segunda-feira, 14 de novembro de 2022

Contos e Lendas do Mundo (Nação Sioux: Unktomee e o Alce)


"Conte-nos outra história de Unktmee, vovozinho!", gritaram muitas das crianças assim que ingressaram na tenda do velho contador de histórias naquela décima noite.

"Ah, eu imaginei que me pediriam outra!", observou com satisfação o velhote. "Existem muitas histórias de suas arteirices com o povo animal. Ele adora ficar entre todos até mesmo chega a roubar-lhes a aparência. Com isso pode fazer muitos deles de tolos com facilidade. Isto funciona muito bem por um tempo, mas geralmente não demora muito para ele gritar: "Basta!"

UNKTOMEE E O ALCE

Era o solstício de verão, o povo Alce estava banquenteando-se na encosta da montanha. Pele lisa, gorduchos e bonitos, eles pastavam aqui e ali os brotos suculentos e as gostosas ervas, bebiam no córrego da montanha e deitavam-se para descansar sossegadamente e amenizar o calor do dia à sombra verde das árvores.

Unktomee, que havia viajado desde longe estava faminto e sentia os pés doloridos, olhava para eles com muita inveja.

"Ah!", disse para si mesmo, "esta é a vida que eu quero ter! Certamente, este é o povo mais feliz na face da Terra, eles têm tudo em abundância e são tão velozes que para eles é como se o perigo não existisse!"

Ele escondeu o seu arco e o alforje cheio de flechas no oco de uma árvore juntamente com a roupa e outras armas que trazia para assim parecer despojado e inofensivo diante do tímido povo Alce. E lá foi ele. Viram que estava desarmado e permaneceram tranquilos.

"Chegou Unktomee", sussurraram eles sem muita certeza entre si.

"Ah, irmãos!", apelou ele, "vocês têm o bastante; vivem em paz com as outras tribos; contemplam do alto todo o vale e todos os outros habitantes que vivem embaixo! Ninguém é tão feliz quanto vocês! Será que nâo poderiam me tornar um de vocês?"

"Amigo!", exclamou o líder, "você não sabe o que está pedindo! Para ser exato, agora estamos no solstício do verão, nossas roupas e nossas únicas armas, os chifres, são novos; sim, há comida em abundância e parecemos felizes, porém nossos chifres ainda estão fracos e o Lobo e o Gato Selvagem estão prontos e não temem nos atacar. Nossa única esperança de escapar está em nossa rapidez, pois durante todo o dia somos vigiados pelos olhos cruéis daqueles que vivem de carne, e destes o mais perigoso é o Homem!"

"Sei de tudo isto", replicou Unktomee, "outros talvez possuam armas mais poderosas do que as suas, mas não vejo ninguém com a vossa beleza, vossa dignidade, vossa liberdade e vossa facilidade de viver. Eu imploro que me permitam partilhar de vosso mundo!"

"Se você passar no teste, nós o admitiremos!", disseram-lhe finalmente. "Observe nossos olhos — temos de permanecer sempre vigilantes; nossos ouvidos — eles estão constantemente em guarda! Pode você sentir o cheiro de um inimigo até mesmo na direção contrária ao vento? Pode você detectar o som de seus passos antes que esteja próximo?"

Unktomee passou no teste e foi decididamente admitido na Sociedade dos Alces; na verdade, ele acabou nomeado chefe do grupo, e isso era o que ele tanto queria.

"Agora", eles disseram, "nós o fizemos nosso líder. Portanto, você precisa nos guiar para que estejamos a salvo dos caçadores!"

Orgulhoso de seus longos chifres, que passaram a ser suas imponentes armas, ele os guiou vale abaixo, já correndo de volta para apressar algum que ficara para trás. Quando pararam para descansar, ele deixou-se cair embaixo de uma sombra de carvalho um pouco afastado.

De repente, todos eles começaram a pular e a fugir, assim que Unktomee gritou para eles;

"Fujam! Fujam! Fui golpeado por uma flecha!"

Quando nenhum caçador foi visto, os Alces sentiram-se tão insultados, que resmungaram entre si:

"Unktomee nos enganou! Era apenas um galho que caiu da árvore!"

Então, pela segunda vez, todos resolveram descansar e, pela segunda vez, foram advertidos em vão. Ficaram ainda mais desgostosos e um deles disse:

"Era apenas um fruto do carvalho que caiu sobre ele enquanto dormia!"

Por uma terceira vez, eles descansaram, mas desta vez os Alces fugiram furtivamente e deixaram Unktomee dormindo, pois haviam sentido o cheiro do caçador. Quando o caçador chegou, encontrou apenas o Chefe Alce ainda adormecido. Ele arremessou uma flecha e o feriu gravemente.

Unktomee agora vive em grande pânico e dor e sente-se amargurado e arrependido por ter-se tornado um Alce, pois aprendeu que a vida deles é cheia de ansiedade. Os alces lhe ensinaram que é melhor contentar-se com o que somos, pois não existe nenhuma espécie de vida que está livre da necessidade ou do perigo.

Fonte:
Elaine Goodale Eastman e Charles A. Eastman (tradução: Antonio Dorival). O talismã da boa sorte e outras lendas dos índios Sioux. SP: Landy, 2003.

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