quinta-feira, 10 de novembro de 2022

George Abrão (A jabuticabeira do enforcado)


Onde hoje está construído o prédio do novo Grupo Escolar “Isabel Branco”, na Cidade Alta, existia um grande terreno baldio. No meio do mesmo passava uma ruela que embora não fosse oficial, era de domínio público: por ela passavam, no dia a dia, pessoas a pé ou a cavalo, carroças e até pequenos caminhões.

Nesse terreno havia algumas jabuticabeiras bem antigas. Numa delas, à beira do caminho, que tinha seus galhos bem baixos, numa manhã, foi encontrado o corpo de um senhor idoso que lá havia se enforcado. Dizia-se que o galho era tão baixo e a vontade de morrer era tanta, que o mesmo precisou ficar de joelhos para alcançar seu intento.

Muito embora para nós, moradores nas imediações, aquela rua encurtasse bastante o trajeto em direção à Cidade Baixa, quando caia à tarde nem em sonhos passávamos por lá, com medo de assombração. Apavorávamo-nos com a ideia de encontrar o velhinho enforcado.

Isso acontecia sempre comigo, tinha tanto medo que até de dia evitava passar por lá. Até que numa noite, quando brincávamos na rua e na brincadeira quem perdia era obrigado a pagar um castigo, perdi, e o meu era correr pela ruela até a fatídica jabuticabeira e ficar parado lá até que me dessem ordem para voltar. Pedi para trocarem até por dois ou mais castigos, mas em vão, meus algozes irredutíveis, confirmaram que eu teria mesmo que ir até lá.

Como a noite era de lua cheia e o caminho estava claro, enchi-me de coragem e parti preparado para o pior.

Quando cheguei ao local minhas pernas tremiam e eu transpirava por todos os poros.

Mas, enquanto esperava a chamada dos meus amigos comecei a rezar e só vi, na minha frente, a jabuticabeira iluminada pelo luar. Nada de extraordinário aconteceu, perdi o medo e, depois de chamado, voltei feliz, pois daquele dia em diante nunca mais acreditei em assombrações.

Fonte:
George Abrão. Jaguariaíva e seus 172 causos, Maringá/PR, 2009.
Ebook enviado pelo autor.

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