
E a voz ressoa
num doce afã!
O canto escuta
a cobra astuta
do pantanal...
Quem manda a rã,
toda manhã,
cantar tão mal?
Assim dizia um sábio de renome:
- o canto desagrada a quem tem fome!
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DEFESA PRÉVIA
Eu, sei de mim, culpa nenhuma tenho
em tudo que se faz contra a justiça,
pois só do meu trabalho me mantenho,
sem ter direito aos ócios da preguiça!
Puro não sou, nem faço disso empenho,
pois puro ninguém é na humana liça.
Creio num Deus real, morto no lenho,
e não nos deuses falsos da cobiça.
Em prol de um mundo bom, Justo e Perfeito,
herói da Fé, soldado do Direito,
espadachim serei, já que sou Athos.
E ao ver da turba as faces carrancudas,
não venderei meu Mestre, como Judas,
nem lavarei as mãos, como Pilatos!
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DORES
Por mais que eu descreva a dor que sinto,
jamais a entenderás corretamente,
pois cada ser humano é um ser distinto
e só quem sofre sabe a dor que sente!
Por força natural do próprio instinto,
que desde a madre rege o ser vivente,
da dor que te doer me não ressinto,
nem tu, também, da dor que me atormente!
Isto, afinal, é muito humano e justo.
Ninguém dos nossos bens concorre ao custo,
nem do mal que sofremos se arreceia...
Pois no egoísmo própria a toda gente,
por pequena que seja a dor que sente
sempre a julga maior que a dor alheia!
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PAPAI NOEL
Papai Noel! Lindo sonho
de deslumbrante matiz.
Velho treteiro e bisonho
que vem de um frio país!
Ao rico atende, risonho,
mas nunca à pobreza quis.
Deixa um menino tristonho
e outro alegre e feliz!
Papai Noel, sempre injusto,
só traz presentes de custo
para os filhos da riqueza...
Quanto aos pobres não se importa!
- Sapatos rotos na porta,
pratos vazios na mesa!
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SAPATO VELHO
Hoje encontrei na rua desprezado
um sapato já velho e carcomido,
que foi, talvez por velho, preterido,
depois de um bom serviço ter prestado.
Aliás, o pobre estava bem rasgado...
Mas mui belo talvez tivesse sido.
Talvez em muita festa houvesse ido
no seu tempo de moço e conservado.
Olhei-o com desprezo e fui passando...
Mas depois, sobre o mesmo meditando,
consegui deduzir esta tolice:
Que tal como o sapato, a humanidade
tem riso e tem fulgor na mocidade,
mas só pranto e tristeza na velhice!
Fontes:
Athos Fernandes. Miscelânea Poética. 1979.
Athos Fernandes. Ofir. 1977.
Athos Fernandes. Shangri-La: Poesias. 1979.
Athos Fernandes. Miscelânea Poética. 1979.
Athos Fernandes. Ofir. 1977.
Athos Fernandes. Shangri-La: Poesias. 1979.
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