Ora, eis o que quero: fatos. Ensinem a esses meninos e meninas apenas os fatos. Nada além dos fatos. Da vida, precisamos somente dos fatos. Não plantam nada mais. Erradique todo resto. As mentes dos animais racionais só podem ser formadas com base nos fatos.
É assim, com essa repetição da palavra “fatos” que se inicia "Tempos difíceis", um livro satírico publicado no período da revolução industrial, por Charles Dickens. Trata-se de uma crítica à filosofia utilitarista, baseada em fatos, capitalismo e positivismo, defendida pelos britânicos Jeremy Bentham e John Stuart Mill. Filosofia essa adotada pela Inglaterra, que era, nesse período, o maior império do mundo, e através de sua influência, exportava essa ideia a outros países.
A história se passa na cidade fictícia de Coketown.
Um dos personagens centrais é o senhor Thomas Gradgrind, dono de uma escola que aplica essa ideia utilitarista nas aulas. Ele era pai de cinco filhos, mas na história só aparecem os dois mais velhos: a Luiza e o Tom. Tanto seus filhos quanto os demais alunos só aprendiam as disciplinas consideradas úteis, lógicas e necessárias para que, futuramente, se tornassem trabalhadores lucrativos e racionais, podendo assim contribuir com a felicidade do maior número de pessoas. Pois o lema do utilitarismo era "a máxima felicidade para o maior número de pessoas". O que importava era a maioria, mesmo que isso custasse o sacrifício da minoria. Toda solução era dada de forma racional, fria e numérica. Se um precisasse morrer para dois viverem melhor, então assim era feito.
Nessa escola, as brincadeiras, a contação de histórias e a fantasia, eram consideradas desnecessárias e perigosas na formação de crianças. Tanto, que Cecília, uma menina abandonada por pais circenses é adotada pelo senhor Thomas, e tem por ele a sua educação reiniciada segundo a sua filosofia de vida.
O tempo passou, os filhos cresceram. O senhor Gradgrid tornou-se um sujeito mais flexível em seus ideais. Já a filha Luiza, torna-se uma mulher rígida, mantendo em si, a visão de mundo segundo o que aprendeu quando criança. Tomas, digamos assim... Não tinha muita firmeza de caráter.
Cecília não perdeu seus sonhos de infância. Mas apesar de tudo, ao seu modo, eles tentavam se entender em seus próprios desentendimentos.
O clássico, "Tempos difíceis" mantém sua atualidade. Em meio à crise capitalista que assola parte do mundo com números crescentes de desempregados e cortes de gastos dos Estados - e, consequentemente, de empobrecimento da população.
O narrador é muito satírico ao descrever as personagens, pois parece considerar que pessoas não são como máquinas capazes de viver somente de cálculos, fazendo tudo de modo lucrativo. A razão unicamente baseada em fatos desumaniza, já que para estar vivo, é preciso sentir, e para uma nação evoluir é preciso, às vezes, errar os cálculos matemáticos do que parece ser o certo. Ou seja, o utilitarismo impede que pessoas sejam, de fato, pessoas. Portanto, o desejo de proporcionar felicidade à base de uma racionalidade fleumática, sugerido pelos filósofos Jeremy Bentham e John Stuart Mill, não existe. E é favorável apenas a um seleto número de irracionais perdidos de si.
Fonte:
Texto enviado pela autora.
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