Texto integrante de Comédias da Vida na Privada.
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BIFE MARCOS PASSADO, amigo íntimo do Eduardo Camaleão, marido da inebriante e formosa Laurinda, se encontrou com ela quando a beldade saia da padaria do bairro onde moravam. Extremamente galanteador e metido a ter todas as mulheres a seus pés, principalmente as jovens, não pensou duas vezes e se abriu em mesuras e reverências, feito mala velha imprestável:
— Dona Laurinda, que prazer enorme em lhe encontrar!
Dona Laurinda, vinte e três anos, se formara uma mulher bela e encantadora, capaz de virar a cabeça de qualquer homem que tivesse gosto apurado e rigoroso pelo sexo oposto. Seus cabelos compridos, caídos até a cintura, lhe davam ares de uma boneca feita sobre medida pelas mãos hábeis de um artista nato, que pensara em concentrar tudo de maravilhoso num ser humano único, tornando o inimitável e assombradamente fagueiro e mavioso:
— O prazer é todo meu, seu Bife.
— E como está o meu amigo Eduardo Camaleão?
— Neste momento se aprontando para o trabalho.
— Legal. Faz tempo que não vou à casa de vocês. Estou com saudades de seus bolos de chocolate.
— Não seja por isto, amigo Bife. Apareça quando quiser... Sempre será bem vindo.
— Tomei conhecimento, pelo Pingolino, o porteiro do seu prédio, irmão do vigia do meu edifício, que vocês comemoraram um ano de casados?
— De fato. Pensei que fosse contar com a presença do senhor. Fizemos uma brincadeira rápida, de última hora. Assamos uma carninha, entornamos algumas cervejas... Abrimos um champanhe. Até falei para o Camaleão: ‘Amor, está faltando o Bife’.
Risos de ambas as partes:
— Ele esqueceu de me chamar. Acontece. Não faltará ocasião.
— Independentemente disto, poderia ter ligado. Tudo bem. Me perdoa. Peço desculpas por nossa falha. Afinal, o senhor faz parte do seleto círculo de amigos. Sempre nosso cantinho estará ao seu inteiro dispor.
— Agradeço o seu carinho. Isto muito me lisonjeia.
— Não por isto.
— A Bebel, sua empregada, me disse num encontro que tivemos na feira de quarta, que a senhora está pensando em ter um filho?
— Nossa, as noticias correm. Penso, de fato, em aumentar a família. Acho que está na hora de arranjarmos um herdeiro...
Bife Marcos Passado não era de perder uma chance, por menor ou por mais insignificante que fosse. Neste pé, aproveitou a deixa e caiu matando:
— Uau, dona Laurinda! Que excelente notícia. Me avisa quando quiser colocar esta ideia em prática. Lembra de mim. Não esqueça que os amigos... Os verdadeiros amigos são para estas coisas...
Laurinda mandou um bom dia, meio que enviesado, fechou o rosto numa carranca furiosa e entrou, de vez, padaria adentro.
Fonte:
Texto enviado pelo autor.
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