PRÓLOGO
Chegou a hora de incendiar as palavras
e atiçar fogo na noite escura.
Ah, erga-se o facho das estrelas
nesta noite de puro abril:
eu quero a luz derramada
sobre a chaga do meu peito
e a sangria de minhas mãos à mostra.
E não me venham dizer que não é tempo
de falar de flores e que
passou-se o tempo de falar de amores.
Eu, do meu lado, não me cansei ainda
de amar com o meu amor desesperado
(Mesmo não havendo intervalo
no calendário de minhas dores).
Mesmo que me digam: “Não é tempo de falar de amores”,
eu viro as costas e não me importo
e abro as portas dos meus tumores.
Tudo que habita na retina do meu olhar
são os passos largos do barco fundo
no mar imenso do procurar.
Esta noite, sob o manto das estrelas,
erguerei o incêndio das palavras!
Venham todos assistir o grande espetáculo.
Não vês, na vidraça dos meus olhos,
uma colméia de abelhas? Uma centelha
desesperada, debulhando raios de luz?
Eis o prenúncio de um grande acontecimento.
(Não haverá gozo nem sofrimento,
mas a explosão da lucidez de um louco).
Venham todos! Vou incendiar o mundo
com um só dos meus olhares.
(Eu mesmo sou uma aldeia
e o meu coração pode matar a sede
de todos os mares).
Ah, eu peço pelo amor de Deus ou do demônio:
Abram as comportas do mundo.
Façam silêncio por um segundo:
aqui existe um homem incendiado
de amor e um coração que vai saltar
pela janela do peito!
ÚLTIMO ATO
Com um tiro no crânio
o gigante Maiakovski
disse adeus à estupidez.
Com uma navalha
acariciando o pulso,
Iessenin, angelical,
despediu-se do tédio,
escreveu com sangue seu último suspiro.
Há também os que tomam cianureto,
e ainda, mais comumente,
os que saltam dos edifícios.
Quanto a mim, será mais terrível.
Comigo será diferente.
Farei meu ato-de-fé,
dançarei um ballet invisível
e cantarei a invenção da cigarra.
Ah, seguirei cantando e cantando.
Não. Não tenha pena da minha voz,
nem é preciso me dar a mão.
Apenas seguirei cantando
(e ninguém pode impedir que eu cante)
até que você se espante
com a última sílaba do meu coração.
A NAVALHA DOS ANOS
A noite chegou lambendo
minha juventude
com sua língua tristíssima
E como se fosse
uma navalha,
a noite me sangrou
por mais de vinte vezes
Com sua
longa calda de solidão.
Esta noite
mais de vinte
séculos
Ficaram por terra
como o golpe inevitável
da navalha
noturna e tristíssima
dos meus anos
"O RÍO TIRÚA"
Que trágica é a vida dos rios
Que trágica é a vida dos mananciais
Com sua voz mineral
Cheia de peixes e pedras
E também um olhar de esperança.
Os rios arrependidos
Que viajam tantas voltas entre selvas,
Costas montanhosas,
Para voltar sem cansaço
Á sua fonte original.
E há rios tranquilos e sinuosos,
Rios tranquilos y sinuosos
como serpentes,
silenciosos rios,
rios indiferentes aos crimes dos homens.
Que conformada é a vida deste veios,
Estes veios que sangram a terra
E alimentam de batatas os semeados,
De milho, amor, vinho,
Todos os elementos possíveis.
A voz musical desta agua,
Que o homem insiste em calar para sempre.
Dizem que há rios que se lamentam.
Sim, há rios que se lamentam.
Eis sentido o coração
Que esgota suas últimas lágrimas,
As últimas de um rio sedento.
Estes rios generosos não se lamentam por si,
Sim pelos seus próprios assassinos.
Tenho visto rios e lagos,
Rios e lagos cadavéricos,
Rios que se cansaram de ser rios,
Rios que se foram ao exílio,
Rios que se esconderam debaixo da terra,
Aguas que deviam abandonar a seus filhos.
Sim,
Tenho conhecido rios que retornaram a ser nuvens,
Mananciais de aguas que não retornaram nunca mais.
Se foram para sempre estas aguas,
Estas aguas que persistem nos olhos,
Estas aguas, estas aguas.
(tradução: José Feldman)
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Chegou a hora de incendiar as palavras
e atiçar fogo na noite escura.
Ah, erga-se o facho das estrelas
nesta noite de puro abril:
eu quero a luz derramada
sobre a chaga do meu peito
e a sangria de minhas mãos à mostra.
E não me venham dizer que não é tempo
de falar de flores e que
passou-se o tempo de falar de amores.
Eu, do meu lado, não me cansei ainda
de amar com o meu amor desesperado
(Mesmo não havendo intervalo
no calendário de minhas dores).
Mesmo que me digam: “Não é tempo de falar de amores”,
eu viro as costas e não me importo
e abro as portas dos meus tumores.
Tudo que habita na retina do meu olhar
são os passos largos do barco fundo
no mar imenso do procurar.
Esta noite, sob o manto das estrelas,
erguerei o incêndio das palavras!
Venham todos assistir o grande espetáculo.
Não vês, na vidraça dos meus olhos,
uma colméia de abelhas? Uma centelha
desesperada, debulhando raios de luz?
Eis o prenúncio de um grande acontecimento.
(Não haverá gozo nem sofrimento,
mas a explosão da lucidez de um louco).
Venham todos! Vou incendiar o mundo
com um só dos meus olhares.
(Eu mesmo sou uma aldeia
e o meu coração pode matar a sede
de todos os mares).
Ah, eu peço pelo amor de Deus ou do demônio:
Abram as comportas do mundo.
Façam silêncio por um segundo:
aqui existe um homem incendiado
de amor e um coração que vai saltar
pela janela do peito!
ÚLTIMO ATO
Com um tiro no crânio
o gigante Maiakovski
disse adeus à estupidez.
Com uma navalha
acariciando o pulso,
Iessenin, angelical,
despediu-se do tédio,
escreveu com sangue seu último suspiro.
Há também os que tomam cianureto,
e ainda, mais comumente,
os que saltam dos edifícios.
Quanto a mim, será mais terrível.
Comigo será diferente.
Farei meu ato-de-fé,
dançarei um ballet invisível
e cantarei a invenção da cigarra.
Ah, seguirei cantando e cantando.
Não. Não tenha pena da minha voz,
nem é preciso me dar a mão.
Apenas seguirei cantando
(e ninguém pode impedir que eu cante)
até que você se espante
com a última sílaba do meu coração.
A NAVALHA DOS ANOS
A noite chegou lambendo
minha juventude
com sua língua tristíssima
E como se fosse
uma navalha,
a noite me sangrou
por mais de vinte vezes
Com sua
longa calda de solidão.
Esta noite
mais de vinte
séculos
Ficaram por terra
como o golpe inevitável
da navalha
noturna e tristíssima
dos meus anos
"O RÍO TIRÚA"
Que trágica é a vida dos rios
Que trágica é a vida dos mananciais
Com sua voz mineral
Cheia de peixes e pedras
E também um olhar de esperança.
Os rios arrependidos
Que viajam tantas voltas entre selvas,
Costas montanhosas,
Para voltar sem cansaço
Á sua fonte original.
E há rios tranquilos e sinuosos,
Rios tranquilos y sinuosos
como serpentes,
silenciosos rios,
rios indiferentes aos crimes dos homens.
Que conformada é a vida deste veios,
Estes veios que sangram a terra
E alimentam de batatas os semeados,
De milho, amor, vinho,
Todos os elementos possíveis.
A voz musical desta agua,
Que o homem insiste em calar para sempre.
Dizem que há rios que se lamentam.
Sim, há rios que se lamentam.
Eis sentido o coração
Que esgota suas últimas lágrimas,
As últimas de um rio sedento.
Estes rios generosos não se lamentam por si,
Sim pelos seus próprios assassinos.
Tenho visto rios e lagos,
Rios e lagos cadavéricos,
Rios que se cansaram de ser rios,
Rios que se foram ao exílio,
Rios que se esconderam debaixo da terra,
Aguas que deviam abandonar a seus filhos.
Sim,
Tenho conhecido rios que retornaram a ser nuvens,
Mananciais de aguas que não retornaram nunca mais.
Se foram para sempre estas aguas,
Estas aguas que persistem nos olhos,
Estas aguas, estas aguas.
(tradução: José Feldman)
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Fonte:
Antonio Miranda
Antonio Miranda
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